Influências do vocalista do Aerosmith vão muito além de nomes como Mick Jagger, Janis Joplin e Robert Plant
Publicado em 29/03/2024, às 12h00 - Atualizado em 03/08/2024, às 13h00
Um dos vocalistas mais característicos do rock como um todo, Steven Tyler sempre deu crédito a suas influências. Muitas delas são bem populares, como Mick Jagger (Rolling Stones), Janis Joplin e Robert Plant (Led Zeppelin).
Deles, vieram o estilo de se cantar e de se portar no palco, como alguém inabalável, dono de si e da situação. Além disso, há referências de outros gêneros, já que Tyler, nascido Steven Victor Tallarico, é filho de um pianista clássico — não à toa, estudou música desde cedo e domina o instrumento do pai.
Há, porém, outro cantor que foi muito importante na formação musical do frontman do Aerosmith — a ponto deste dizer que tal ídolo lhe ensinou muito. E o nome em questão pode não ser tão conhecido entre os menos iniciados na história do rock, pois não se trata de alguém que vendeu milhões de discos, mas não deixa de ser altamente relevante.
Trata-se de Keith Relf, vocalista e guitarrista do Yardbirds. A banda inglesa, que esteve na ativa entre 1963 e 1968, conquistou relativa popularidade no período. Porém, de forma até injusta com sua obra, é mais lembrada por ter “revelado” músicos como os guitarristas Eric Clapton, Jeff Beck e Jimmy Page, que fizeram história em outros projetos.
Por trás deste e de outros músicos muito talentosos que passaram pelo Yardbirds, estava Relf, que, ao lado de Chris Dreja (guitarra/baixo) e Jim McCarty (bateria), participou de todos os trabalhos do grupo. Fora os integrantes de rara competência artística, o Yardbirds emplacou algumas de suas canções, como “Heart Full of Soul”, “For Your Love”, “Evil Hearted Soul”, “Shapes of Things” e “Over Under Sideways Down”, no top 10 da parada britânica.
Em artigo escrito para a Rolling Stone no ano de 2010, Steven Tyler rendeu homenagens a Keith Relf. O Yardbirds ficou em 89º em uma lista, publicada pela revista, dos “100 maiores artistas de todos os tempos”. Confira o artigo do frontman do Aerosmith a seguir.
“Ouça ‘Somebody’, uma música que escrevi para o primeiro álbum do Aerosmith: vem tudo dos Yardbirds. Eles eram os melhores para nós, dentre todas as bandas britânicas dos anos sessenta. Os Yardbirds eram um pouco misteriosos. Eles tinham um ecletismo – o canto gregoriano dos vocais, a diversidade melódica, a maneira como usavam o feedback da guitarra. Eu adorei essa estranheza.
Nos anos 60, eu fazia parte de uma banda chamada Chain Reaction. Conhecemos os Yardbirds porque eles tocaram na Staples High School em Westport, Connecticut, em 1966. Tínhamos um amigo, Henry Smith, que foi nosso empresário por um tempo, e ele estudou lá. Ele me ligou e disse: ‘Steven, os Yardbirds estão tocando aqui e você pode abrir’. Era a formação com Jeff Beck e Jimmy Page, que tocava baixo naquela turnê. Esperamos o dia todo até eles chegarem. Eu peguei os amplificadores deles, eles pegaram os nossos. Carregamos o equipamento um do outro, porque naquela época era isso que você fazia. Daí começou o boato de que eu era roadie dos Yardbirds.
Eles tocaram ‘Shapes of Things’, ‘Beck’s Boogie’, entre outras músicas. Eu fiquei pasmo. Eles tocaram como nenhuma outra banda. Eles não estavam preocupados com roupas, aparência ou singles de sucesso. A ideia deles era ‘O que fazemos com esses sons?’. Eles fizeram coisas com harmônicos – terças e quintas menores – que criaram esse som etéreo e monstruoso.
Você ouve isso em todas as músicas – a maneira como eles conseguiam pegar o blues e transformá-lo em uma música pop como ‘For Your Love’, e depois em algo psicodélico como ‘Shapes of Things’, que tem aquela parte central meio estranha. Você pode ouvir o clique quando Beck atinge sua fuzz box. Page, no final das contas, foi quem levou essas ideias até o fim com o Led Zeppelin. Os dois shows de que me lembro onde fiquei sentado de boca aberta foram o show do Yardbirds e o Led Zeppelin no Boston Tea Party em 1969.
Como cantor, o que aprendi com os Yardbirds foi que você não precisa ter uma ótima voz. É tudo uma questão de atitude. Ele era um garoto branco que levou isso ao máximo. E ele era um grande gaitista. Você nunca ouviu Jagger se manifestar em uma única nota como Keith Relf podia.
A pena é que eu sei como os Yardbirds eram ótimos. Mas não acho que todo mundo saiba disso. A música dos Yardbirds é uma mina de ouro esperando para ser descoberta. O Aerosmith sim, porque crescemos naquela época. O riff de ‘Walk This Way’ é apenas nós tentando explorar o blues no modelo Yardbirds. O que os Yardbirds fizeram é algo que você não ouve na música especial e pré-fabricada de hoje. Tudo está tão enlatado agora. Isso foi quando uma banda era uma banda. Você tinha todas essas personalidades e todos eles estavam realmente tocando juntos. E não ouço isso hoje. Os dias daquelas bandas, daquelas saídas selvagens, acabaram.
Igor Miranda é jornalista formado pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e pós-graduado em Jornalismo Digital. Desde 2007 escreve sobre música, com foco em rock e heavy metal. Colaborador da Rolling Stone Brasil desde 2022, mantém o site próprio IgorMiranda.com.br. Também trabalhou para veículos como Whiplash.Net, portal Cifras, site/canal Ei Nerd e revista Guitarload, entre outros. Instagram, X/Twitter, Facebook, Threads, Bluesky, YouTube: @igormirandasite.