Far From Alaska fala à RS sobre novo álbum 3, rock eletrônico e hiato
Disco lançado nesta sexta-feira, 14, traz sonoridade diferente do habitual para a banda e antecede pausa para dedicação a outros projetos
Igor Miranda (@igormirandasite)
Publicado em 14/03/2025, às 16h32
Antes de pausar suas atividades por tempo indeterminado, o Far From Alaska concluirá um ciclo iniciado ainda durante a pandemia. O trio potiguar formado por Emmily Barreto (vocais), Cris Botarelli (lap steel, sintetizador e vocais) e Rafael Brasil (guitarra) lança 3, seu novo álbum de estúdio, em todas as plataformas digitais via ONErpm. O disco de 12 faixas chega a público após três EPs, com três faixas cada, terem sido disponibilizados ao longo dos últimos três anos — então, de novo mesmo, há apenas as três canções que encerram o tracklist.
Muito três nessa história, né? Não é por acaso. “Não são quatro EPs, é tudo em três: fizemos três lançamentos de três faixas cada e agora sai o disco com três inéditas, pois tudo gira em torno do três”, explica Rafael, metodicamente, à Rolling Stone Brasil.
O novo trabalho é reflexo do isolamento social provocado pela pandemia de covid-19. O trio estava até com estúdio agendado para compor e ensaiar o álbum que sucederia Unlikely (2017). O processo criativo aconteceu, mas de outra forma: remotamente, com cada um em sua própria casa, e Cris e Rafael dispostos a aprender como gravar suas próprias músicas — superando, inclusive, uma resistência pessoal. Botarelli explica:
“Somos uma banda que quer tocar tudo alto e cantar gritando alto. Nunca achamos que fazer música na frente de uma tela correspondia com o nosso jeito de fazer música, mas chegou num ponto onde era isso ou nada.”
Naturalmente, o trio começou a se aventurar por outros gêneros para além do rock de contornos alternativos que fazia até então, já que, agora, era possível transcender os limites de seus próprios instrumentos. O rock eletrônico dá o tom principal de 3, mas o álbum não se limita a isso: tem pop, indie, reggae e até mesmo uma faixa, “hardxote”, que parece mesclar xote e tecnobrega (ou ao menos as viradas de bateria típicas do segmento). Segundo os músicos, nada planejado, mas totalmente alinhado com seus gostos. Rafael comenta:
“Usamos muito os acidentes que acontecem na vida, na carreira da banda. O plano inicial não dá certo, então deixamos rolar. O eletrônico era o caminho natural por gostarmos muito, tanto de pop quanto de música eletrônica em si. Mesmo sem a pandemia, acho que esse caminho estaria junto. Só casou tudo.”
Por sua vez, Emmily aponta que o isolamento acelerou o processo de explorar outros gêneros e deixar o eletrônico na linha de frente. Sem a pandemia, “teria sido mais devagar”.
“Acho que chegaríamos nesse momento, mas não teria sido nesse álbum. Acho que seria depois desse. Lembro da sensação de: ‘temos que aprender, lascou, f#deu’. Não tinha outro jeito. Então, foi na marra.”

Mais colaborativo
3 também se diferencia de outros álbuns do Far From Alaska por ter maior participação de agentes externos, seja em performance, produção e até composição. De acordo com a ficha técnica disponível nas plataformas:
- Lenine, gigante da música brasileira, participa de “olha”;
- Pato Banton, ícone britânico do reggae, participa de “secret”;
- Medulla, banda carioca de rock, coescreve e participa de “future”;
- Yung Buda coescreve “future” e participou de uma versão já excluída da faixa, devido a um hiato na carreira anunciado após denúncias de assédio;
- Lucas Silveira, vocalista e guitarrista da Fresno, coproduz “cuz you”, “good part” e “trouble”;
- Izzy Castro (Twin Pumpkin) produz “olha” e coproduz “txananam”, “auuu”, “hardxote”, “meltdown”, “secret”, “good part”, “trouble”, “go ahead” e “the sun”;
- Luiz Gadelha (Talma & Gadelha) coescreve “auuu”;
- Gabriel Souto, membro de projetos como DuSolto e Luísa e os Alquimistas, coescreve “hardxote” e coproduz “trouble”.
Apesar da longa lista, o trio aponta que o material, em maioria, chegou pronto para esses colaboradores. “Acho que quem ficou um pouquinho mais solto foi o Lucas Silveira, porque ele faz isso há muito tempo e ele vai fazendo, porque ele é muito mil volts. Acho que foi onde perdemos um pouco mais o controle, mas ainda assim perturbamos muito”, diz Rafael. “O terror dos produtores e mixadores — eles trabalhando e a gente acompanhando e respirando no pescoço”, brinca Cris.
Cada colaboração tem sua história, mas a de Lenine rende um relato à parte. A banda e o lendário artista da MPB se conheceram na edição 2017 no festival CoMA de um jeito inusitado. Brasil relembra:
“No fim do nosso show, era comum a galera de outras bandas invadir o palco na última música. Quando olho para o lado, está o Lenine. Depois, lembro de dar um longo abraço nele e ele só xingava: ‘p#ta que pariu, car#lho, muito f#da’. Ele curtiu mesmo. Quando rolou o disco, lembramos e o convidamos. Ele topou na hora. Fomos ao estúdio dele, gravamos com o filho dele, pois eles têm um estúdio. Quando ele canta, tem uma identidade gigante.”
O que muda — e o que se mantém
Cada integrante do Far From Alaska relatou uma mudança diferente na abordagem de seu(s) instrumento(s) enquanto gravava 3. Com a palavra, o trio:
Cris Botarelli: “Não sei nem o que gravei em cada música. Estamos construindo e vamos gravando. Tenho uma veia de produtora, mais do que de instrumentista, então amo perder o controle do que já fiz. Neste álbum, estive menos limitada pelos meus próprios instrumentos, que já não são poucos e ainda resolvi me assumir baixista. Tem tantos synths no disco que ao vivo, não dá nem para escolher um deles para tocar.”
Rafael Brasil: “No Unlikely, tínhamos baixista na banda, aí ele saiu e quem fazia o baixo nos shows era eu. Aí, a Cris começou a fazer mais e no disco novo ela toca mais baixo do que eu. Também mudaram os timbres, pois no conjunto de faixas 3.3, por exemplo, não sei nem se ligo o pedal de fuzz. Agora uso mais guitarra limpa, drive, efeitos de ambiência. Não existia nem delay no meu pedalboard.”
Emmily Barreto: “Não estou gritando tanto nesse álbum, mas ao mesmo tempo tem música onde grito muito. Este álbum é onde as pessoas vão poder ouvir de um jeito mais suave, mas em partes. Acho que apresentamos outros lados da minha voz. Tem uma música em especial que estou ansioso para todos ouvirem: ‘the sun’. Sempre que ouço, falo: ‘nossa!’.”
E o que se manteve? O espírito livre em termos de gênero musical. Inclusive, trata-se de algo que, segundo os integrantes, os próprios fãs sempre abraçaram, pois nem mesmo as faixas mais diferentonas de 3 sofreram com rejeição. Rafael afirma:
“Acho que essa é a banda com menos rejeição que já vi na vida. Todos gostam muito, ficamos muito gratos por isso. Lembro que esse medo de rejeição aconteceu no Unlikely, pois nos colocaram nesse lugar stoner rock, ‘muito rock’, e a gente: ‘não, é tudo rosa, é doideira, para com isso’. Sentimos que os fãs mais tradicionais de rock iriam achar ruim, mas a galera veio junto. Pouquíssima gente não entrou nessa. Não estamos no nosso ápice de números na internet — até porque tiramos o pé do acelerador —, mas quem está ali ainda curte bastante. Então, continuem espalhando nosso som para os amigos.”
Hiato e futuro
Com 3 devidamente lançado, o Far From Alaska realiza suas últimas apresentações antes da pausa. Uma delas acontece dia 6 de abril, no Cine Joia, junto do Sugar Kane e de outras atrações. Durante outra, prevista para 8 de abril, haverá a gravação de um DVD, com local e mais informações a serem divulgados em breve.
Os próximos esforços se concentram nos projetos à parte de cada músico — onde eles, de certo modo, também estão juntos. O Ego Kill Talent, na ativa há mais de uma década e consolidado anteriormente com outra formação, tem Emmily Barreto e Cris Botarelli desde 2022 e 2024, respectivamente. Já o Swave, definido como “rock simples, fácil e divertido”, conta com Cris e Rafael. O guitarrista conduz ainda o Tigre Triste, com um repertório descrito por ele como “músicas acústicas, de amor e levinhas”.
A pausa nas atividades do Far From Alaska ocorre justamente com o intuito de se ter tempo para as outras iniciativas — além, é claro, de oferecer um respiro a uma banda que está em atividade ininterrupta desde 2012. Cris Botarelli explica:
“Estamos vindo de muitos anos e de muito trabalho intenso. Resolvemos tirar um tempo para nos dedicar a esses outros projetos também. O Far From Alaska é o centro das nossas atividades musicais. Exatamente por pensar em uma continuidade, acho que chega um tempo na vida em que todo músico quer fazer outras coisas. É o momento de dar uma respirada e voltar com... não sei como também, né? Porque não nos comprometemos muito com nenhum dos nossos trabalhos anteriores. Sempre inventamos algo novo.”
Mas a banda volta, né? “Volta sim”, explica a multi-instrumentista. “Mas não sabemos quando. Não colocamos datas.”
*3, novo álbum de estúdio do Far From Alaska, está disponível em todas as plataformas digitais via ONErpm.
+++ LEIA MAIS: Rodrigo Lima fala à RS sobre Dead Fish no Lolla, turnê especial e próximos planos
+++ LEIA MAIS: Offspring no Brasil: Noodles fala à RS sobre shows, popularidade e música nova
+++ LEIA MAIS: Steven Wilson fala à RS sobre The Overview, insignificância humana, prog e Brasil
+++ Clique aqui para seguir a Rolling Stone Brasil @rollingstonebrasil no Instagram
+++ Clique aqui para seguir o jornalista Igor Miranda @igormirandasite no Instagram