Músico comentou sobre o episódio que aconteceu há 20 anos no festival
Em 14 de janeiro de 2001, há exatos 20 anos, Carlinhos Brown não viveu um de seus melhores dias. O músico baiano se apresentou na 3ª edição do Rock in Rio, na mesma noite que os grupos de rock Papa Roach, Oasis e Guns N' Roses, e precisou enfrentar a ira dos roqueiros.
Durante o grande hit do músico, A Namorada, Carlinhos Brown desceu perto do público e foi agredido com uma "chuva" de garrafas plásticas, além de receber vaias, xingamentos e dedos do meio levantados. "Eu só jogo amor, não jogo nada em ninguém. Podem jogar o que vocês quiserem porque eu sou da paz e nada me atinge", disse o cantor no microfone.
Antes de deixar o palco, visivelmente incomodado com a situação, discursou: "Vocês que gostam de rock, vocês têm muito o que aprender na vida. Tem que aprender a respeitar o ser humano, dizer não à violência e a dizer sim ao amor. Acreditem na vida. Agora, o dedinho podem enfiar no traseiro".
Em entrevista exclusiva para a Rolling Stone Brasil , Carlinhos Brown relembrou e comentou sobre o episódio que completa duas décadas nesta quinta, 14, e que ficou eternizado na história do músico e do Rock in Rio.
Sempre positivo, o cantor e técnico do The Voice Brasil disse que aquele acontecimento foi necessário para que tanto o artista quanto o público se refizessem. Ele também revelou que alguma daquelas garrafas o pegou como um trem bala e o arremessou a espaços jamais vistos, e que aceitaria se apresentar novamente no Rock in Rio entre artistas de rock e de heavy metal, pois o momento hoje é outro.
Confira a entrevista:
Rolling Stone: Relembrando o show do Rock in Rio de 2001, em que houve o episódio do público lhe jogando garrafas de água, qual é o seu sentimento hoje?
Carlinhos Brown: "Precisamos estar abertos para ser experimentais em um país experimental. O rock é um dos grandes companheiros da juventude, e se expressa com liberdade, provocando e promovendo experimentações.
O que chamamos de atitude, no entanto, passeia por esferas mais abrangentes e diz respeito não só a essa chama juvenil individual que habita em nós, mas também ao contexto social e o que ele pede dessas atitudes em nós. Os choques. Guanabara choca. A imagem do índio ainda choca. Guardar heranças e fazer sobreviver raízes é uma atitude de forte expressividade. Manter-se atento para escutar além das fronteiras, cuidar da Natureza abundante, lutar a favor dela e contra as desertificações, às secas, tudo isso é expressividade rockeira, atitude.
No entanto, é importante frisar que não há justificativas para violências. Por nenhum motivo devemos agredir um outro qualquer. Mas, a minha compreensão é que aquele momento se firmou como necessário para que nos refizéssemos, cada um alí presentes, e simbolicamente também, pois um artista sonha com grandezas e guardei em mim a gratidão por ter sido eu a exercer aquela função, naquele momento de choque.
Alguma daquelas garrafas me pegou como um trem bala e me arremessou a espaços jamais vistos. Falo com gratidão, pois ambos - eu como artista e o público -, precisávamos deixar alí certas fraquezas, que enrijecem o aprendizado de encontrar caminhos mais positivos para a convivência das diversidades no nosso país".
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Em algum momento após o show você chegou a pensar que poderia ter respondido ou agido de outra forma com o público?
"Eu não tinha experiência em ser grande. Apenas imaginava em oferecer o melhor. Alí estava todo o desejo da favela de subir ao palco com as batucadas, com os projetos sociais. E tudo aquilo era muito diferente para o momento, pois não era corriqueiro.
Sempre, ontem e hoje, eu como artista, ajoelho-me para o público, dobro-me em reverência, porque o público também destina. E aquele público é parte de tudo que me fez chegar até aqui. Foi bom, meu avião fez voos altos e eu não perdi o chão. E também mexi com o heavy metal percussivo que trouxe mudanças importantes para o estilo".
Você acha que hoje a reação do público seria a mesma? Ou as pessoas estão mais aptas a entender e a aceitar as diferentes propostas musicais de cada artista?
"O contato e a comunicação pública do artista estão sempre se renovando. Acredito que sim, que as pessoas estão mais aptas a acolher novas propostas e que o público está muito mais preparado, porque também há um amadurecimento desde o ocorrido, há um tempo trazendo essas transformações. Considero que tudo é recomeço, pois a cada manhã renascemos para recomeçar algo, e o que já foi feito passa a pertencer ainda mais ao tempo do que ao artista".
Se em uma futura edição o Rock in Rio lhe convidasse para se apresentar no mesmo dia de artistas de rock e heavy metal, como aconteceu em 2001, você aceitaria?
"Claro que aceitaria. Estamos em um novo momento e, inclusive, eu poderia mostrar melhor a minha proposta e experiências com o heavy metal, já que eu tive também a oportunidade de trazer para essa linguagem musical o que os grandes pensadores do estilo consideram importantes avanços.
Quando sou convidado pelo Scorpions, pelo Sepultura, pelo Angra, o Living Colour, ou quando toco com Tarja Turunen ou desenvolvo, como fizemos em 2015, um trabalho de Master Class com a Pracatum com o guitarrista Steve, entre outros parceiros, tudo isso consolida o positivo de toda essa situação, além de eu ter vindo de uma banda de rock que é o Mar Revolto, e mesmo anos depois, ainda tem um disco pedindo oportunidade de lançamento.
Ou seja: estou sempre começando e penso que o rock and roll é como Cristo, pertence a todos. Tudo nasceu na África, mas pertence ao mundo. E o meu manifesto de paz segue o mesmo, e ainda mais fortalecido em seus propósitos".
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