No quesito vendagem e popularidade, o verdadeiro rival do Fab Four foi o The Hollies
Quando se fala de rivalidades entre bandas inglesas nascidas na década de 1960, o primeiro embate a ser citado é aquele entre os Beatles e os Rolling Stones. Mas, no quesito vendagem e popularidade, o verdadeiro rival do Fab Four foi o The Hollies. Os músicos de Manchester colocaram inúmeras canções nas paradas durante as décadas de 1960 e 1970, entre elas “Just One Look”, “I’m Alive”, “Look Through Any Window”, “The Air That I Breathe”, “Bus Stop”, “Carrie Anne”, “He Ain’t Heavy, He’s My Brother”, “Stop Stop Stop” e “Long Cool Woman in a Black Dress”. São hits melódicos, otimistas e com exuberantes harmonias vocais.
Relembre cinco performances inesquecíveis de Joe Cocker.
A formação mudou algumas vezes, mas a banda nunca parou. Só que mesmo com tanta visibilidade, o The Hollies parece ter sido “esquecido” pelos historiadores do rock. São mencionados como um dos principais participantes da Invasão Britânica que tomou conta do mundo a partir de 1964, mas a trajetória deles nunca é aprofundada. Superficialmente, o grupo é lembrado por ter sido o berço de onde o cantor e guitarrista Graham Nash saiu para se juntar a Stephen Stills, David Crosby e Neil Young no CSN&Y.
O The Hollies acabou sendo “normal” demais para os padrões do rock. A trajetória deles foi pautada pela amizade, com um currículo não maculado por escândalos ou envolvimento com drogas. Durabilidade é a palavra-chave. Hoje, o grupo é uma instituição da música inglesa. Em 2010, entrou para o Hall da Fama do Rock and Roll – um justo, embora um tanto tardio, reconhecimento por parte da crítica e da indústria. Neste momento, celebram a trajetória com a coletânea dupla 50 at Fifty (Warner), que vem com todos os grandes hits do passado e a inédita “Skylarks”, gravada para a ocasião. E seguem com uma agenda intensa de shows pela Europa.
Dez grandes parcerias do rock and roll.
Apesar de ter sido formado em 1962, o The Hollies escolheu 2014 para comemorar os 50 anos de carreira. Os vocalistas Allan Clarke e Graham Nash, amigos desde crianças, foram os fundadores e líderes, mas saíram há um bom tempo. Hoje, o guitarrista Tony Hicks e o baterista Bobby Elliott são os únicos da formação clássica da década de 1960. Hicks, de 68 anos, exercita a modéstia que sempre foi característica do The Hollies. “Comecei com 17 anos. Foi um hobby que deu certo”, diz, refletindo sobre a longevidade do grupo. “Não achava que iria ganhar dinheiro tocando rock, muito menos que pudesse durar cinco décadas neste negócio. Quando começamos a gravar, pensamos que nossa carreira iria resistir por três ou quatro anos. Mas estamos aqui ainda. Estes 50 anos voaram!”
Tony Hicks é um guitarrista e cantor subestimado. A contribuição dele foi vital para que o The Hollies decolasse e o som deles ganhasse corpo. “Eu entrei apenas para tocar guitarra”, ele relembra. “Allan e Graham tomavam conta dos vocais e soavam muito como os Everly Brothers. Mas eu comecei a cantar e adicionei uma terceira voz às harmonias. Nossos vocais não eram tão intrincados quanto os dos Beach Boys, mas aos poucos o público começou a notar que eles faziam toda a diferença.”
O curioso caso do sumiço do rock: muitos tentam, mas o verdadeiro bastião desse gênero é Josh Homme.
De 1963 a 1965, o grupo tirava inspiração de Buddy Holly e Chuck Berry, além de ecoar os Beatles. Mas, a partir daí, o som do The Hollies se tornou mais elaborado e cheio de detalhes, como pode ser ouvido em álbuns cult como For Certain Because, Would You Believe? (ambos de 1966), Butterfly e Evolution (estes de 1967). Segundo Hicks, esses discos foram fruto da visita deles aos Estados Unidos. “Começamos a ouvir bandas que estavam surgindo, como The Lovin’ Spoonful e The Mamas and the Papas, e também acompanhávamos a evolução dos Beach Boys. A música feita em São Francisco e em Los Angeles nos influenciou muito. Levamos para a Inglaterra toda aquela expertise de estúdio que eles tinham, e acabou dando certo.”
Graham nash era a principal força para que o The Hollies seguisse uma linha mais progressiva e psicodélica. Mas quando o single experimental “King Midas in Reverse” (1967), concebido por ele, não alcançou o sucesso desejado, o produtor Ron Richards exigiu que eles seguissem gravando canções mais comerciais. Foi o começo do desgaste de Nash dentro da banda, que culminou na saída dele no final de 1968.
Dez shows de despedida que gostaríamos de ter visto.
No entanto, Hicks explica que as coisas foram mais complexas. “Graham era muito infeliz naquela época”, revela. “O problema não era apenas o rumo musical. O casamento dele era um desastre e ele não gostava da vida que tinha na Inglaterra. Quando esteve nos Estados Unidos, conheceu David Crosby e Stephen Stills e quis fazer música com eles. Assim, ele não deixou apenas o The Hollies – deixou para trás tudo que tinha no país e se tornou um norte-americano adotado.” A saída de Nash não abalou a amizade que ele tinha com Hicks, Clarke e os outros. “Ele ainda voltou para cumprir as datas que tinha com a gente e esperou até que achássemos um substituto, no caso, Terry Sylvester [ex-The Swinging Blue Jeans], que se encaixou perfeitamente”, retoma Hick.
Mesmo sem Nash, a banda seguiu pelas décadas seguintes como se nada tivesse acontecido, adaptando-se aos novos tempos, emplacando várias canções e excursionando ao redor do mundo. A estabilidade foi quebrada quando o cantor Allan Clarke teve que sair, em fevereiro de 2000. “Foram tempos ruins para Allan”, Hicks explica. “A esposa dele estava doente, e ele começou a cancelar shows. A voz dele já não dava conta de cantar por duas horas. Era a hora de parar e ele aceitou a aposentadoria graciosamente.” Para o lugar de Clarke foi convocado mais um veterano: Carl Wayne, vocalista do The Move, outra banda de sucesso do final da década de 1960. “Foi sensacional enquanto tivemos o Carl com a gente”, diz Hicks. “Ele era muito versátil e pudemos explorar o passado dele, tocando ‘Fire Brigade’, ‘Flowers in the Rain’ e outras da época do The Move.”
O curioso caso do sumiço do rock: muitos tentam, mas o verdadeiro bastião desse gênero é Josh Homme.
Carl Wayne morreu de câncer em 2004, aos 61 anos, e um novo cantor apareceu para preencher a vaga. O escolhido foi Peter Howarth. “Peter é mais jovem do que a gente e sempre foi um grande fã do The Hollies”, conta o guitarrista. “Ele já veio com o repertório na ponta da língua e sabe trabalhar em equipe como ninguém.”
Hicks não se diz nostálgico, mas fala com carinho sobre o apogeu do The Hollies na década de 1960. “Aquele período da Swinging London foi intenso”, recorda. “Excursionamos com os Rolling Stones, íamos aos clubes da moda e bebíamos com os Beatles,The Who e Jimi Hendrix, entre outros.” Sobre a reputação de serem “certinhos”, ele nem tenta polemizar. “A banda nunca teve um lado selvagem ou rebelde. Não me lembro de termos jogado sequer uma televisão pela janela de um quarto de hotel”, diz despreocupadamente. “Certa vez, Allan falou que nós éramos tão psicodélicos quanto um copo de cerveja. Isso nos define bem.”