Conforme o WME Awards realiza sua 5ª edição, Claudia Assef e Monique Dardenne ponderam as vitórias e os atrasos que persistem na indústria da música
Quando o WME Awards by Music2! surgiu em 2017, as idealizadoras Claudia Assef,Monique Dardenne e Fátima Pissarra - assim como muitas artistas brasileiras - precisaram provar que eram capazes de conquistar um espaço na indústria da música.
Muito além de se instalar no mercado musical, a plataforma Women's Music Event se tornou referência e a cerimônia passou a ser considerada a maior premiação da música, contrariando argumentos obsoletos sobre a desqualificação das mulheres para crescerem no segmento.
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"No começo, os homens, principalmente, falavam: 'Ah, o projeto de mulher das meninas.' Mas o WME entrou no hall das principais conferências do país, lançou tendências, funcionou como vitrine para o mercado da música, em relação às profissionais mulheres," disse Monique Dardenne à Rolling Stone Brasil.
E as conquistas do WME são resultados das jornadas duplas das fundadoras, as quais equilibram calls, pesquisas, shows, workshops com tarefas domésticas e a agenda das filhas. Aliás, a chamada de vídeo com a Rolling Stone Brasil aconteceu em horário de almoço, enquanto Assef e Dardenne organizavam os detalhes do WME Awards e acompanhavam a refeição das filhas.
Na próxima quinta, 16, o WME Awards realizará sua quinta edição, a qual acontecerá no Teatro B32, em São Paulo, e contará com mais de 30 shows, além de homenagens à Sandra de Sá, Cássia Eller e Marília Mendonça. O evento não será aberto ao público, mas será transmitido pelo canal e Youtube da TNT, a partir das 20h30.
Conforme o WME Awards completa cinco anos, Assef e Dardenne ponderam as principais vitórias da plataforma sem deixar de apontar as lacunas que persistem na indústria da música.
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Um ano antes de realizarem a primeira edição do WME Awards, a plataforma Women's Music Event foi criada em 2016. Neste ano, discursos sobre o protagonismo feminino ganhavam cada vez mais destaque, mas não necessariamente provocavam mudanças efetivas.
A quinta edição do Lollapalooza Brasil, por exemplo, colocou 104 músicos no palco, sendo apenas 10 mulheres. (Via Mulher na Música) Cinco anos mais tarde, o mesmo festival anunciou um lineup com 74 artistas, sendo 16 mulheres.
Em resposta, o WME "anunciou" o Dream-A-Palooza, festival dos sonhos composto por um lineup só com artistas mulheres, como Patti Smith, Alanis Morissette, Dua Lipa, Rosalía e mais. A ideia do evento fictício é mostrar que é possível incluir mais mulheres nos eventos musicais.
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"A gente ainda está muito atrás. Faltam muitas oportunidades. Vemos muitos lineups como se fosse 1998, com 100 nomes e duas mulheres. Vemos esse tipo de discrepância e fazemos um trabalho construtivo de não só apontar o erro, mas dar soluções," disse Assef.
Para além dos lineups de festivais, o WME identificou atrasos em diversos outros setores da indústria da música, como a profissionalização das mulheres, a visibilidade delas no mercado, o salário oferecido pelos eventos e o reconhecimento na área.
Após ser apresentado no Rio Music Conference, a plataforma realizou sessions com artistas em ascensão e abriu um banco de dados para mapear e divulgar profissionais da música no Brasil. Em seguida, Assef e Dardenne anunciaram a conferência anual, que levanta debates sobre temas como tecnologia, condições de trabalho e estratégias de mercado, e a premiação, que promove o reconhecimento de produtoras, compositoras, instrumentistas, diretoras, cantoras, djs, radialistas, jornalistas e empreendedoras.
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Dardenne afirma que a indústria fez muitos avanços nos últimos anos, mas entende que o progresso está centralizado na região Sudeste e destaca que o WME não é capaz de suprir as lacunas de todo o mercado. "O app de profissionais entrega para o mercado contatos de mais de 30 profissões. Mas não somos uma agência de emprego, apenas colocamos as profissionais disponíveis para o mercado procurar."
A empreendedora continuou: "A formação no WME acontece por meio de workshops específicos. Ainda não temos um programa no qual formamos mulheres. Isso seria muito importante, porque as mulheres se sentem mais confortáveis quando estão aprendendo com outras mulheres."
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Em outubro de 2021, o WME revelou mais um projeto voltado para mulheres na música, o selo IGUAL. A iniciativa busca incentivar "festivais, festas, clubes e casas de shows a ter pelo menos metade de suas equipes composta por mulheres, pessoas não-binárias ou trans."
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"Estamos percebendo a volta dos festivais, então queremos implementar o selo para o ano que vem… toda a premiação, vamos ter um momento no qual vamos falar sobre quais festivais e iniciativas ganharam o selo no ano anterior. Assim, vamos ter uma comparação de ano a ano," explica Dardenne.
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Assef completou a colega e falou sobre a naturalidade do projeto incluir pessoas LGBTQ+. "Não tivemos que lançar uma bandeira a favor do movimento LGBTQ+. Isso nunca foi uma questão e sempre foi natural, porque a gente sempre pensa em uma diversidade que abrace e apoie minorias que estão fazendo música."
"A gente entende que temos um lugar de privilégio e queremos usar esse espaço que estamos conquistando para trazer mulheres que são menos vistas pela sociedade," completou.
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Apesar das mulheres estarem longe de ter as mesmas oportunidades que os homens na música, Assef e Dardenne apontam um avanço na relação da temática com profissionais masculinos, incluindo os programadores do Lollapalooza Brasil e o Rock in Rio.
"São atitudes que você não via há cinco anos. Talvez porque a gente não estivesse fazendo esse levante e não tivesse esse encorajamento das nossas pares. Talvez porque a gente era uma voz sozinha na multidão, que olhava para o lado, mas ninguém vinha junto. Hoje, todas vêm juntas, não só mulheres, mas muitos homens também," disse Assef.
Em cinco anos, o WME buscou descentralizar a premiação da região Sudeste e formou um corpo de 450 mulheres espalhadas pelo Brasil . "A gente vem sentindo muito mais diversidade em relação à raça [por exemplo]. Contamos com mais mulheres indígenas, trans e, às vezes, temos maioria de mulheres negras entre as indicadas," pontuou Dardenne.
A empreendedora também falou sobre como a diversidade racial, cultural e profissional é importante para a representatividade, a qual vai muito além das indicadas. "Durante três anos, as mesmas jornalistas eram indicadas porque o mercado só conhecia elas."
Dardenne continuou: "Hoje, vejo meninas novas serem indicadas e acho incrível [...] Quando vi a Juli Baldi [indicada], me senti representada. Eu, a Clau e a Fátima [Pissarra, CEO da Mynd e Music2!] obviamente não podemos ser indicadas, mas é muito legal você se reconhecer em uma outra e falar: 'P*ta, ela está sendo valorizada, então também estou."
Em uma série de ações e reações, o WME transforma a indústria ao celebrar as mulheres e construir uma rede cada vez maior de profissionais na música.
"Uma das maiores conquistas que vejo na premiação é o engajamento das mulheres em relação às indicações. No primeiro ano, tivemos 200 mulheres indicadas em 14 categorias. Neste ano, a gente teve 2.500 mulheres. Você percebe como as mulheres estão se identificando com as profissões e crescendo. Elas estão se valorizando, mostrando a cara delas e as outras estão compartilhando," disse Dardenne.