"Eu fico maravilhado com tudo isso, porque estou tendo a oportunidade de relembrar e tocar junto aos amigos", disse o sanfoneiro à Rolling Stone Brasil, em 2011
"Você urbanizou o forró. Daqui pra frente, tem que ser tudo mais mió!", "disse" Luiz Gonzaga a Dominguinhos em "Quando Chega o Verão", canção de 1980. Dominguinhos foi herdeiro musical de Luiz Gonzaga, segundo declarou o próprio Lua. Também foi Gonzaga quem deu o nome artístico a ele, nascido José Domingos de Morais.
Dominguinhos, morto nesta terça, 23, aos 72 anos, após uma longa batalha contra o câncer (saiba mais), deu continuidade à obra do Rei do Baião, levando o forró, essa música tão brasileira, aos quatro cantos do país.
Vídeo: dez grandes canções de Dominguinhos.
A relação de Dominguinhos com a sanfona e a importância do artista para a música brasileira serão mostrados no documentário Dominguinhos, Volta e Meia, de Felipe Briso (com direção musical e artística da cantora Mariana Aydar, do músico Duani e do compositor Eduardo Nazarian). O filme tinha previsão de estreia para 2012, mas o processo de pós-produção acabou se estendendo mais do que o esperado.
Em 2011, os envolvidos com o projeto mergulharam na obra do artista. Foram organizados diversos encontros musicais com Dominguinhos, que já estava doente, mas aproveitava períodos de melhora para gravar. Essas parcerias com João Donato, Wilson das Neves e Luiz Alves, Lenine e Gilberto Gil, entre outros, estarão no longa-metragem. Segundo a produtora Deborah Osbourn, foram mais de 60 horas de gravação. “Estamos muito abalados”, disse ela sobre a morte do músico, revelando que ainda não há uma previsão de estreia, embora o filme já esteja na fase final da montagem. Há também o plano de uma série de TV baseada nesses encontros e de um piloto para a internet.
Felipe Briso explicou que a ideia é usa as parcerias “para pontuar os momentos da trajetória de Dominguinhos”. “As histórias que vêm à tona servirão de gancho”, contou. Além dessas conexões (que também resgatam faixas menos conhecidas do sanfoneiro), Dominguinhos, Volta e Meia contará com entrevistas e material de arquivo. "Eu fico maravilhado com tudo isso, porque estou tendo a oportunidade de relembrar e tocar junto aos amigos", afirmou o músico de sorriso sereno e fala vagarosa à Rolling Stone Brasil, em 2011.
Dominguinhos trazia na bagagem um talento plural de quem conseguia transitar por diversas sonoridades, sem se desconectar de sua essência. Ele dizia que isso era culpa de sua maior companheira, a sanfona (a primeira da vida dele, aliás, foi um presente de Gonzagão). "Enxergo como um instrumento mundial, você pode tocar o que quiser. Música erudita, clássica, bolero, samba-canção, bossa nova", ele nos disse. "É só ter conhecimento e vontade de se modernizar." Essa questão de não se restringir apenas ao regional será outro aspecto abordado no documentário, que busca apontar a universalidade do artista. "Ele é um cara que esteve em muitas épocas", falou Mariana Aydar. "Da Tropicália aos dancings."
O pernambucano de Garanhuns estabeleceu seus laços musicais na infância, tocando pandeiro com os irmãos. Aos 8 anos, conheceu Luiz Gonzaga em um hotel da cidade. Os meninos tocaram algumas canções, mas eles sequer sabiam quem era aquele homem. "Ele nos deu o endereço dele no Rio de Janeiro e um pacote de dinheiro", recordou Dominguinhos, que, em 1954, foi para Nilópolis e procurou pelo consagrado músico, de quem nunca mais se afastou. De Neném do Acordeon passou, aos 16 anos, a se chamar Dominguinhos e foi adotado pelo Rei do Baião como "filho postiço" e herdeiro artístico.
Com reportagem de Stella Rodrigues