Banda de Steven Tyler e Joe Perry fez boa mistura de sucessos, obscuridades e covers, enquanto o Def Leppard se redimiu com o público após shows fracos nos anos 1990
No terceiro dia do São Paulo Trip, festival realizado no Allianz Parque, a vez foi do hard rock e das power ballads, com Def Leppard e Aerosmith ganhando os refletores. Ambas as atrações já haviam se apresentado dentro da programação do Rock in Rio no dia 21. Neste domingo, foi a vez do público paulistano vê-los no palco.
O Def Leppard retornou ao Brasil este ano para acertar as contas com o passado. Eles deveriam ter vindo pela primeira vez ao país em 1985, no célebre Rock in Rio inaugural, quando se encontravam no auge, mas acabaram cancelando. Finalmente pisaram em nosso território em 1997, quando se encontravam em baixa, divulgando Slang, um dos piores discos da carreira. Os shows foram péssimos, com a banda totalmente sem gás. E o público, tanto no Rio quanto em São Paulo, foi escasso.
Mas agora o grupo inglês se encontra cultuado, e existia a expectativa de uma volta ao Brasil. Como é notório, o quinteto, que nasceu no final da década de 1970 no movimento new wave of british heavy metal, ampliou o sucesso quando começou a tocar o chamado hair metal, emulando a cena de Los Angeles e criando hits na década de 1980. Foi nesse pique de nostalgia oitentista que a banda agendou novos shows aqui, primeiro se apresentado no dia 21, dentro no Rock in Rio. No Rio, a performance por parte de Joe Elliot (vocal), Rick Savage (baixo), Rick Allen (bateria), Phil Collen (guitarra solo) e Vivian Campbell (guitarra base) foi muito boa, e o entusiasmo se repetiu em São Paulo.
A apresentação começou com “Let’s Go”, do álbum Def Leppard (2015), o mais recente lançado pelos músicos. Foi uma exceção, já que boa parte do setlist foi calcada no trio de LPs clássicos da banda: High 'n' Dry (1981), Pyromania (1983) e Hysteria (1987). Destes, a banda recordou "Rock of Ages", "Pour Some Sugar On Me”, “Animal” e outras pérolas do glam metal. E também não faltou a balada "Love Bites", uma das mais conhecidas canções deles por aqui. O final ficou com o rock "Photograph", de Pyromania.
Joe Elliott é um frontman que pode não ser exuberante, mas jamais está apagado no palco. A dobradinha de guitarristas atua de forma bem distinta, mas se completa - Campbell é mais sorridente e discreto, enquanto Allen está sempre sem camisa e com o corpo malhado. E, é claro, havia no ar a curiosidade de ver em ação o baterista Rick Allen, que em 1985 perdeu o braço esquerdo em um acidente de carro e desde então toca usando uma bateria adaptada. Allen, por sinal, foi ovacionado pelo público.
Já o Aerosmith vem ao Brasil com tanta regularidade que já existe uma previsibilidade. Assim, permanece aquela sensação de “é manjado, mas é legal”. O quinteto liderado pelo cantor Steven Tyler e pelo guitarrista Joe Perry ofereceu a dose certa de hits radiofônicos, canções mais obscuras e covers interessantes. Há uns dois anos dizem que estão em turnê de despedida. Enquanto não penduram a chuteira de vez, resta ao público aproveitar.
Tyler, aos 69 anos, felizmente ainda tem pique para ser o frontman exagerado, camp, carnal e galhofeiro que todos esperam. Joe Perry, que enfrentou sérios problemas de saúde no ano passado, está com o pé no freio, mas a habilidade dele de extrair notas extraordinárias de seu instrumento também não arrefece. Brad Whitford (guitarra), Joey Kramer (bateria), Tom Hamilton (baixo) e o músico de turnê Buck Johnson (teclados) se mantêm discretos, sem pretender ofuscar a dupla principal.
O show, que começou às 22h, com meia hora de atraso, foi diferente de outros que a banda fez por aqui. Os integrantes retiraram vários hits mais pop do setlist e se embrenharam na parte instrumental, com mais improvisos e digressões sonoras.
A banda entrou no palco colocando o público para se mexer com as agitadas “Let the Music Do the Talking” e “Love in an Elevator”; desaceleraram para executar a power ballad “Cryin'”, que desencadeou reações emotivas. O sinistro hit “Livin' on the Edge”, também muito recebido, foi o próximo da lista.
Depois, veio “Rag Doll”, com os músicos em total sintonia roqueira. Steven Tyler bradou: “Agora, gostaria de apresentar o senhor Joe ‘fucking’ Perry”. Foi a deixa para o guitarrista cantar e tocar o blues “Stop Messin' Around”, canção da fase inicial do Fleetwood Mac, enquanto Tyler demonstrou ser um competente gaitista. Ainda emendaram com “Oh Well”, outra clássica do Fleetwood Mac, com a dupla se alternando nos vocais (o vocalista até usou um megafone).
Para quem queria ouvir os hits mais óbvios, este interlúdio de blues foi um tanto longo. Sem problema: quem estava sentindo falta das baladonas derramadas ficou em êxtase quando tocaram o hit “Crazy”. A banda ainda emendou “I Don't Want to Miss a Thing”, power ballad de 1998 consagrada no filme Armageddon, mantendo assim o clima romântico e de “cante junto”. O pique mais agitado voltou com o rock básico "Mama Kin". Sempre um ponto alto dos shows dos Aerosmith, “Come Together”, cover dos Beatles, marcou outro bem vindo retorno à década de 1960.
Em seguida, o baixista Tom Hamilton entrou em ação criando o clima para a vindoura “Sweet Emotion”. Joe Perry aproveitou para improvisar, arrancando feedback de sua guitarra. “Dude (Looks Like a Lady)” encerrou a parte principal da apresentação, com o estádio em peso dançando e bradando o refrão. A banda agradeceu e saiu do palco. Depois da pausa, Steven Tyler reapareceu, sentou no tradicional piano branco e, sem muitas delongas, começou a tocar os primeiros acordes da poderosa balada “Dream On”. O cantor sempre se entrega na interpretação desta faixa e a reação do público, de total envolvimento e participação, foi contagiante.
O Aerosmith encerrou os trabalhos do domingo mergulhando na música black. Improvisaram “Mother Popcorn”, hit de James Brown da década de 1970 e, aproveitando o clima funk, vieram com o sacolejante hit “Walk This Way”, canção do álbum Toys in The Attic (1975) e que na década de 1980 ganhou cover do trio de hip-hop Run–D.M.C. Por volta das 23h40, o Aerosmith deixou o palco do Allianz, com o público se mostrando satisfeito.
O festival São Paulo Trip encerra na terça-feira, dia 26, com Alice Cooper e Guns N’ Roses.