O astro do cinema interpreta Barba Negra em longa-metragem com direção de Joe Wright
Quando está longe do trabalho, Hugh Jackman não gosta de problematizar nenhuma situação, nem mesmo na hora de lidar com a intromissão dos paparazzi. “É uma parte muito pequena do meu dia a dia. Poderia se tornar um fardo, eu poderia sair gritando com todo mundo, mas, no final das contas, é apenas como um engarrafamento: em cinco minutos eles irão embora e eu seguirei em frente”, compara o ator, de 46 anos. “Eu amo dirigir, mas engarrafamentos existem. E eu não vou deixar a minha vida se resumir aos engarrafamentos.”
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Na carreira, porém, o australiano prefere ficar longe das coisas simples. Depois de se tornar o mais conhecido rosto da franquia X-Men, como o bruto Wolverine, Jackman mostrou as habilidades de cantor e dançarino nos palcos da Broadway, provocou acalorados debates no ousado e ambíguo Fonte da Vida, provou o carisma como apresentador à frente do Tony Awards e do Oscar e ganhou um Globo de Ouro pela interpretação de Jean Valjean no denso musical Os Miseráveis. Em Peter Pan, que chega aos cinemas do Brasil nesta quinta-feira, 8, Jackman volta ao centro de uma história clássica, mas de um jeito bastante diferente. O diretor, Joe Wright, resolveu fazer uma trama de origem com base no conto de J.M. Barrie – o vilão do longa, interpretado por Jackman, é Barba Negra, citado apenas de passagem no original do autor escocês.
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Casado há quase 20 anos com a atriz Deborra-Lee Furness, o astro viu um apelo especial na trajetória do garoto sem pais que não queria crescer – o casal tem dois filhos adotivos, Oscar, de 15 anos, e Ava, de 9. “Eu li o roteiro com a Deb e me lembro de pensar: ‘Preciso me certificar de que isso não será desconfortável para meus filhos’”, conta ele, vestido com calça social e paletó azul-escuros, em um hotel em Los Angeles. “A gente conversa com os dois o tempo todo, mas foi mais uma boa oportunidade para falarmos sobre as questões com as quais eles, tendo sido adotados, terão de lidar pela vida inteira.”
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Apesar do lado sombrio que há na história de Pan, a prévia do filme mostrada à imprensa é repleta de cores, de acrobacias e do magnetismo do novato Levi Miller, de 11 anos, que dá vida ao protagonista (“Ele não faz ideia do quão bom ator é”, derrete-se Jackman). Uma sequência tem potencial para ficar gravada na memória do público: o momento em que Barba Negra aparece cantando “Smells Like Teen Spirit”, hit do disco Nevermind (1991), divisor de águas na carreira do Nirvana.
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Hugh Jackman anunciou recentemente que deixará o posto de Wolverine após o próximo filme solo do herói, previsto para estrear em 2017. Ele diz que abandonará o personagem que o trouxe à fama para continuar em busca de projetos ambiciosos, mas sempre tendo a família como prioridade. E ainda que a premissa de que o esforço próprio é a chave do sucesso se mantenha para Jackman, o ator aprendeu a aceitar a imprevisibilidade de alguns fatores – poucos anos após descobrir um câncer de pele, por pouco ele não parou definitivamente de cantar por causa de uma hemorragia nas cordas vocais.
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Quem teve a ideia de botar você para cantar a música “Smells Like Teen Spirit”?
Foi Joe. Fizemos três semanas de workshops, uma delas com os atores que faziam os piratas. Lá pelo quarto dia, ele veio todo animado com a letra no papel e começou a cantar. Eu me lembro de ficar pensando o que o estúdio iria achar da ideia, mas eles embarcaram na proposta.
Nirvana está entre as coisas que você costuma ouvir?
Eu ouço de tudo. Tenho uma filha de 9 anos que gosta de escutar Katy Perry, Bruno Mars. Meu filho gosta de coisas mais puxadas para o reggae, como Sean Kingston. Minha esposa gosta de Barbra Streisand, esse tipo de coisa. Eu gosto de tudo, é mais ou menos como meu gosto para atuação.
Ao contrário do cabelo vasto do Wolverine e dos mullets que deixou à mostra em Chappie, para Peter Pan você precisou raspar a cabeça. Foi libertador?
Amei ter raspado a cabeça, nunca era reconhecido! Fiquei parecendo um traficante, estava esperando o dia em que as pessoas começariam a me parar e pedir drogas [risos]. Na época, fui para a Disney por quatro dias, e fui parado apenas três vezes – veja bem, é a Disney, um lugar com milhares de pessoas. Na piscina do hotel onde nos hospedamos, havia um tobogã, e tinha uma garota que estava lá todos os dias. Ela sempre parecia um pouco chapada, e ficava olhando para mim, enquanto eu pensava: “Essa menina sabe quem eu sou”. No segundo dia, ela me disse: “Cara, você parece com alguém... Você parece com um pirata, cara” [risos].
Você dança, canta e até já tentou gravar um disco de jazz. Por que o projeto não vingou?
Não gostei do trabalho que fiz. Não das gravações em si, mas no final das contas percebi que eu queria gravar, mas não sabia ao certo o que queria cantar. Então, ouvi tudo e pensei: “Hum, eu não sei direito por que gravei essas músicas. Não tenho nada para dizer”.
Como você se sente quando um filme como Fonte da Vida (de 2006, do diretor Darren Aronofsky), um trabalho que exigiu tanta dedicação da sua parte, parece não ser compreendido pelo público?
Para mim, tudo bem. O fato de fazer o filme é mais importante do que o modo como ele é recebido. É claro que eu queria que as pessoas o entendessem, que o amassem, especialmente pelo Darren. Mas eu sempre soube que era um filme um tanto esotérico, que dividiria o público. Se você gosta de filmes completamente lineares, esse não é para você. Ele faz mais perguntas do que dá respostas. E eu aprendi
muito como ator durante o processo.
É um filme que te faz pensar sobre a vida. Você pratica meditação há anos e imagino que haja aí uma conexão com a ideia de entendimento e aceitação maior sobre a própria existência.
Sim... No caso do filme, a ideia central é que você não pode viver plenamente enquanto não aceitar plenamente a própria morte. A maior
parte de nós vive com um medo constante da morte, o que faz com que de alguma forma se tenha também medo da própria vida.
Quando você descobriu que estava com câncer de pele, passou a pensar mais sobre isso?
Não, mas eu sabia que o que eu tinha era uma forma leve da doença. Sabia que não morreria por causa disso. Mas vou ser honesto com
você. Recentemente não pude fazer uma performance [do espetáculo An Evening with Hugh Jackman], na Turquia. Tive um problema na voz e não pude me apresentar. Foi a primeira vez em 18 anos que isso aconteceu. Não sei se faz sentido, mas isso me deixou mais abalado [que a doença]. A vida toda eu pensei que, independentemente do problema, a força de vontade me faria chegar ao meu objetivo. Mas isso nem sempre é verdade. Eu não usava protetor solar, então o câncer de pele era previsível. Não me esforcei para prevenir um problema como esse, mas dou tudo de mim no trabalho, então, deixar de fazer um espetáculo...
É assustador perder a voz quando seu trabalho depende dela?
É muito assustador. Precisei ficar uma semana sem falar. Minha esposa odiou, mas eu até que gostei [risos]. Só que foi como se houvesse soado um alarme, porque o médico me disse que se eu tivesse cantado naquela noite, poderia ter rompido minhas cordas vocais e nunca mais voltaria a cantar.
Você tem emendado um trabalho atrás do outro. Isso nunca afetou a relação com seus filhos?
Acho que passo a impressão de não ter parado, mas nos últimos três ou quatro anos eu fiz pausas, e fiz alguns ajustes. Agora procuro trabalhar durante [as férias escolares de] verão, assim meus filhos podem viajar comigo. Em Gigantes de Aço, nos últimos três filmes com Wolverine e em Peter Pan, eles estavam comigo. Pan foi filmado perto de Londres e foi ótimo, porque eu só ia gravar umas três vezes por semana, então passamos as férias deles juntos.
Foi difícil tomar a decisão de dizer adeus ao Wolverine?
Hum... não. Foi fácil, mesmo que minha assessora de imprensa tenha dito, quando contei para ela: “Ok, mas não vou anunciar ainda”. Eu respondi que poderia divulgar, e ela se negou, falou que iria me perguntar de novo depois de algumas semanas. Ela achava que eu iria mudar de ideia, mas não mudei. Eu amo quando você sente que o que está fazendo é a coisa certa. Aprendi a confiar nesse sentimento. A verdade é que confiar no próprio instinto é fácil, o difícil é conseguir ver uma mensagem clara nesse instinto. Para mim, a mensagem de que essa era a hora de parar estava bem clara. E estou começando a treinar para voltar ao Wolverine e [suspira]... fica ainda mais fácil pensar que será a última vez [risos].
Você chegou a criar uma própria produtora, a Seed Productions, mas ela fechou em 2010. O que aconteceu?
Eu abri o negócio, mas depois percebi que não queria ser produtor ou comandar uma produtora. É algo que demanda muito tempo, e foi uma das coisas que tive que ajustar para poder me dedicar aos meus filhos.
Imagino então que você não tenha o desejo de se tornar diretor
Não. Quer dizer, talvez um dia, mas no momento, não. Acho que sou muito indeciso. É por isso que gosto de trabalhar com alguém como Joe. Às vezes tenho uma ideia bem clara de como quero fazer uma cena, mas em diversas ocasiões fico em dúvida. Quando se trabalha com um diretor em quem se confia, você pode fazer de jeitos diferentes e deixar que ele decida.
Você busca alternar, de alguma maneira, papéis mais ligados ao entretenimento com histórias mais sérias, como em Os Miseráveis?
Não penso nesse tipo de balanço. Eu gosto de fazer coisas diferentes, é isso que pesa na hora de escolher que filme fazer. Algo que eu nunca tenha feito antes sempre me deixa intrigado, porque acho que trabalho melhor quando não tenho certeza absoluta de que posso fazer aquele trabalho. É isso que me impulsiona.
A ideia de ser desafiado?
Sim, e o medo – o medo verdadeiro de que eu talvez não consiga fazer aquilo.
Debute Grandioso
O australiano Levi Miller, de 11 anos, é o novo Peter Pan
Conterrâneo de Hugh Jackman, Levi Miller estreia nos cinemas em um papel de destaque em Peter Pan. “É divertido demais ver uma criança tão jovem, em seu primeiro longa, se sentindo tão em casa no set”, afirma o veterano, que lembra que no último dia de filmagem, nos arredores de Londres, o garoto deixou o local aos prantos. Jackman garante que o enfoque dado à história pelo diretor Joe Wright terá apelo não apenas para o público jovem. “Acho que é um conto que celebra a imaginação infantil e que dá a ideia de que quanto mais conseguirmos manter isso na vida, mais felizes seremos”, analisa o ator. “Claro que é preciso crescer e pagar o aluguel, mas, se pudermos ter aquele otimismo, a vida pode ser mais alegre.”