O músico Kevin Johansen, sua banda The Nada e o cartunista argentino Liniers trazem ao Brasil espetáculo que mistura desenho e música
Se o conceito de “espetáculo multidisciplinar” resgata em sua cabeça a ideia de algo cabeçudo e alternativo demais, possivelmente bastante cansativo, mantenha a mente aberta para o show criado pelo músico Kevin Johansen e o cartunista argentino Liniers (de óculos, na foto ao lado), autor da tirinha “Macanudo”, publicada na Folha de S. Paulo.
Há anos eles correm o mundo misturando a paixão de cada um no show que chega ao Brasil pela primeira vez. A proposta é simples: Kevin, nascido no Alasca, mas filho de mãe argentina, faz a performance com as músicas da carreira ao lado da sua banda, The Nada. Enquanto isso, o artista plástico desenha e as imagens são mostradas no telão, servindo como cenário. Assista a um vídeo no fim da matéria de uma apresentação realizada em Lima, no Peru.
A princípio, a ilustração é baseada nas letras das músicas, mas as inspirações, ao longo dos anos, passaram a ser diversas. “A gente nunca fez um ensaio, nem quando íamos fazer o primeiro show. Tudo que acontece é espontâneo e intuitivo. Temos que manter a mente aberta. A melhor parte é quando aparece algo novo no papel. Eu mesmo nunca sei como vou desenhar cada música, o mais divertido é inventar”, conta Liniers.
Kevin complementa: “Tem muito espaço para improvisação e nunca ensaiamos. Depende do público. Começamos a notar que as pessoas se divertiam muito vendo duas disciplinas se misturando, elas gritam frases da plateia e elas vão parar no mural. Falamos muito entre as faixas e surge muita coisa daí. As variações aparecem porque ele vai alterando gradualmente, eu posso fazer um comentário ou ele pensar em algo novo sobre a letra. E aí vai evoluindo, nunca é estático”.
O que também evoluiu foi a estrutura de como essa parceria é apresentada ao público do show. “Comecei desenhando no computador no backstage. Fui chegando cada vez mais parte e desde que comecei a subir ao palco, não me deixaram mais descer”, diz o cartunista, entusiasmado. “Mudou gradualmente de ele estar atrás do cara do som e da luz e ir indo para o palco fazer os murais. Criamos um monstro, ele rouba nossas groupies, é um típico ilustrador astro do rock”, brinca Kevin.
Primeiramente, no backstage, Liniers conta que usava um computador e um software para desenhar e aquilo era projetado ao fundo do palco. Mas como é fã de desenhar com as mãos, pintar, fazer uma arte menos limpinha, pediu para mudar e usar material físico, posicionando uma câmera atrás dele, assim tudo seria exibindo. Dependendo do show, outra opção é colocar uma tela de gigante ao fundo do palco e simplesmente pintá-la, ali mesmo.
Outro destaque da apresentação é quando os artistas trocam de papel. “É quando mostramos o quão bom realmente somos naquilo que fazemos”, ri Kevin, apontando para sua falta de talento para o desenho. Liniers usa o momento para cantar alguns covers, mostrar as suas “composições muito estranhas”, como ele mesmo define, e fazer uma já clássica versão de “Knockin' on Heaven's Door”, de Bob Dylan. “Tem três acordes que aprendi para isso”, se diverte o cartunista.
Quando Liniers sai do script, conta que olha para Kevin e ele está com cara de “para, pelo amor de Deus”. “Eu sou um músico tão incrivelmente ruim… mas fica bonito nas fotos! Dá para viver um pouco o sonho de infância de ser um astro do rock. É que em algum lugar do caminho eu peguei a rota nerd.”
Se o sonho de criança do autor de HQs era ser do rock, foi também na infância que tinha ficado todo o contato de Kevin com os quadrinhos. Isso até os dois ficarem amigos de forma inusitada, há cerca de dez anos. Liniers ouviu a música de Kevin, gostou e o procurou. A parceria rendeu, primeiro, uma capa de disco desenhada pelo cartunista.
“Quando o conheci, pensei: esse cara é estranho. E estranhamente interessante”, diz o músico sobre o colega. “Nos demos bem de cara e ele, generoso que é, me dava desenhos de vez em quando. Há uns cinco anos o chamei para fazer um pôster para o show. Até que alguém da minha equipe sugeriu essa iniciativa. Sempre dizemos que não pensamos nisso, nem foi ideia nossa, acho que por isso é tão orgânico. O que gosto do trabalho do Liniers é que ele não costuma fazer piadas nas tirinhas. É mais um poeta, um ilustrador com palavras. É como na música, a melodia vem primeiro, traz a emoção, e a letra é o toque final. O desenho é a melodia.”
O trabalho está rendendo frutos na carreira tradicional de Liniers. “Às vezes aparecem nas tirinhas coisas curiosas que aconteceram nos shows ou viajando nas turnês.” Empolgado com a vinda ao Brasil, ele se diz maravilhado de “estar na mesma página que Adão, Angeli e Larte que são todos meus heróis”, se referindo à publicação de “Macanudo” na Folha.
Kevin Johansen + The Nada + Liniers
24 e 25 de novembro
Chopperia do Sesc Pompeia - Rua Clélia, 93
R$ 20 (inteira), R$ 10 (sócios do Sesc) ou R$ 5 (comerciantes associados ao Sesc)
Informações: www.sescsp.org.br