Alguns pedem normas mais rígidas depois da tragédia que já deixou 238 mortos
O incêndio na boate Kiss, em Santa Maria (RS), em 31 de janeiro, que deixou 238 mortos e mais de 100 feridos ainda hospitalizados, levou autoridades no Brasil, Venezuela, Nicarágua e México a intensificar as normas de segurança em casas noturnas, acelerar inspeções e fechar temporariamente dezenas de clubes e bares. “O que aconteceu no Brasil é uma advertência para todo o mundo”, disse Miguel Angel Mancera, prefeito da Cidade do México, depois da tragédia.
Nos Estados Unidos, gerentes de casas noturnas afirmaram já ter passado por amplas mudanças na segurança desde que um incêndio matou 100 pessoas em um show da banda Great White em West Warwick, Rhode Island, há 10 anos. "Depois daquilo, definitivamente houve mudanças no código”, diz Mitchell Frank, gerente da boate Echo, em Los Angeles, à Rolling Stone EUA. "Nós sentamos e fizemos o que tinha de ser feito."
Os problemas que parecem ter contribuído para a tragédia brasileira – superlotação, saídas insuficientes, uso de pirotecnia no palco – não devem acontecer em casas regularizadas nos EUA, segundo Frank e outras fontes. Na Echo, os gerentes fazem uma reunião de segurança toda noite e garantem que sistemas de mangueiras, extintores, saídas e limite de capacidade sejam monitorados regularmente. “Ao construir uma grande casa de shows no centro, uma das muitas provas que tivemos de enfrentar foi garantir a segurança do público”, afirma Frank.
Enquanto a Echo ainda permite que artistas usem pirotecnia, desde que haja um bombeiro presente durante a apresentação, outras boates baniram totalmente os efeitos desde 2003. "Em casas noturnas, a ideia de pirotecnia é simplesmente irresponsável e desnecessária”, diz Joe Shanahan, contratante de talentos para a Metro em Chicago. Acrescenta Peter Tempkins, vice-presidente sênior da GNW-Evergreen Insurance, que representa boates, promotores e festivais: “Parece que o que aconteceu no Brasil não foi pirotecnia, e sim o uso de sinalizadores. Isso é mais do que burro".
Entretanto, esta filosofia de "isso nunca aconteceria aqui” é perturbadora para Paul Wertheimer, chefe de Estratégias de Controle de Multidões em Los Angeles. Ele vem reivindicando melhores procedimentos de segurança para shows ao vivo há mais de 30 anos. “É a mesma ladainha que você ouve da indústria: ela aprendeu a lição e as coisas serão diferentes”, diz. “As coisas não estão consideravelmente mais seguras para os fãs nos EUA do que estavam antes de 2003. Esse é o problema. O desastre no Brasil é uma cópia do desastre do Great White." Wertheimer acredita que muitos artistas, promotores e locais usam atalhos para economizar dinheiro sempre que possível, e apenas leis rigorosas nos EUA com relação a lotação de festivais, treinamento de controle de multidões e controle de capacidade começarão a solucionar os problemas de segurança. “As coisas progrediram lentamente, mas ainda são dolorosamente insuficientes”, afirma. “Os fãs ainda estão vulneráveis."
Em resposta a tragédias como o incêndio na Station e o colapso do palco na Indiana State Fair, que matou quatro pessoas em 2010, centenas de pessoas na indústria de shows formaram a Event Safety Alliance para melhorar o treinamento, a certificação e a inspeção em shows ao vivo. “Se promotores e agentes não estiverem dispostos a se autopoliciar, será inevitável que aconteça outra tragédia”, diz Paul Bassman, presidente da Doodson Insurance Brokerage, de Dallas, que representa boates proeminentes e festivais como o Lollapalooza e o Austin City Limits.
Bassman concorda com donos de casas noturnas que insistem que a segurança melhorou na última década. Antes do Great White, lembra, os promotores não se preocupavam muito em elevar os padrões de segurança. “Muitas pessoas faziam acordos na base do aperto de mãos e redes de contatos pessoais”, afirma. “Um dia elas acordaram e disseram ‘Uau, agora posso perder meu negócio porque não tenho seguro’. Elas realmente passaram a se importar."