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A Viagem faz uma cama de gato com o tempo e o espaço

Filme ousado de Tom Tykwer, Andy Wachowski e Lana Wachowski é grandioso e excessivo, para o bem e para o mal

Stella Rodrigues Publicado em 11/01/2013, às 10h29 - Atualizado às 20h08

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A Viagem - Divulgação
A Viagem - Divulgação

Dados a hipérboles e ambições, os irmãos Andy e Lana Wachowski se juntaram ao amigo Tom Tykwer (Corra, Lola, Corra, Perfume – A História de um Assassino) nesse ousado projeto, cheio de números mirabolantes. São seis histórias, cada uma de uma época, todas estudando o tecido que constitui a sociedade e dando sentido ao lema do filme, de que tudo está conectado. Para dar vida a essa história contada no livro de David Mitchell, obra com o estigma de absolutamente infilmável, foi necessário pensar grande e esquecer o conceito de que “menos é mais”. Vamos aos números: três diretores, seis histórias, seis épocas diferentes embaralhadas (uma delas de ar futurista) em uma extensão de 500 anos, quase três horas de filme, um enorme elenco, sendo que cada ator interpreta pelo menos três personagens, e uma infinidade de próteses de nariz para que Tom Hanks e companhia pudessem transitar entre todas essas tramas de forma compreensível.

Esqueça gêneros. Talvez o mais geral, que defina o filme como um todo, seja aventura, sendo que os protagonistas dela são os diretores. Uma das tramas é um mini thriller, se passa em São Francisco, em que há uma conspiração contra uma jornalista que investiga uma usina nuclear. Outra tem ares de ficção científica, mostra uma realidade distópica na “Nova Seul”, em que um dos conceitos mais fortes do filme é debatido de forma instigante. Ainda nesse tema, um homem se vê às voltas com a questão da libertação dos escravos em um dos segmentos. Em uma ilha havaiana, o apocalipse já aconteceu e heroína de Nova Seul é vista como uma deusa pelo povo. E assim por diante. Cabe a Tom Hanks, Halle Berry, Jim Broadbent, Hugh Grant, Susan Sarandon, Jim Sturgess, Hugo Weaving, James D'Arcy e Ben Wishaw viverem quase todos os personagens – homens viram mulheres, as etnias desaparecem diante do poder de uma maquiagem impressionante e alguns atores ficam irreconhecíveis em certos personagens – aliás, surpreende que A Viagem tenha ficado de fora das categorias cenográficas do Oscar.

A cornucópia filosófica subjacente à história tem como base a ideia de que todas as pessoas que nascem estão ligadas em um nível de alma, independente de geografia e do tempo em que vivem. Não foi a primeira vez que alguém levou essa linha de pensamento ao cinema, mas o longa traz reflexões interessantes em dados momentos. O problema é que entre as reflexões o piegas e o pseudointelectual colocam a cabeça para fora da toca e tornam alguns momentos do filme tediosos e inchados, esvaziando o que poderia ser um conceito interessante com a superprodução e os excessos – muitos excessos. É mais ou menos como uma mansão de novo rico, em que há tudo de mais caro, belo e excêntrico que o dinheiro pode comprar: a junção dos telefones dourados, tapetes de oncinha e toda uma gama de estímulos visuais sobrepostos, cada um de uma linha, que juntos explodem diante dos olhos.

Com tantos detalhes aos quais se deve atentar, fica fácil perder a noção de o que se passa quando e quem está ligado a qual história. Talvez seja um filme que só possa ser completamente compreendido após diversas apreciações (o que é uma tradição na carreira dos diretores, se esquecermos o horror que foi Speed Racer, dos Wachowski). Mas é possível que mesmo depois do entendimento completo das questões mundanas do filme – distinguir corretamente épocas, pessoas e tramas – ainda reste apenas uma forma rebuscada (com três horas e toda uma produção ousada) de falar que somos todos uma pequena gota d’água em um oceano infinito.