Na década de 1970, o filme de Jim Sharman estabeleceu o primeiro contato de muitos espectadores com o universo queer
Assistir The Rocky Horror Picture Show foi, para mim, uma experiência transformadora. Eu sempre fui uma criança precoce e curiosa, em muitos sentidos, e, aos 13 anos, o filme me caiu como uma luva. Na época, eu já fazia teatro há quatro anos e era completamente apaixonada por música. Quando as duas coisas se juntavam, então, era tiro e queda.
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Mas Rocky Horror, é claro, desceu de uma forma diferente, única. Instigante. Talvez essa seja a palavra. Dali a três ou quatro dias, eu sabia todas as falas de cor e cantava as faixas do começo ao fim. A verdade, no entanto, é que eu não entendia muito bem o caráter revolucionário do filme até há pouco tempo, quando o revisitei depois de quase cinco anos. Agora, com outra cabeça.
The Rocky Horror Picture Show é uma sátira aos (inúmeros) filmes de terror e ficção científica da década de 1930 até o início da década de 1960, o que é evidenciado ainda nos primeiros minutos do filme, quando uma boca flutuante canta "Science Fiction, Double Feature" e faz referências ao ator Michael Rennie e ao herói Flash Gordon com sua "cueca prata". Relembre:
Dirigido por Jim Sharman, The Rocky Horror Picture Show é baseado no musical homônimo de 1973, escrito pelo também ator Richard O'Brian (que vive o "faz-tudo" Riff Raff). O roteiro foi adaptado de forma brilhante - e bastante teatral - para as telonas, configurando uma comédia de terror britânica.
Lançado, enfim, em agosto de 1975, o filme começa com um criminologista, que narra a história de Brad Majors e Janet Weiss. Após um pedido de noivado fabuloso (com direito a muita cantoria), o casal se perde no meio de uma noite fria e chuvosa, sendo obrigado buscar ajuda - e a única coisa que encontram é um castelo no mínimo suspeito. Lá eles conhecem o Dr. Frank-N-Furter, que se autoproclama "uma doce travesti de Transexual, Transilvânia" e acaba de finalizar seu último experimento: Rocky, um humano artificial criado para satisfazer-lhe.
"Por que você não fica para a noite? /
Ou talvez para o jantar? /
Eu poderia mostrar-lhe a minha obsessão favorita /
Eu estive fazendo um homem /
Com cabelos loiros e um bronzeado /
E ele é bom para aliviar a minha... Tensão", canta Frank, pedindo para que Brad e Janet ficassem mais um pouco.
Nesse meio tempo, o enredo se desenrola: Frank seduz Brad e Janet separadamente - e nenhum dos dois resiste a ele. Depois, o Dr. Everett Scott invade o castelo para resgatar seu sobrinho, Eddie, que também havia sido manipulado por Frank e ficou preso lá dentro.
Já no final do filme, os assistentes de Frank, Riff Raff e Magenta, revelam-se alienígenas do planeta Transexual, da galáxia Transilvânia, matando, em seguida, Frank e todos os presentes, exceto Brad, Janet e Scott, que ficam no planeta Terra. Depois, eles decolam no próprio castelo, que, esse tempo todo, era uma espaçonave.
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Com uma premissa exótica para os anos 1970, The Rocky Horror Picture Show foi inicialmente um fracasso de bilheteria, enfrentando uma audiência muito pequena. Pouco tempo depois, o filme decolou e, quando o fez, seu sucesso foi irrefreável - tanto que conquistou o status de "cult" após as famosas sessões noturnas, primeiro em Nova York e, eventualmente, no mundo. Muito disso se deve, é claro, ao público LGBTQA+, que logo se identificou com seu apelo à liberdade sexual.
Segundo o crítico Roger Ebert, do Chicago Sun-Times, Rocky Horror foi, a princípio, "ignorado pela maioria das pessoas, incluindo os fanáticos que eventualmente o assistiriam centenas de vezes". Enquanto isso, em 2005, o “Registro Nacional de Filmes” (National Film Registry) dos Estados Unidos classificou o filme como "cultural, histórica e esteticamente significativo."
"Ele é o maior sedutor de todos", disse Tim Curry sobre Frank-N-Futher (via The New York Times).
"Todo mundo é um alvo em potencial."
É literalmente impossivel não se impressionar com a performance estonteante de Tim Curry em Rocky Horror. O elenco inteiro é brilhante, com Susan Sarandon, Barry Bostwick, Richard O'Brien, Patricia Quinn, Nell Campbell, Meat Loaf, entre outros. No entanto, vestindo uma jaqueta de couro e meia arrastão, Curry deu tudo de si como Frank-N-Further e merece ser eternamente enfatizado.
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Bom, vamos ao que interessa: The Rocky Horror Picture Show é um dos maiores clássicos queer, visto que estabeleceu, em 1975, o primeiro contato de muitos espectadores com o universo LGBTQA+ a partir de experiências de transvestismo e descobertas homossexuais. Ainda, o filme, à frente do tempo, contrastou o "conservadorismo" da década de 1950 com a "subversão" da década de 1970, abrindo portas para o autoconhecimento e levantando questões de gênero que eram, muitas vezes, varridas para baixo do tapete.
Em The Rocky Horror Picture Show, podemos observar que tanto a masculinidade quanto a feminilidade e a liberdade neutra em termos de gênero mostram-se presentes. O Dr. Frank-N-Furter é um espírito livre que, eventualmente, revela uma personalidade viril dominante, embora sua vestimenta, maquiagem e trejeitos sugiram uma feminilidade sedutora (a qual ele sabe como e quando usar).
the rocky horror picture show (1975)
— aquamarina ⌁☍ (@avadazkedavra) June 30, 2020
- viadagem terror música frankenstein pegação e experiências
- ícone queer, nem imagino o impacto em plenos anos 70
- músicas incríveis
- LET'S DO THE TIME WARP AGAIN pic.twitter.com/00HExxHliK
Por mais que o filme tenha estreado numa época marcante para as discussões de sexualidade, ele ainda é bastante atual, afinal, ajudou muitas pessoas do meu convívio a descobrirem que não se identificam com as regras heteronormativas impostas pela sociedade.
Sem mais delongas, é pouco dizer que Rocky Horror expandiu meus horizontes e mudou a maneira como eu encaro algumas questões. Muitos ensinamentos ficaram - e, entre eles, o fato de que, idealmente, todos nós deveríamos ser quem quisermos ser. Talvez seja por isso que a frase "Don't Dream It, Be It" (ou melhor: "Não Sonhe, Seja") ainda ecoe tanto na minha cabeça, mesmo depois de tanto tempo.
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