Banda inicialmente conhecida pelo som thrash metal resolveu fazer experimentos logo em seus primeiros trabalhos
Publicado em 20/10/2024, às 15h00
Em 1984, o thrash metal caminhava cada vez mais para se tornar reconhecido mundialmente por sua sonoridade pesada e acelerada. O Metallica, já um dos principais expoentes do segmento, lançou seu segundo álbum, Ride the Lightning.
Porém, havia algo estranho para boa parte dos fãs: tem uma “balada” nele. O termo vai entre aspas mesmo, já que apesar do ritmo lento, “Fade to Black” ganha peso especialmente em sua segunda metade.
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Ainda assim, houve uma quebra de paradigma. Uma banda de thrash metal com violões? Era algo como Bob Dylan usar guitarra em vez do mencionado instrumento acústico, quase duas décadas antes, e ser vaiado por isso.
De acordo com a revista Metal Hammer, o vocalista e guitarrista James Hetfield, autor da letra, entendeu o choque dos fãs mais radicais ao se colocar no lugar deles. O músico disse:
Se tivessem dito a nós quando estávamos gravando Kill ‘Em All (primeiro disco, de 1983) que gravaríamos uma balada no próximo álbum, eu teria dito: ‘vá se f*der!’”
Foi exatamente isso que aconteceu. Como narra o site Igor Miranda, logo antes das gravações do segundo álbum, a banda teve todo seu equipamento roubado, incluindo um amplificador Marshall que era a menina dos olhos de Hetfield. Motivado pela melancolia, o frontman criou os primeiros acordes da faixa enquanto brincava com um violão no sofá de um amigo.
Apesar de ser considerada uma balada, para os padrões do Metallica, “Fade to Black” é sombria. Nada de problemas amorosos por aqui: a letra fala sobre a perda da vontade de viver, enquanto a morte se aproxima. A temática não foge muito do que outras músicas da própria banda - ou de outros medalhões do thrash metal – traziam na época, mas mesmo assim a recepção não foi boa.
Em entrevista de 2013 ao radialista Howard Stern, o baterista Lars Ulrich resumiu bem o impacto de “Fade to Black”. Ele disse:
Quando a comunidade do ‘metal’ ouviu uma música do Metallica com violões, todos eles perderam a cabeça.”
Ao vivo, a situação não melhorou. Relatos de fanzines da época revelam pessoas na plateia jogando e balançando lenços umedecidos em zombaria quando a faixa era tocada. O baixista Cliff Burton se irritou com a reação do público em algumas ocasiões. Mal sabiam os fãs que era só o começo.
A partir dali o Metallica passou a enfrentar diversas acusações de que teria “se vendido”. Outra música de Ride the Lightning que gerou tais alegações foi “Escape”, considerada “feliz” demais.
Talvez a rejeição inicial tenha servido de combustível para o grupo continuar a fazer experimentos. Entre os exemplos claros, estão “Welcome Home (Sanitarium)”, do disco Master of Puppets (1986), e “One”, de ... And Justice For All (1988) – esta última com um clipe bem produzido que também levou o grupo a ser acusado de “se vender”.
Com a chegada do trabalho homônimo de 1991 — conhecido como Black Album e com sonoridade inclinada ao hard rock —, as reclamações aumentaram ainda mais. Fãs mais conservadores foram espantados de vez.
Mas Lars Ulrich tem uma visão diferente sobre essa questão. Para ele, sons como “Fade to Black” sempre estiveram no DNA da banda e só não vieram antes porque não havia capacidade técnica para tal.
À Metal Hammer, o baterista explicou o que mudou e permitiu que canções com uma nova abordagem fossem feitas:
Esse tipo de música sempre esteve no nosso background – nós sabíamos em nossos corações que isso era parte do som do Metallica, mas nós não tínhamos a habilidade ou a finesse para abordar isso em Kill ‘Em All. Quando Cliff e Kirk (Hammett, guitarrista) chegaram, nós sentimos que tínhamos a habilidade para seguir por esse caminho.”
Em conversa com a Guitar World, em 1991, James Hetfield comparou a postura de sua banda em relação a outros grandes nomes do thrash, que nunca se atreveram a gravar uma balada – ou algo próximo disso. O frontman disse:
Bandas como o Exodus e o Slayer não fazem baladas, mas eles se prenderam a essa posição, o que nós nunca quisemos. Limitar-se para agradar seu público é besteira.”
Fato é que quem se incomodou com uma balada em 1984 provavelmente se chateou com as várias outras que vieram. “The Unforgiven”, “Nothing Else Matters”, “Hero of the Day” e “Mama Said” são só algumas delas.
Colaborou: André Luiz Fernandes.
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e pós-graduado em Jornalismo Digital. Desde 2007 escreve sobre música, com foco em rock e heavy metal. Colaborador da Rolling Stone Brasil desde 2022, mantém o site próprio IgorMiranda.com.br. Também trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, site/canal Ei Nerd e revista Guitarload, entre outros. Instagram, X/Twitter, Facebook, Threads, Bluesky, YouTube: @igormirandasite.