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Música / Future of Music

Baianasystem é “um passado que o futuro ainda não alcançou”

Para costurar uma colcha de retalhos com diversas influências musicais e culturais, BaianaSystem estuda o passado, o futuro e o presente para alcançar outros patamares

BaianaSystem (por Jardel Souza)
BaianaSystem (por Jardel Souza)

Como um navio pirata, BaianaSystem chegou de surpresa e, ao longo de uma carreira de 15 anos, conquista cada vez mais mares com uma artilharia pesada. Nesse caso, são oceanos de público atravessados pelo vasto repertório musical, repleto de influências culturais e sonoras, seja na estrada ou nos estúdios.

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Russo Passopusso, do BaianaSystem (Divulgação)

Os tripulantes também passaram por uma revolução interna e sonora. Partindo da exploração de possibilidades da guitarra baiana, Russo Passapusso (voz), Claudia Manzo (voz), Roberto Barreto (guitarra baiana), SekoBass (baixo), João Meirelles (beats, synths e programações), Junix 11 (guitarra), maestro Ubiratan Marques (piano e synths), Ícaro Sá (percussão) e Filipe Cartaxo (concepção visual e imagens do show) perceberam como, na verdade, “Baiana” representa a cultura da Bahia e “System” seria o sistema social, espiritual e estético de imagem. “Essas relações todas começaram a se moldar mais fortemente dentro da nossa estrutura,” disse Passapusso à Rolling Stone Brasil.

Quando surgiu, a banda veio ao mundo minimalista e como um projeto instrumental, que sempre gostou muito de tocar em cima de caminhão, os famosos trios elétricos. A saudação com música instrumental sempre esteve lá, tanto que diversas canções dão o mesmo destaque para o som e para os vocais de Passapusso.

“A gente vem com mestres como Ramiro Mussoto, Letieres Leite… essa safra de orquestras, como a Orkestra Rumpilezz”, afirmou. “Somos filhos dessas relações. O próprio samba reggae com os tambores, onde os caras ecoam suas vozes. A própria estrutura da guitarra baiana, tocada nos trios elétricos, e aí vem Moraes Moreira entendendo como dialogar com a guitarra baiana.”

Natural de Feira de Santana, o cantor e frontman definiu o grupo como uma colcha de retalhos, porque os integrantes fazem parte de um mundo todo, não apenas de um continente ou país. Claro, esse conceito também migra para o som da banda, que passeia por samba-reggae, ska, MPB, afrobeat, entre outros.

Inclusive, não é rock, samba, rap, reggae, música latina e salsa, mas tem todos esses gêneros musicais em seu armazém. Segundo o cantor, a banda mais tem do que é. É nesse pensamento que os músicos moldam a identidade do BaianaSystem, que também acopla outras referências geográficas, sociais e espirituais como ferramenta de composição.

“A gente vem de Salvador, uma cidade muito diaspórica, que recebe muita coisa… é fundada através desse aspecto mais de cidade urbana. E aí essa diáspora faz a gente reconhecer esses diversos estilos e ritmos dentro da nossa história.”

O som do BaianaSystem é conhecido pela mistura de instrumentos analógicos, como a guitarra baiana, e sintetizadores eletrônicos. No entanto, no processo criativo do grupo, existe uma grande valorização da participação humana, mesmo. Com um pé no afrofuturismo, no lugar da noção de cor do neon ou relações tecnológicas, existe a eletricidade do pensamento, da participação no toque do tambor, por exemplo.

Uma das filosofias, como Russo Passapusso orgulhosamente apresenta, é “um passado que o futuro ainda não alcançou”, que dialoga diretamente com a maneira com a qual a banda faz arte. “Vem dessa estrutura de pesquisa e desse método do Baiana que chamo de ‘replantio musical,’ que eu aprendi muito com a cultura sound system e depois eu percebi que tem muito na cultura do samba-reggae”, explicou.

Esse replantio vem desde toda cultura de sound system que o cantor estava inserido antes da criação da banda, quando ele acompanhava a cena underground de rock de Salvador, com bandas como Lisergia, Banda Crack, Dois Sapos e Meio e The Dead Billies.

Navio Pirata

“Esse último Carnaval (de 2023) a gente entende com sentido espiritual. Víamos as pessoas de uma forma muito sentimental e pessoal. A construção das pessoas que abriam a roda, quem estava ali, se elas conseguiram chegar seguras em casa, a questão de segurança pública”, continuou. Ou seja, esses mares de pessoas ajudam a moldar, cada vez mais, o som do BaianaSystem.

Esse navio pirata cheio de sonoridades, culturas e experiência também desembarca no Carnaval — em dimensão nacional, vale notar. Um dos blocos de rua (ou trio elétrico, no nordeste) mais badalados do Brasil, justamente, é o Navio Pirata, responsável por arrastar multidões nesta celebração.

Idealizado pelo BaianaSystem, Navio Pirata é uma experiência bastante diferente em cada cidade que passa, como se fosse outro país. Somente em São Paulo, por onde passou no pós-Carnaval, foram 560 mil pessoas seguindo a invasão. É a maior manifestação do coletivo, que puxando o bloco se sente jogando em casa, em Maracanãs lotados pelo país, justamente por esse passado tocando em cima de caminhões.

“A própria guitarra baiana é um instrumento oriundo dessa cultura, e já estamos há um tempo com essa ideia da pirataria”, relembrou. “Quando dá muita gente, chamamos de mar de gente, e esses sentidos cada vez começam ser cada vez mais imagéticos. Temos uma responsabilidade sobre aquilo, com o caminhão, com o Navio Pirata, com a mensagem que passamos ali.”

Se fosse um ser humano, BaianaSystem estaria no auge da adolescência, aos 15 anos, descobrindo ainda uma maturidade em formação. Já a realidade nos mostra uma banda bastante segura de si, consolidada como uma das mais relevantes do Brasil.

O futuro é incerto, mas, quando o Baiana já tiver idade de um adulto formado, com seus 30 ou 40 anos, a ideia é continuar impactando a música brasileira. “Enquanto o tempo nos dê muita matéria-prima para conseguirmos fazer BaianaSystem, Carnaval, música, máscara, tema de show, bate-papo, camisa e fazer tudo, estaremos fazendo”, desejou Russo Passapusso.

“Quando conseguirmos fazer, espero que estejamos junto (risos). Sou bem literal dentro disso, porque a premissa básica do Baiana é contarmos a história. De início, meio e fim. Isso acontece naturalmente com os discos. É dessa forma que escrevemos.”