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Blade Runner 2049 eleva e atualiza os temas de Blade Runner – O Caçador de Andróides

Sequência é orgânica, sem nostalgia por qualquer coisa da década de 1980

Paulo Cavalcanti Publicado em 05/10/2017, às 16h13 - Atualizado às 16h17

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Harrison Ford em cena do trailer de <i>Blade Runner: 2049</i> - Reprodução/Vídeo
Harrison Ford em cena do trailer de <i>Blade Runner: 2049</i> - Reprodução/Vídeo

Blade Runner – O Caçador de Andróides (1982) foi um divisor de águas. O visual do filme dirigido por Ridley Scott poderia ser classificado como "futurismo decadente", inserindo uma tecnologia high end em ambientes sórdidos e sinistros. A direção de arte da produção foi imitada e copiada em outros longas, em videoclipes musicais, peças publicitárias e em vários outros campos das artes visuais. Depois do fenômeno Star Wars (1977) e do grande êxito de Alien - O Oitavo Passageiro (1979, também de Scott), a ficção científica havia entrado em uma fase adulta e Blade Runner coroou esta maturidade.

A produção foi revisitada por Scott duas vezes: em uma edição do diretor (1992) e uma versão chamada definitiva (2007), em que a essência do personagem central Rick Deckard (Harrison Ford) era alterada. Já que o diretor parecia ter dado a palavra final, uma sequência ao Blade Runner original era algo que ninguém poderia esperar. Mas quando Blade Runner 2049 foi anunciado, Scott logo avisou que ficaria com as funções de produtor e de supervisor. Ele entregou a missão de conduzir o filme ao inventivo canadense Denis Villeneuve, diretor de Os Suspeitos (2013) e A Chegada (2016). A escolha foi acertada: nas mãos de Villeneuve, a sequência se tornou algo orgânico, sem nostalgia por qualquer coisa da década de 1980.

No universo de Blade Runner existem os replicantes, androides criados para servir aos seres humanos. Se eles cessam de funcionar ou se rebelam, são convocados para a ação os blade runner, agentes encarregados de “aposentar” – um eufemismo para exterminar – as máquinas. No futuro de 2049, os androides foram aperfeiçoados, mas alguns deles teimam em agir de forma inconveniente para os humanos. O agente K (Ryan Gosling), que trabalha junto à polícia de Los Angeles, trabalha para acabar com elas. Assim como todos os androides, ele sofreu um processo de implantação de memórias para que se sinta mais “humano”. K é taciturno, monossilábico e tem como companheira Joi (Ana de Armas). Ela, na verdade, é um aplicativo, o que torna a relação ainda mais bizarra.

Depois de um caso sangrento, mas aparentemente rotineiro, K faz uma descoberta no quintal da casa de Sapper Morton (Dave Bautista), o replicante que ele eliminou. O agente relata para a chefe, a tenente Joshi (Robin Wright), que existe uma caveira enterrada no local. A investigação sobre a identidade da pessoa morta irá levar K aos meandros da Wallace, a corporação que fabrica os androides. Quem está interessado neste processo todo é Niander Wallace (Jared Leto), o magnata dono da empresa que leva seu sobrenome. Megalomaníaco e com intenção de bancar o Deus, ele tem ideias próprias sobre como os androides acabarão se sobrepujando aos humanos. K agora é caçado pelos capangas de Wallace e paralelamente sofre uma grave crise de identidade. Para resolver as questões que o atormentam ele terá que ficar cara a cara com Deckard, desaparecido há 30 anos. Com isso, são ligadas as pontas entre a versão de 1982 e esta sequência, feita 35 anos depois.

O roteiro criado por Hampton Fancher e Michael Green une habilmente temas relevantes, como a dependência da tecnologia, a presença da realidade virtual e da inteligência artificial, mudanças climáticas e as alterações do código genético dos alimentos. Tudo é exposto com sutileza, sem sermões óbvios. Assim como em A Vigilante do Amanhã: Ghost in The Shell, Blade Runner 2049 coloca em discussão o que torna as pessoas "humanas": uma alma, um corpo físico e/ou memórias. O filme é longo (2h45), desolador, austero, sem humor, mas nada disso atrapalha a visão de Villeneuve.

A cinematografia criada por Roger Deakins para Blade Runner 2049 é impressionante. Na visão aérea, Los Angeles é repleta de hologramas e telas de encher os olhos. Mas no chão, as ruas são perigosas, sujas, encharcadas pela chuva e iluminadas pelo neon barato. Dentro dos recintos, como delegacias e escritórios, as telas de computadores são ainda os monitores arcaicos que eram usados nas décadas de 1970 e 1980.

Em boa atuação, Ryan Gosling torna viva toda a perplexidade de K, que não sabe se é humano, máquina ou uma junção de ambos – e, se neste caso, também tem alguma missão para cumprir no grande esquema do universo. Quando Harrison Ford aparece, o filme cresce ainda mais. Neste retorno como o icônico Deckard, a interpretação dele é vital e vigorosa, trazendo tragédia e um pouco de esperança ao amargo blade runner. Com todas essas qualidades, Blade Runner 2049 já é um dos principais filmes de 2017.