Entrevista: com Alien - Covenant, Ridley Scott quer levar o espectador para mais perto do primeiro filme da franquia
Diretor, no entanto, prefere não usar a palavra "horror" para caracterizar o novo longa: "Acho que há muitos filmes ruins nesse gênero. Às vezes, até irresponsáveis"
Bruna Veloso
Publicado em 12/05/2017, às 14h26 - Atualizado em 14/05/2017, às 02h24Nas poucas imagens de Alien: Covenant mostradas aos jornalistas em fevereiro, em Los Angeles, uma coisa ficou bastante clara: os elementos de terror presentes no filme original estão de volta. No antecessor Prometheus, primeira parte de uma trilogia de prequels do original, essa característica estava quase morta. Mas não se atreva a usar a palavra “horror” para caracterizar Covenant, que estreia este mês. “Eu não gosto do termo ‘horror’. Acredito que somos melhores que isso, e acho que há muitos filmes ruins nesse gênero. Às vezes, até irresponsáveis”, diz o cineasta Ridley Scott, quatro vezes indicado ao Oscar, por Perdido em Marte, Falcão Negro em Perigo, Gladiador e Thelma & Louise. “Como diretor, desenvolvi um senso de responsabilidade em relação ao quão longe você vai quando o assunto é violência, porque o negócio perigoso com o cinema é que ele dá ideias para pessoas malucas. Então, tomo muito cuidado.” Ele recorda que meses depois de estrear o clássico Alien, o Oitavo Passageiro, em 1979, recebeu a carta de um fã. A chocante cena em que a criatura estoura o peito do tripulante Kane (John Hurt), dentro da espaçonave Nostromo, fez o espectador se perguntar se a ideia era fazer um paralelo com o câncer. “Eu me senti bastante ofendido. Se quero fazer algo escancarado, tento fazer com humor negro, como foi em Hannibal. Tento manter o bom gosto. O negócio saindo do peito dele foi extremo... mas acho que foi apropriado. Era um monstro.”
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O que está em jogo é que Alien: Covenant se aproxima da estética e da vibração do primeiro filme. Situada 20 anos antes dos acontecimentos do original, e 10 anos depois do que vemos em Prometheus, é a segunda parte da trilogia que conta o que aconteceu previamente à fadada jornada da Nostromo. Michael Fassbender, que viveu o androide David em Prometheus (um filme de ritmo mais lendo, odiado por uns, admirado por outros), volta em dois papéis: um David reformado e uma versão atualizada dele, Walter. “Eu finalmente pude contracenar comigo mesmo, o que devo dizer que foi uma experiência excepcional [risos]”, brinca o ator. “Foi interessante, do ponto de vista técnico, ver como funciona rodar uma cena assim hoje em dia.”
Ao final de Prometheus, resta apenas a cabeça de David, junto à protagonista Elizabeth Shaw (interpretada por Noomi Rapace, que faz uma ponta em Covenant). No novo filme, os tripulantes da nave, cujo nome é Covenant, chegam a um planeta que julgam ser um paraíso – a princípio, o filme se chamaria “Paraíso Perdido” –, para então se depararem com um cenário nada idílico.
Prometheus tinha menos ação e mais questionamentos filosóficos. “Acho que uma coisa interessante nesse filme foi retratar a obsessão que há em relação ao que acontece conosco depois que morremos, e como nos voltamos à religião como uma espécie de fonte de conforto”, reflete Fassbender. “Nós, como seres humanos, buscamos algum tipo de significado profundo em nossa existência, talvez por conta de certa arrogância na dificuldade de pensarmos que somos apenas mais um elo na corrente e que, quando morremos, acabou.” O robô David faz a ponte entre a primeira e a segunda parte da trilogia, mas em Covenant a sensação física do espectador deverá ser mais próxima do medo do que do debate existencial.
“Foi horripilante ler o roteiro, atuar no filme e tenho certeza de que estarei cagando nas calças quando assisti-lo”, zomba o mexicano Demián Bichir, que interpreta o sargento Lope, encarregado da segurança da tripulação. “Nos estúdios, em Sydney, os sets eram fantásticos. Eu não estava preparado para o que vi, era assustador demais.”
O filme foi rodado em quatro meses em locações na Austrália e na Nova Zelândia. Há cenas que remontam ao “paraíso perdido” da ideia original, mas as condições meteorológicas ajudaram a passar para a tela o clima de tensão – e, claro, a dificultar algumas coisas. “O ambiente era bem hostil, mas Ridley é um guerreiro, e você tem que estar pronto para isso. Ele nunca fica cansado, nunca reclama de nada”, diz o ator. “Teve um dia que estava chovendo e ventando tanto, que lembro de pensar que não teria jeito de gravarmos. Só que Ridley queria gravar. Pensei que em 15, 20 minutos ficaria claro que não havia condições. Nada disso: ficamos lá um tempão, as barracas estavam voando, era difícil manter as coisas no lugar. Gravamos assim, e foi formidável.”
Tanto Bichir quanto Fassbender fazem questão de, mesmo quando não questionados diretamente, exaltar o trabalho de Ridley Scott, de 79 anos. “Ele é generoso, entende a profissão de ator muito bem. E é muito divertido. Tem essa qualidade juvenil, um senso de encantamento que permanece até hoje”, afirma o ator de ascendência alemã e irlandesa.
Em Alien, o Oitavo Passageiro, Scott colocou na linha de frente uma heroína, Ripley, interpretada pela então pouco conhecida Sigourney Weaver. É outro ponto de destaque do longa, já que na época não era comum ver mulheres em papéis como esse. Não é diferente em Covenant, que tem Katherine Waterson na pele da especialista Daniels. Para ele, a fórmula não funcionou tão bem nos outros filmes derivados do longa de 1979 – quatro sequências, mais dois spin-offs em conjunto com a franquia O Predador. Nenhum desses filmes foi dirigido por Scott, e ele diz gostar de verdade apenas do segundo, Aliens, o Resgate (1986), dirigido pelo amigo James Cameron. Na época, Scott nem chegou a ser chamado para o projeto. “Não me contaram que estavam fazendo. Acho que pensaram que seria muito caro fazer comigo. Deve ter saído mais barato fazer com o Jim”, ri o diretor. Se não aprecia muito do que fizeram da franquia, Scott tem a chance de “consertá-la” nas prequels. O roteiro do terceiro filme estava avançado antes mesmo da estreia de Covenant, e ele não descarta a ideia de expandir ainda mais o universo de Alien. Possibilidades de extrair histórias do espaço, segundo ele, não faltam. “Tendo feito Perdido em Marte, conversei muito com a Nasa. E sempre fiz essa pergunta, sobre o que há lá em cima”, detalha. “Eles acreditam que há muitas, muitas diferentes evoluções e formas de vida. Algumas como nós? Provavelmente. Algumas mais evoluídas? Certamente. Quando olhamos para o tamanho do universo, pensar que estamos sozinhos é ridículo.”