Cantora gravou apenas um álbum em carreira solo, o extremamente bem-sucedido The Miseducation of Lauryn Hill, para nunca mais voltar a lançar músicas novas
Publicado em 10/09/2023, às 11h04
São raros os casos de artistas de sucesso que gravam apenas um álbum. Foi assim com o Sex Pistols, lendária banda punk que deixou apenas Never Mind the Bollocks, Here’s the Sex Pistols (1977) em seu catálogo de inéditas. E também ocorreu com Lauryn Hill, ícone do hip hop, décadas depois.
A artista, claro, gravou álbuns com o grupo Fugees. Contudo, ela gerou apenas um disco de músicas inéditas em carreira solo: The Miseducation of Lauryn Hill, citado até hoje como um dos maiores trabalhos de hip hop em todos os tempos. Divulgado em 1998, o material contabiliza hoje mais de 20 milhões de cópias vendidas em todo o planeta.
Com tamanho sucesso, era de se esperar que Hill continuasse lançando novos trabalhos. Não foi o caso. O máximo que ela fez foi o acústico MTV Unplugged No. 2.0, gravado em 2001 e divulgado no ano seguinte, sem novas canções.
Por quê? Em entrevista de 2021 à Rolling Stone EUA(via site Igor Miranda), Lauryn abordou o assunto como raramente o faz. Na ocasião, ela foi convidada a refletir sobre a entrada de The Miseducation of Lauryn Hill na lista de 500 maiores álbuns da história, produzida pela revista. O disco ficou no 10º lugar, à frente de clássicos como Revolver (Beatles), Thriller (Michael Jackson) e Exile on Main St. (Rolling Stones).
Ao ser perguntada sobre as razões que levaram a não haver outro disco após esse, Lauryn foi bastante sincera ao destacar suas questões com a fama. A artista definitivamente não queria estar nos holofotes, pois sentia que sua relação com o público, por vezes, ia além da música.
“Eu sempre tive um problema com a ideia de artista como propriedade pública. Eu concordei em compartilhar a minha arte. Não estou concordando necessariamente em me compartilhar.”
Ainda em seu relato, a cantora destacou que muitas pessoas “se sentem no direito” de tentar controlar os artistas que adoram. É uma relação tóxica, em sua opinião.
“Pessoas se sentem no direito, como se fossem suas donas, ou donas de um pedaço seu, isso pode ser perigoso demais. Eu detesto qualquer controle assim e resisto às expectativas que sugerem que eu simplifique, ou seja previsível, para deixar pessoas confortáveis ao invés de me expressar de maneira autêntica.”
Durante sua declaração, Lauryn Hill também apontou que havia muita cobrança em torno dela enquanto artista e alguém com vida pública. Várias pessoas colocavam expectativas em torno dela que não colocariam em torno de si.
“Eu também resisto às expectativas nada realistas colocadas sobre mim por pessoas que nunca colocariam essas mesmas expectativas em si próprias. Eu posso ser diplomática e paciente o quanto for necessário. Eu não posso, todavia, me diminuir através de autodepreciação e diminuição constante.”
Em outra entrevista, de 2009, à Essence (via site Igor Miranda), Lauryn Hill destacou que a indústria musical praticamente lhe “obrigava” a ser falsa com outras pessoas. Era preciso demonstrar felicidade por pessoas que ela simplesmente não gostava.
“A Lauryn Hill que conheceram no início era tudo o que era permitido na época. Tive que me afastar quando percebi que, pelo bem da máquina, eu estava sendo muito comprometida. Eu me sentia desconfortável por ter que sorrir na cara de alguém quando eu realmente não gostava da pessoa, ou mesmo não a conhecia bem o suficiente para gostar dela. Por 2 ou 3 anos, fiquei longe de toda interação social. Foi um momento muito introspectivo, porque tive que enfrentar meus medos e dominar todos os pensamentos demoníacos sobre inferioridade, sobre a insegurança ou o medo de ser negra, jovem e talentosa nesta cultura ocidental.”
Outro ponto que não chega a ser abordado por Lauryn Hill nas entrevistas citadas era o seu desejo em construir uma família. A cantora se casou com Rohan Marley, filho de Bob Marley, em 1996 — mesmo ano em que os dois se conheceram. Hoje divorciados, eles têm seis filhos juntos, incluindo a jovem cantora e modelo Selah Marley.
No fim das contas, Hill conclui que nem mesmo sua gravadora, Columbia Records, parecia interessada em um segundo álbum dela. À Rolling Stone EUA, a artista garantiu que ninguém foi atrás dela para convencê-la a fazer outro registro.
“A coisa estranha é que ninguém do meu selo nunca me ligou e perguntou ‘como podemos ajudá-la a fazer outro álbum?’ Nunca… nunca. Eu disse ‘nunca’? Nunca.”
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e pós-graduado em Jornalismo Digital. Desde 2007 escreve sobre música, com foco em rock e heavy metal. Colaborador da Rolling Stone Brasil desde 2022, mantém o site próprio IgorMiranda.com.br. Também trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, site/canal Ei Nerd e revista Guitarload, entre outros. Instagram, X/Twitter, Facebook, Threads, Bluesky, YouTube: @igormirandasite.