Show incendiário do sexteto inglês na sexta-feira (6) já seria o bastante para os fãs, que assistiram sem saber a um espetáculo histórico, o penúltimo do baterista Nicko McBrain com a banda
Num improvável dia ensolarado de dezembro, os ingleses mais amados do heavy metal mundial se apresentaram no primeiro de dois dias de show na capital paulista. As apresentações fazem parte da turnê The Future Past, que abraça o sexto álbum de estúdio, Somewhere in Time (1986) e o último, Senjutsu (2021) e o palco, em duplo sentido, foi o Allianz Parque, na zona oeste.
O Iron Maiden é um espetáculo, seja pelas músicas antológicas ou o teatro com bonecos, luzes e fumaça nos palcos pelo mundo, e dessa vez não seria diferente. Na verdade, diferente estava o público, com cabelos mais rareados e brancos, o que não se imagina quando pensamos em um show de uma banda de heavy metal. Mas essa não é qualquer banda, e esse não é qualquer público.
O curioso em bandas desse calibre, são os fãs sempre completamente apaixonados; se vê gerações inteiras juntas como em poucos lugares (talvez um casamento ou funeral, vá lá), são avôs e avós com seus filhos e netos a tiracolo; uma pirâmide familiar indumentada com o mascote Eddie mostrando seus dentes nas capas de discos clássicos do metal. O Iron Maiden é uma festa. Em todos os sentidos.
Os dinamarqueses do Volbeat são responsáveis por aquecer os motores do público que começa a lotar o estádio. A mistura de heavy metal com hard rock e umas pitadas de rockabilly do quarteto até animam, mas como não são tão conhecidos por aqui, o público ainda aproveita para achar um bom lugar pra ver os donos da noite, comer alguma coisa ou pegar uma bebida durante sua apresentação.
O sexteto sexagenário liderado por Bruce Dickinson (vocalista) dá os primeiros sinais por volta das 20h50, quando as luzes se apagam e uma gravação de Doctor Doctor, dos também britânicos do UFO, explode nos alto-falantes. Na sequência, outra gravação, agora do grego Vangelis com a parte final da trilha sonora de Blade Runner (1982) abre o caminho para os acordes iniciais de “Caught Somewhere in Time”, um dos clássicos do álbum de 1986.
Enquanto escrevia este artigo, a história foi feita: soubemos, em tempo real, da saída do baterista Nicko McBrain. Aos 72 anos, 42 dedicados à banda, o músico compartilhou um comunicado dizendo que o show no dia 7/12/2024, aqui no Brasil será o seu último com o Iron Maiden:
“Após muita consideração, é com tristeza e alegria que anuncio minha decisão de dar um passo para trás da rotina do estilo de vida de turnês extensas. Hoje, sábado, 7 de dezembro, em São Paulo, será meu último show com o Iron Maiden. Desejo muito sucesso à banda daqui para frente.
No entanto, continuarei firmemente como parte da família Iron Maiden, trabalhando em uma variedade de projetos que meus empresários de longa data, Rod Smallwood e Andy Taylor, têm em mente para mim. Também estarei trabalhando em uma variedade de projetos pessoais diferentes e me concentrando em meus negócios e empreendimentos existentes, incluindo The British Drum Company, Nicko McBrain's Drum One, Titanium Tart e, claro, Rock-N-Roll Ribs!
O que posso dizer? Fazer turnê com o Maiden nos últimos 42 anos tem sido uma jornada incrível! Para minha devotada base de fãs, vocês fizeram tudo valer a pena e eu amo vocês! Para minha devotada esposa, Rebecca, vocês tornaram tudo infinitamente mais fácil e eu amo vocês! Aos meus filhos, Justin e Nicholas, obrigada por entenderem as ausências e eu amo vocês! Aos meus amigos que sempre estão lá por mim, eu amo vocês! Aos meus companheiros de banda, vocês fizeram um sonho se tornar realidade e eu amo vocês!
Olho para o futuro com muita animação e grande esperança! Vejo vocês em breve, que Deus abençoe a todos e, claro, ‘Up the Irons!’”, declarou o baterista.
Foi um reforço sem aviso de que o que foi presenciado foi histórico. Apesar da idade, Nicko e companhia parecem jovens músicos entusiasmados em todas as apresentações da banda. A vitalidade e a energia que o palco parece injetar em suas veias beiram ao sobrenatural. Já na segunda música, também do álbum Somewhere in Time (1986), "Stranger in a Strange Land", o guitarrista Janick Gers, com 67 anos, levanta o pé na altura da cabeça e o apoia em um amplificador na lateral do palco enquanto ao final da música o outro guitarrista Dave Murray, também com 67 anos, lança sua guitarra para cima e a pega novamente com uma facilidade inacreditável. As três canções na sequência são “The Writing on the Wall”, “Days of Future Past” e “The Time Machine”, todas do album Senjutsu (2021).
“The Prisioner”, do álbum The Number of The Beast (1982), “Death of the Celts”, do Sejutsu (2021) e “Can I Play With Madness”, do Seventh Son of a Seventh Son (1988) dão sequência para a pose clássica do baixista Steve Harris apontando seu baixo para a multidão, enquanto o guitarrista Adrian Smith esmirilha seu instrumento com solos perfeitamente encaixados com a correria de Bruce Dickinson em toda a extensão do gigantesco palco montado no estádio.
“Heaven Can Wait”, do Somewhere in Time (1986), presenteia os fãs com um duelo entre Dickinson e o boneco do Eddie caracterizado como o andróide da capa do álbum, meio pastelão, é verdade, mas divertidíssimo. A próxima canção, "Alexander the Great", também faz parte do disco de 1986 e abre caminho para as clássicas “Fear of the Dark”, do álbum homônimo de 1992 e Iron Maiden, do debut de mesmo nome da banda em 1981. A tríade de fechamento do show ficou com “Hell on Earth”, do Senjutsu (2021), “The Trooper”, do Piece of Mind (1983) e “Wasted Years”, do Somewhere in Time (1986).
Seria lugar comum dizer que o Maiden é uma das maiores e melhores bandas de todos os tempos e que continuam entregando tudo e mais um pouco nas apresentações, mas o que acontece em São Paulo neste fim de semana é histórico. E a quantidade de fãs de todas as idades presentes nos shows reforçam que o público está sempre se renovando, é praticamente uma paixão passada de geração para geração. É isso que uma banda gigante faz, e pelo que mostraram aqui em São Paulo, vão continuar por muito tempo — seja em qual formação existir.
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A Future Past World Tour 2024 do Iron Maiden chega ao Brasil com patrocínio exclusivo da Eisenbahn. Em parceria com a VOE, agência de live marketing do Grupo 4ZERO4, a cerveja oficial do espetáculo no Brasil preparou ações para celebrar a energia e a paixão do público, incluindo bares temáticos e pontos de ativação que propõem um mergulho no universo rock'n'roll.