Ainda em 2009, pouco tempo após ter estourado, cantora deu resposta interessante a pergunta sobre “referências sexuais” em suas músicas
Publicado em 24/02/2024, às 10h00
Há artistas que conquistam a fama justamente por romperem com alguns padrões. Um exemplo no segmento pop é Lady Gaga.
Hoje próxima dos 40 anos, a cantora estourou aos 22, com o lançamento de seu álbum de estreia The Fame (2008). Além de ajudar a recolocar o pop/dance eletrônico no topo novamente, Gaga promoveu uma revolução estética com seus visuais extravagantes e videoclipes de impacto. Em suas letras, ofereceu referências mais ousadas e até sexuais de uma forma que suas contemporâneas não estavam fazendo.
Tudo isso pareceu demais para uma parte do público e da imprensa que não estava tão acostumada a tal abordagem — embora artistas de outras gerações, como Madonna, tenham servido de influência para Gaga. O estranhamento era esperado. A reação machista, nem tanto.
Uma entrevista de 2009 ilustra bem essa situação. Na ocasião, a cantora foi perguntada se temia que referências sexuais em suas letras atrapalhassem seu trabalho na música. De início, Gaga — que à época estava com três hits no topo das paradas — sequer pareceu estar disposta a responder, dizendo apenas:
“Não estou com medo. Você está?”.
Depois, conforme transcrição do Refinery29 (via site Igor Miranda), aprofundou seu raciocínio — e deixou claro como se dá o machismo na indústria musical.
“Você vê, se eu fosse um cara com um cigarro na mão e segurando o saco enquanto falo sobre como faço música porque gosto de carros velozes e transar com garotas, você me chamaria de ‘rockstar’. Mas quando eu faço isso em minha música e meus clipes, por ser mulher e fazer música pop, você me julga e diz que é distração. Eu sou apenas uma rockstar.”
Uma compreensão similar foi compartilhada pela guitarrista Sophie Lloyd recentemente. A guitarrista ficou mais conhecida ao entrar para a banda de Machine Gun Kelly, em 2022, mas já era famosa no YouTube, com vídeos mostrando sua técnica no instrumento.
Um tipo comum de comentário que Lloyd enfrenta nas redes é a respeito das roupas mais curtas que utiliza tanto em vídeos gravados em casa quanto nos shows. Segundo ela, até a imprensa especializada em rock e heavy metal aborda esse ponto às vezes, a acusando de “apelar para trajes curtos, sendo que homens não fazem isso”. Em sua visão, é uma grande mentira.
Em entrevista à Primordial Radio (via Killer Guitar Rigs), Sophie contou como reage a esse tipo de manifestação — e citou a diferença de tratamento que se oferece a homens e mulheres na música.
“Tenho tantos pontos sobre isso. Primeiro, você já viu alguma das postagens recentes de Lenny Kravitz no Instagram? Ele é extremamente sexual, dá para perceber [risos]. Em segundo lugar, os homens não faziam isso porque eles usaram as mulheres para seu benefício próprio, como o Mötley Crüe, usava garotas nuas na capa e videoclipes. Isso virou um símbolo do rock and roll que as pessoas amam há tantos anos. E então, finalmente, as mulheres retomam o poder e dizem ‘me sinto confiante fazendo isso dessa maneira, faço isso por mim mesma’. Não estamos fazendo isso por vocês, caras. Estamos fazendo isso porque é isso que nos faz sentir confiantes.”
Outra situação envolvendo Lady Gaga que mostra como questões alheias à música podem render um tratamento diferente a um artista é um boato de que ela seria hermafrodita.
Se fosse, não haveria problema algum. Contudo, obviamente, tratava-se apenas de um rumor. E mesmo cientes de que havia grandes chances de essa história não ser verdadeira, diversos jornalistas e apresentadores fizeram perguntas a Gaga sobre o assunto.
Um vídeo compartilhado recentemente no TikTok compila uma série de respostas da artista a esse tipo de questionamento. Confira a seguir.
- Jornalista 1: Rumores malucos, por exemplo, de que você seria hermafrodita… como você se sente com relação a isso quando lê esse tipo de coisa?
- Lady Gaga: Não vou nem mesmo responder a essa pergunta.
- Jornalista 2: Esse rumor estranho de que você seria metade homem, metade mulher. Você já ouviu esse rumor?
- Lady Gaga: (Risos) Sim.
- Jornalista 2: E é verdade?
- Lady Gaga: Não.
- Jornalista 3: Você tem um pênis ou não?
- Lady Gaga: Sabe… minha bela vagina fica muito ofendida com essa pergunta.
- Jornalista 3: Mesmo? Então você tem uma vagina?
A coletânea de filmagens ainda apresenta uma resposta de Gaga a uma pergunta machista sobre seu visual. O diálogo se deu da seguinte forma:
- Lady Gaga: (Em provável resposta a outra pergunta) Acho que estou bonita. Você não acha que estou bonita?
- Jornalista 4: Sim, mas está um pouco sexy.
- Lady Gaga: Sexy?
- Jornalista 4: Talvez provocativa.
- Lady Gaga: Não acho que seja provocativo. Acho que estou bonita.
A célebre entrevista de Lady Gaga a Anderson Cooper, em 2011, ficou fora da compilação. Nela, a artista responde novamente aos rumores de que ela teria um “apêndice masculino” e que seria “hermafrodita”.
“Talvez seja verdade. Seria tão terrível? Por que diabos vou perder meu tempo e dar um comunicado à imprensa sobre se tenho ou não um pênis? Meus fãs não se importam e eu também não.”
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e pós-graduado em Jornalismo Digital. Desde 2007 escreve sobre música, com foco em rock e heavy metal. Colaborador da Rolling Stone Brasil desde 2022, mantém o site próprio IgorMiranda.com.br. Também trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, site/canal Ei Nerd e revista Guitarload, entre outros. Instagram, X/Twitter, Facebook, Threads, Bluesky, YouTube: @igormirandasite.