Estabelecido como um dos maiores rappers da sua geração, norte-americano vem provar sua força no Brasil pela primeira vez
Não existe outro artista fora do jazz ou da música clássica que tem um Pulitzer de Música na estante de casa além dele. Ao lado desse prêmio, um tanto outros: são 13 estatuetas do Grammy e, por pouco, não havia ali também um Oscar.
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Kendrick Lamar está no topo e, quando você pensa que ele chegou ao limite, o rapper vindo de Compton, na periferia perigosíssima de Los Angeles, encontra um novo degrau para subir.
No Grammy de 2016, ele entrou no palco, diante das câmeras do mundo todo e de um público formado por executivos do mercado da música - em sua maioria, brancos, abastecidos de dinheiro -, seguido por bailarinos negros vestidos como presidiários, caminhando como escravos. Os Estados Unidos já pegavam fogo com as questões raciais latentes e Lamar tinha um hino, "Alright", presente nos protestos do movimento Black Lives Matter. Foi um dedo metido sem medo numa ferida da sociedade longe de cicatrizar. E, pior, com sinais de infeção.
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Depois de acumular feitos nos Estados Unidos, ser adorado por críticos, idolatrado pelo ex-presidente Barack Obama e ser apontado como o principal rapper da atualidade - com todo respeito, é claro, àqueles que vieram antes dele - Kendrick Lamar faz sua estreia no Brasil no palco do Lollapalooza 2019, um festival que tem um histórico de amor e descaso com seu gênero musical, como a principal atração do último dia de shows, o domingo, 6.
Realizado no Autódromo de Interlagos, entre os dias 5 e 7 de abril, oLollapalooza também tem noites encabeçadas por Arctic Monkeys (na sexta, 5) e Kings of Leon (no sábado, 6).
E, afinal, o que esperar da nova performance de Kendrick Lamar no Brasil?
Aos 31 anos, Kendrick Lamar não é uma novidade para quem está minimamente interessado no rap fora do mundo mainstream, das rádios e premiações. Vindo das ruas sujas e perigosas do Compton, em Los Angeles, Kendrick já foi K-Dot e, junto de outros nomes em ascensão do gênero, como Schoolboy Q e Ab-Soul, no grupo Black Hippy.
Era o início dos anos 2000 e o música que furava a sua bolha do hip-hop, como expoente, o movimento do rap ostentação. Artistas estrelavam videoclipes na MTV com suas correntes de ouro, rodeados de garotas desnudas e destilavam rimas sobre seus feitos e a quantidade de carrões existiam nas suas garagens.
Esse nunca foi o movimento de K-Dot. O rapaz cresceu como testemunha de uma realidade muito diferente daquela e, ao microfone, preferiu contar com rimas que poderiam ser crônicas, o que viu, viveu ou ouviu.
O mundo do rap estava prestes a mudar o foco. A ostentação seria colocada para fora da moda e o "dedo na ferida", tão presente no rap no seu princípio, tomaria novamente a frente do movimento.
O rap é a expressão das ruas, dos becos que muita gente tem medo de atravessar, de bairros com altas taxas de desemprego, criminalidade e violência policial. Conforme a sociedade norte-americana encarava a verdade - uma segregação ainda viva e terrível - o rap que nunca teve medo de tocar nesse assunto ganhou destaque.
Ali estava Lamar. Em 2010, ele já assinava pelo nome de batismo e pelo qual é conhecido atualmente. Uma mixtape daquele ano, Overly Dedicated criou um burburinho em torno do californiano, mas foi com Good Kid, M.A.A.D City, o disco de 2012, que a mensagem de Lamar passou a ser ouvida por mais gente.
Nada disso se compara ao que ocorreu com o músico três anos depois.
Em 2015, Kendrick Lamar soltou o álbum To Pimp a Butterfly. Naquele momento, o rapper sentiu o ar fresco só respirado por aqueles que estão no topo. A crítica amou o álbum. O sempre exigente site Pitchfork deu uma nota de 9,1 de 10 para o trabalho. A Rolling Stone EUA deu 4,5 estrelas, de um total de cinco. Já a revista Spin, empolgada, cravou nota máxima ao disco e chamou-o de "o grande álbum de hip hop dos Estados Unidos".
Lamar havia, de fato, mudado as regras do jogo ao aproximar o rap do jazz fluído e underground crescido também nos becos da Costa Oeste dos Estados Unidos - entre os produtores do disco estava Thundercat, um dos artistas mais inventivos dessa nova cena jazzística.
Cinematográfico, To Pimp a Butterfly era o retrato de um país em frangalhos, levando a arte no seu limite para expressar os horrores, as agonias, tristezas e vitórias da população negra dos Estados Unidos.
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Mesmo que o Grammy de 2016 não tenha oferecido ao rapper nenhum prêmio nas categorias principais, dando-lhe apenas as vitórias nas disputas da esfera do hip-hop, Lamar faz da oportunidade de se apresentar naquele ano uma chance de mostrar o que queria dizer. Segregação, violência e sobrevivência se escancararam ali, enquanto Lamar esteve no palco.
O rapper também indicava o que viria ser DAMN., o álbum seguinte, de 2017, ainda mais poderoso que o antecessor, mais agressivo nas rimas e nas questões raciais. Ainda experimental, sim, mas dessa vez o discurso estava em primeiro lugar, não o estilismo artístico.
Com isso, Lamar criou, por conta própria, um novo degrau para subir. De quebra, levou o Pulitzer de Música, feito somente alcançado por artistas do jazz e da música clássica.
Kendrick Lamar está em sua primeira turnê pela América do Sul, sempre com o Lollapalooza. Tocou em Santiago, no Chile, em 29 de março, e em San Isidro, cidade da grande Buenos Aires, na Argentina, dois dias depois, em 31 de março.
Foram os dois únicos shows do ano até aqui, os primeiros desde setembro de 2018. O repertório dos shows, bastante semelhante, se baseou em DAMN., como era de se esperar. Do álbum de 2017, na noite na Argentina, vieram "DNA.", "ELEMENT.", "HUMBLE.", "LOVE.", "LOYALTY.", "LUST.", "PRIDE." e "XXX."
Já To Pimp My Butterfly teve duas músicas incluídas naquela noite, "Alright" e "King Kunta". Good Kid, M.A.A.D City foi o co-protagonista das noites na América Latina. Lamar ainda fez covers de artistas como Travis Scott ("Goosebumbs") e ScHooloy Q ("Collard Greens"). Também tocou "All The Stars", música gravada com SZA, para a trilha sonora de Pantera Negra e indicada ao Oscar.
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Com base nos únicos shows de Kendrick Lamar no ano, no Chile e na Argentina, no fim de março, ambos quase iguais, Kendrick Lamar deve mudar pouco o seu repertório na apresentação brasileira.
Aqui estão as 19 músicas tocadas pelo músico no Lollapalooza Argentina, em 31 de março:
1 - "DNA."
2 - "ELEMENT."
3 - "YAH."
4 - "King Kunta"
5 - "Big Shot"
6 - "Goosebumps"
7 - "Collard Greens"
8 - "Swimming Pools (Drank)"
9 - "Backseat Freestyle"
10 - "LOYALTY."
11 - "LUST."
12 - "Money Trees"
13 - "XXX."
14 - "m.A.A.d city"
15 - "PRIDE."
16 - "LOVE."
17 - "Bitch, Don't Kill My Vibe"
18 - "Alright"
20 - "HUMBLE."
Bis:
21 - "All the Stars"
Kendrick Lamar é protagonista do festival, mas sua escalação não significa um aumento expressivo de artistas do rap no Lollapalooza 2019. Pelo contrário. O gênero tem pouquíssima representação na escolha musical deste ano.
Entre os brasileiros estão BK' e Rashid, ambos jovens e com carreiras em ascensão. O primeiro lançou o disco Gigantes, no ano passado, e deve fazer um estrago no domingo, 7, entre os mais entendidos do assunto que estiverem pelo Lolla.
BK' recentemente lançou uma música com a banda Scalene, também atração do Lollapalooza 2019. Você pode ouvir "Desarma" aqui.
Já Rashid, atração de sábado, fez um brilhante processo de construção de carreira com um disco montado aos poucos, mês a mês, com uma música e um clipe lançados a cada 30 dias. O sucesso de "Bilhete 2.0", em alta rotação nas maiores rádios do País, deve ter um bonito coro do público do festival.
No sábado, 6, também está escalado Post Malone, artista cujo estilo gera debates. Há quem o chame de rapper, quem diga que ele faz música urbana que se apropria de alguma das linguagens do rap. O Lollapalooza 2019, por fim, também escalou Gabriel, O Pensador, para uma apresentação no domingo, mesmo dia de Kendrick Lamar.
Depende. Há shows muitíssimo bem-sucedidos na história do festival no Brasil, iniciado em 2012. Naquele ano de estreia, por exemplo, os paulistanos Racionais MC's levaram muita gente para a tenda na tal se apresentavam, no mesmo horário do "headliner"Arctic Monkeys.
O mesmo aconteceu com o Planet Hemp nas duas ocasiões que a Esquadrilha da Fumaça foi escalada, em 2013 e 2016.
Por sua vez, o Lollapalooza 2019 teve suas decepções. É o caso da edição de 2016, um ano lembrado pela evasão de público durante a apresentação de Eminem, headliner da primeira noite, e de Florence & The Machine, na segunda. O rapper ainda fez um excelente show, mas o espaço diante dele, no principal palco do festival, aos poucos se esvaziou de uma forma nunca vista na história do festival no Brasil.
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No Lollapalooza 2019, Kendrick Lamar será a principal atração do terceiro dia de festival, no domingo, 7. O show será realizado das 21h às 22h45, no Palco Budweiser, o maior dos quatro palcos montado no Autódromo de Interlagos.
Diferentemente dos outros headliners, que já vieram ao Brasil quatro e cinco vezes, Arctic Monkeys e Kings of Leon, respectivamente, essa será a estreia de Kendrick Lamar no País. Até a turnê do Lollapalooza, o rapper não havia se apresentado na América Latina.
Desde 2014, o Lollapalooza Brasil é realizado no Autódromo de Interlagos, na zona sul da cidade. Confira, aqui, um "guia de sobrevivência" do festival, com 20 melhores dicas para aproveitar ao máximo os três dias de música.
O ingresso para um dia de festival, o chamado Lolla Day, custa R$ 800 (as opções mais baratas, como meia-entrada ou ingresso social já estão esgotadas). Também é possível comprar tipo Lolla Pass, que dá acesso aos três dias. O segundo lote das entradas tem preços que vão de de R$ 900 (meia-entrada) a R$ 1.800 (inteira).
Também são vendidos ingressos do tipo Lolla Lounge Pass, igualmente válidos para os três dias de festival, com acréscimo de ar acesso ao acesso ao lounge, com valores que vão de R$ R$ 2.460 (meia-entrada) e R$ 3.450 (inteira, segundo lote).
O show do Lollapalooza 2019 é a única chance de assistir à performance de Kendrick Lamar no Brasil. No site oficial do artista, aliás, não consta qualquer outra data de show para 2019, algo que possivelmente será atualizado.