Lou Reed toca o álbum Metal Machine Music e confunde o público em São Paulo
Quinze minutos são o máximo que uma senhora sentada na plateia consegue suportar. Em meio à distorção e à microfonia vindos do palco, ela se levanta furiosa e, mirando o protagonista do barulho, manda um sonoro "Fuck you!", que imediatamente é incorporado à apresentação. Em seguida, sai indignada. A dona presente no SESC Pinheiros, em São Paulo, no último sábado, 20, ignorou o que a Mostra Sesc de Artes, anunciava: Lou Reed's Metal Machine Trio. Não deu atenção ao título da apresentação: "MM3. Sem Canções e Sem Vocais". Tinha apenas o nome Lou Reed incutido na mente e a ilusão de que ele entoasse "Walk on the Wild Side" e outros clássicos de seu repertório. Junto a fãs de noise e improvisação, esta senhora e um time de desavisados fizeram os ingressos para os dois shows do trio sumir em menos de uma hora após o início das vendas.
Para retornar às experiências com a noise music, Reed arregimentou o alemão Ulrich Krieger, compositor e músico improvisador, e o norte-americano Sarth Calhoun, que trabalha com música eletrônica. Metal Machine Music, trabalho exemplar do estilo, lançado por Lou Reed em 1975 e considerado "pior álbum de todos os tempos" pela crítica musical do rock costumeiro, foi a inspiração para que o grupo começasse a se apresentar em 2008. O Metal Machine Trio não se propõe a celebrar o lançamento do disco de infâmia histórica nem emular seu feedback ininterrupto de guitarras. Mas no show do Sesc, pôde-se ouvir ecos das quatro faixas do álbum - principalmente "Metal Machine Music A-4" e o loop marcado no vinil, que a deixava com duração infinita. Foram mais sentidos no início da apresentação, antes mesmo de os músicos entrarem no palco, e no final, quando Reed deixa seu posto e caminha lentamente para perto do público e levanta a mão em sinal de agradecimento e vitória.
Em grande parte pelo sax tenor de Krieger, o show passou longe da linearidade distorcida de 25 anos atrás e se moldou em The Creation of the Universe, o único trabalho do grupo. Como que para agradar os fãs do repertório pop de Lou Reed que resistiram a uma performance de barulho, ele volta sozinho no bis para tocar "I'll Be Your Mirror", uma das primeiras músicas de The Velvet Underground & Nico. Composta por ele para a modelo que cantava na banda, a faixa romântica e de esperança destoava do álbum de estreia do grupo, em 1967. Seu contraste, no final do show do Metal Machine Trio, é bem maior, mas dá um sentimento de grandeza de um artista que, aos 68 anos, ainda sabe se transformar.