Nas graças de Gal Costa e Erasmo Carlos, banda entendeu a própria identidade e celebra uma década de existência
A culpa, em grande parte, é de Hélio Flanders.
O vocalista do Vanguart já foi conciliador, já foi músico convidado, já foi relações públicas. De tudo, Helinho foi um pouco.
E, com isso, a Maglore chega aos 10 anos de existência. E persistência - muita. Quem dá os créditos a Flanders é Teago Oliveira, da banda baiana, que usa o ano de 2019 como celebração de um caminho cheio de pedras e alguns tropeços e outros tantos acertos.
Hoje, a banda caiu nas graças de nomes grandes da música brasileira. Gal Costa, por exemplo, cantou "Motor", do segundo disco da banda (Vamos Pra Rua, de 2013), em seus shows. Já Erasmo Carlos gravou a inédita "Não Existe Saudade no Cosmos", no álbum ...Amor É Isso, lançado em 2018.
Pop rock, sim!
O fato é que são poucas as bandas capazes de sustentar uma pegada pop no ambiente indie/alternativo da música brasileira com honestidade. "É claro, tem muita gente que torce o nariz pra gente. E entendemos. É normal", ele diz, antes de garantir que ama os vanguardistas. "Pô, eu comi Arrigo Barnabé com farinha", brinca
Suas músicas, contudo, são de conexão imediata. "A gente consegue ser pop porque a gente é assim, mesmo. Gostamos, mesmo é de criar música para galera cantar, pular, chorar junto."
Se a Maglore existisse décadas atrás, anos 1980 ou 1990, quando a máquina do mainstream buscava bandas de pop rock, eles certamente teriam estourado nas rádios de todo o País.
Tropeça e levanta
Foram alguns duros baques por conta disso, inclusive, relembra Teago, em entrevista à Rolling Stone Brasil, no intervalo do ensaio para o show/festa que será realizado na sexta-feira, 25, no Cine Joia (com participação de Flanders, um trio de metais e do produtor Leonardo Marques) - mais informações, no fim do texto.
"As bolas pararam de bater na trave lá por 2014, 2015...", conta Teago. Nessa época, a banda havia lançado "Mantra", canção que integraria III, o terceiro álbum da banda, com a terceira formação - desta vez, um trio.
A música tem um refrão composto por um "nanarará" e gruda na cabeça como chiclete - em outro ritmo, mais veloz, a canção teria potencial para ser Chiclete (com a letra "c" maiúscula, se é que você me entende), e seria cantada nos carnavais e trios elétricos por aí.
"Foi nessa época que a gente conseguiu sair da lama", lembra Teago.
Iniciada em 2009, a Maglore já foi chamada de banda de moleques quando já não eram tão jovens assim. Veja bem, Teago começou o grupo aos 23 anos e, recentemente, celebrou seu 33º ano de vida.
A Maglore, de certa forma, acompanhou o crescimento do músico ao longo desses dez anos. "Se estivesse de frente com o Teago de 2009", diz ele, antes de jorrar verdades inconvenientes e extremamente sinceras sobre si e sobre a sua jornada, "diria para ele ser menos imaturo, menos arrogante, pensar mais em ser uma pessoa melhor. Pediria para que ele olhasse mais para dentro e para parar de levar tudo para o lado pessoal."
"Hoje estou melhor", ele completa, e ri.
Maturidade, disco a disco
Nos discos, percebe-se a maturidade batendo à porta. Todas as Bandeiras, o mais recente álbum da Maglore, teve a dura missão de substituir III como o favorito dos fãs da banda. E o fez com músicas como "Calma", cuja ideia da letra veio de Lucas Oliveira (atualmente baixista da banda), como um conselho para Teago.
O vocalista sofre, vive e se cobra intensamente a cada disco. Mas, com "Calma", mostra que aprendeu a técnica do "respire fundo, feche os olhos".
"Calma /
O tempo é o seu melhor amigo /
Eu sei que isso não faz sentido agora /
Mas calma /
Pois nada fica fora do lugar", ele canta, na primeira estrofe.
Cada álbum da Maglore carrega sua história. O primeiro, Veroz, de 2011, trazia consigo um rompante juvenil, uma vibe não-tenho-ideia-do-que-eu -estou-fazendo–aqui-mas–vamos-nessa", com uma estética bem pop.
Com Vamos Pra Rua, de 2013, "nós entendemos mais como funcionava a nossa estética e a concepção das músicas", explica Teago. "Mas perdemos um monte de fãs que curtiram muito o primeiro disco", ri o vocalista.
O salto é grande, de fato, entre Veroz e Vamos Pra Rua. Ainda assim, é possível dizer que III, que chega novamente dois anos depois, em 2015, foi um disco de sobrevivência. A banda, que a cada disco apresentou uma formação, tinha virado um trio. Precisou reencontrar sua cara, mais uma vez.
Como quarteto em Todas as Bandeiras, a Maglore é formada por Teago (voz e guitarra), Lelo Brandão (guitarras e synth), Lucas Oliveira (baixo) e Felipe Dieder (bateria). Seu som é cheio. O show, explosivo.
Amadurecido como compositor, Teago largou a metalinguagem de usar os clichês para falar de clichês, como na popíssima e deliciosa "Às Vezes Um Clichê", do primeiro disco, para tratar das verdades contemporâneas, de maneira quase niilista, tal qual ouvimos em "Clonazepam 2mg".
"Dor de amor e contas pra vencer", detalha ele, em dado momento, na faixa do álbum mais recente. Teago traz a vida como ela é.
Todas as Bandeiras é um disco que sangra partidas, mas também celebra a vida. E chega ao fim com "Valeu, Valeu", uma canção que funciona bem como essa auto-análise.
"Eu já passei por tanta coisa nessa vida /
Já ganhei uma vez por cada dez perdidas /
E valeu!", canta Teago, numa das canções mais explosivas do disco.
Como qualquer um que tenha passado pelo furacão que é a virada dos 20 para os 30 anos, a Maglore ainda se vê diante de fantasmas, novos e velhos, sem mais se desesperar, contudo. "Calma", afinal.
A Maglore vai começar a celebração de 10 anos de carreira com show no Cine Joia (Praça Carlos Gomes, 82 - Liberdade), nesta sexta-feira, 25, em São Paulo, a partir das 20h, com ingressos que custam de R$ 25 a R$ 70. O show será gravado e terá a participação de um trio de metais e de Hélio Flanders. Mais informações, aqui.