“Nessa fase do rap de hoje, muita gente falou que estava sentindo falta do estilo do RZO, da forma como nos apresentávamos no palco”, diz o DJ Cia
“Fiquei bons anos na mente dos caras”, diz o DJ Cia, se referindo às tentativas de volta do grupo de rap RZO, formado por Helião e Sandrão, além dele. Foram dez anos durante os quais os integrantes tocaram projetos paralelos e se reuniram apenas uma vez antes de anunciar o retorno definitivo. “Uma das maiores motivações foi que os fãs pediam”, ele revela. “É uma parada muito louca saber que [o grupo] ainda está vivo”.
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No festival Tamo Aí Na Atividade, realizado em 13 de abril, em homenagem ao legado do Charlie Brown Jr., o trio participou cantando a música “A Banca” – lançada no disco Nadando com os Tubarões, de 2000, e posteriormente em Acústico MTV, em 2003, ambos da banda de Santos. “Aquela foi a primeira apresentação da volta oficial do RZO”, diz o DJ Cia. Entretanto, o show que vai marcar definitivamente o retorno acontecerá na Virada Cultural, que será realizada em São Paulo nos dias 17 e 18 de maio.
“Sim, vai sair disco”, confirma o DJ. “A gente tem algumas músicas que à época não foram lançadas”. Apesar de se encontrarem em diversos projetos, o último álbum em que os três tocaram juntos foi Evolução é uma Coisa, de 2003. “Tem muito moleque novo que não conhece nada de rap”, ele diz. “Não só o RZO. Não conhece o Consciência Humana, Realidade Cruel, Gog, Da Guedes. Não conhece um monte de gente que abriu caminho para essa rapaziada que está aí hoje”, justifica ele sobre a importância do retorno do trio.
Da “rapaziada que está aí hoje”, o DJ Cia cita Emicida, Criolo e Projota como artistas que reconhecem o trabalho do RZO. “Isso é incontestável”, ele diz, “com certeza a gente abriu caminho para muitos manos que estão aí”. O Rapaziada da Zona Oeste (RZO), nos anos 1990, revelou nomes como Sabotage e Negra Li, além de ter feito rap em tempos mais difíceis para o estilo no Brasil.
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“Tinha show em que a gente estava no meio do palco e tinha policial esperando a gente descer porque estava falando tal fita”, ele conta. “Tem policial que, na época, não aguentava ouvir aquelas paradas. Não entendiam”. Além do RZO, ele se lembra de grupos como o Racionais MC’s e o MRN, que também entravam em conflito com os policiais. “Hoje, nego sabe um pouco mais de direito que antigamente, e o rap colocou essa parada”, analisa. “Se você anda na linha, não tem porque o cara te agredir”. “Antigamente, mesmo estando certo, se você tomasse um enquadro e falasse ‘por que?’, já tomava um tapão na orelha, entendeu?”.
Para um novo disco, além da produção mais refinada – graças à experiência adquirida pelo DJ em parcerias com Seu Jorge, viagens ao exterior e turnês solo –, a adição de instrumentação variada deve ser a novidade no som do grupo. Segundo Cia, a percepção necessária ao RZO tem a ver com se encaixar no rap atual. “A grande parada é dar essa remodelada sem perder a essência do RZO”, ele explica. “A gente sabe o que está acontecendo”, comenta a respeito da composição de novas letras. “O rap sempre canta tempos atuais. Canta o que está vendo”.
Apresentando-se aos jovens como um dos nomes mais representativos do rap brasileiro, o RZO se prepara para entrar em estúdio, mas antes, mantém o foco no show agendado para a Virada Cultural. “Tem que voltar pesado, bonito, com sintonia – porque ficamos afastados uns dos outros”. Ele deseja “sentir mesmo aquela coisa que era o RZO”.
O rap nacional, que recebe de volta o trio, evoluiu muito em relação àquele de dez anos atrás. E grande parte dessa mudança se deve ao DJ Cia, Helião e Sandrão. “Hoje a grande diferença é a aceitação”, ele analisa. “Hoje, se você fala que canta rap, nego quer se envolver, quer estar junto”. Apesar do respeito adquirido, absorver o tempo parado e encontrar espaço no rap atual é o grande desafio do trio. “Nessa fase do rap de hoje, muita gente falou que estava sentido falta do estilo do RZO, da forma como a gente se apresentava no palco”, diz DJ Cia.