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Arrested Development retorna: Michael Cera, Jason Bateman e outros integrantes do elenco falam sobre a série

Queridinha da crítica, mas fracasso de audiência quando estava no ar, a série com um dos textos mais cheios de detalhes da história da TV volta com nova temporada na Netflix

Stella Rodrigues Publicado em 25/05/2013, às 13h25 - Atualizado em 12/06/2013, às 13h18

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Arrested Development - Divulgação
Arrested Development - Divulgação

Arrested Development era assim: a história de uma família rica que perdeu tudo e do filho que não teve escolha a não ser manter todo mundo unido. Pelo menos essa era o texto simplista de abertura do programa, na voz do premiado diretor Ron Howard, narrador e produtor da série. O filho “sem escolha” em questão, Michael Bluth (Jason Bateman), assumiu a empresa da família quando seu pai foi preso por fraude. A companhia é a fonte de renda que mantém o estilo de vida inescrupuloso de seus irmãos (Lindsay, a perua, Gob, o bon-vivant, e Buster, subdesenvolvido emocionalmente, para dizer o mínimo) e sua mãe, bêbada inveterada que tem uma relação doentia diferente com cada integrante da prole. O brasão dos uma vez endinheirados e tradicionais Bluth poderia muito bem trazer inscrito, em latim, algum lema ligado à sobrevivência. Se tem uma característica que une essa gente sem caráter é a habilidade de fazer qualquer coisa para sobreviver. Tanto é que os Bluth entram agora para a história da televisão dando um jeito de retornar. Isso sete anos depois que a Fox teve a audácia de cancelar o programa só porque ele era, para todos os efeitos, um fracasso de audiência.

Estão melhores? Piores? Iguais? A expectativa dos fãs que passaram todos esses anos aguardando o filme “prometido” no episódio final (e ainda possível) será sanada neste domingo, 26, às 4h01 (no Brasil), quando a Netflix coloca no ar a quarta temporada da série, produzida como mais um conteúdo exclusivo do serviço de streaming. Serão 15 episódios novinhos, cada um focando em um personagem (estratégia inovadora adotada para acomodar as questões de agenda dos atores, todos ocupados demais agora para ter tempo sobrando).

“A gente não cresceu muito, certo?”, questiona Portia De Rossi (Lindsay), durante entrevista em Los Angeles, a respeito do estado em que encontraremos a família nos novos episódios. “Não, as coisas andaram para trás, na verdade”, responde Jason Bateman, acrescentando: “Se a gente se reabilitasse, não teria série. Esses sete anos não foram caridosos com a gente. O tom é mais sombrio, não é tão homogeneizado quanto quando você tem que fazer na TV aberta.” Jessica Walter (a matriarca Lucille) completa: “O desespero é colocado sob uma lente de aumento.”

O mundo de referências deliciosamente elaboradas como um trabalho manual pelo criador Mitch Hurwitz estará de volta e renovado, isso todo mundo garante. A comédia da série sempre foi construída em níveis, misturando piada física e trocadilhos discretos. Apesar desta última palavra gerar calafrios em muitos fãs de comédia, não tinha nada de previsível ou repetido nas camadas do pavê de humor de Mitch e seus roteiristas, diferente do trocadilho de tio bêbado no Natal que envolve a sobremesa. As gags, construídas com muita atenção aos detalhes, não entraram para o panteão de alusões reconhecidas amplamente pela cultura pop naquela época. Apesar de a produção ter sempre sido uma queridinha da crítica quando estava no ar, entre 2003 e 2006, isso não foi o suficiente para mantê-la. Mas conforme define Michael Cera, “o poder dessa série é que o público cresceu. Tinha uma base de audiência muito pequena que só cresceu e virou uma bola de neve. A surpresa foi essa”.

Se o séquito de adoradores de Mitch Hurwitz estão felizes com a novidade, ele e o elenco estão extasiados com o reencontro. “Roteiristas de Arrested Development não dão em árvore, sabe? Sinto falta da suculência do texto, era tão específico para os personagens”, diz Jessica. “Tudo que você quer como ator é um bom texto e um bom elenco, e a gente tinha tudo isso. Temos a chance de ressuscitar algo que amávamos muito e o público está aguardando ansiosamente”, completa Portia de Rossi. A rasgação de seda mais sincera já vista entre criador e intérpretes das criaturas é melhor resumida por Hurwitz, em entrevista por telefone: “A melhor televisão é sempre resultado dos atores seguindo os roteiristas e os roteiristas seguindo os atores. É como a cobra comendo a própria cauda”.

AD basicamente entrou para a história como um mártir da televisão de qualidade que não tem chances na TV aberta. Teorizar a respeito leva o risco de se cair em um terreno perigoso de encarar o chamado “grande público” como pouco interessado ou passivo. A forma como os episódios eram construídos, com uma piada sendo não só recorrente, mas dividida em vários episódios (há casos de um personagem levantando a bola em uma temporada para outro cortar somente no ano seguinte) dificultou na hora de conseguir arrebanhar público novo, chamar a atenção do cara jogado no sofá que estava trocando de canal. Eram muitas gags e nenhuma claque para guiar. Para completar, quase todos os personagens quebravam a regra dourada — e cada dia mais ultrapassada — da TV de gerar alguma empatia, ser alguém de quem o público goste (o único personagem de caráter era George Michael, um garoto perdido em uma trama incestuosa, questão que não grita “horário nobre”, exatamente). Todos eram odiosos e sem caráter – até o autoproclamado santo da família, Michael. E, ao mesmo tempo, todos eles acreditavam ser o único membro são de todo aquele núcleo disfuncional alimentado por trapaças e chantagem emocional.

Se a solução para as famílias falidas, antigamente, era casar a filha com um membro rico de outra família rica, foi mais ou menos isso que os Bluth fizeram com a Netflix. Com os 15 novos episódios no ar de uma só vez (mais longos, mais ousados, com mais liberdade criativa), o casamento parece perfeito. Fica mais fácil acompanhar a temporada, que promete ter os episódios mais conectados do que nunca.

Michael Cera, que além de ter voltado como o sempre querido George Michael, também assumiu um papel de roteirista júnior nos novos capítulos, exemplifica. “A gente escrevia cenas que precisavam fazer sentido em diversos contextos, porque elas eram exibidas em um episódio e retomadas parcialmente em vários outros. E a cada episódio, a cena significava uma coisa diferente e acrescentava novas informações." Jason Bateman pontua: “Já é difícil encenar isso, imagine só inventar e escrever!” Mitch Hurwitz garante que, apesar de todos os elogios, ele não vê nada disso como genialidade. “É um trabalho duro em relação aos detalhes”, diz, explicando com humildade que muito do que os fãs enxergam como algo que ele colocou em uma cena de propósito, para aludir a algo que viria depois, era coincidência. “Acho que esse é o benefício secreto de se esforçar demais. Sempre penso nisso quando elogiam a série pela inteligência — é trabalho duro, não talento.”

Cera ainda pondera que, apesar de haver muitos sites na internet dedicados a pegar as piadas escondidas no roteiro (tanto “easter eggs” físicos quanto trocadilhos e referências que aludem a fatos da vida real), ele acha que ainda podem existir coisas nunca percebidas pelos fãs. E agora que os episódios foram escritos como um grande filme, tudo ficará ainda mais complexo. “É um escopo muito grande. Parece um episódio enorme com só uma visão final. É muita informação, é muita coisa para assimilar. É como olhar para uma pintura de perto e ir se afastando aos poucos”, explica.

Isso nos leva a como assistir Arrested Development no novo formato. “Não precisa fazer isso”, diz Hurwitz, consternado pela perda de sono das pessoas, quando Jeffrey Tambor (o patriarca George) e Jessica Walter contam para ele que as pessoas se reunirão para festas, de madrugada, para devorar a temporada nova. Assim que ele terminou de editar os 15 capítulos, desmentiu no Twitter o que estava sendo dito até então sobre os episódios poderem ser vistos em qualquer ordem. Mas Jason Bateman e Portia de Rossi garantem que depois do quarto ou quinto, a vontade será de voltar ao primeiro novamente, porque o espectador vai descobrir que, na verdade, perdeu alguma coisa do que estava acontecendo. Assim como era há sete anos, quando, para citar uma das piadas recorrentes da série, "cometeram um grande erro” tirando os Bluth do ar.