Cineasta assume a primeira cinebiografia do artista dos 31 discos de ouro; filme fugirá da narrativa tradicional e poderá abordar períodos complicados da vida do artista, como a comentada relação com a máfia
Demorou, mas chegou: Frank Sinatra enfim ganhará uma cinebiografia, dirigida por ninguém menos que Martin Scorsese. Depois de documentários sobre os Rolling Stones (Shine a Light, 2008) e Bob Dylan (No Direction Home, 2005), além de outro, ainda sem título, sobre o ex-Beatle George Harrison, previsto para 2010, o cineasta assumiu o filme que vai contar a história de um dos maiores intérpretes do século 20. O anúncio foi feito na quarta, 13, pelos estúdios Universal e Mandalay - um dia antes, pois, do aniversário de 11 anos da morte do cantor.
O roteirista, Phil Alden Robinson (que assinou e dirigiu o drama-xarope máximo do beisebol, Campo dos Sonhos, com Kevin Costner), varou 30 mil páginas de investigações sobre o cantor, conhecido como "velhos olhos azuis", por cerca de um ano, de acordo com Cathy Schulman, coprodutora da fita. Com tanto material em mãos, a equipe decidiu mandar às favas tentativas de compor uma narrativa linear - pense na calendoscópica cinebio que Todd Haynes deu a Bob Dylan, em Não Estou Lá (mas Scorsese pôs um freio à ousadia do colega e não, não irá usar seis atores para interpretar Sinatra, à moda de Haynes, com seu retrato multifacetado, literalmente, do cantor de folk norte-americano).
"Será quase como uma colagem", Schulman disse. "Assim como suas gravações captam diferentes ritmos e humores, (o filme) vai ter uma coleção de cenas e momentos que formarão uma história geral, em oposição a uma cronologia convencional." Em resumo: "capturar momentos" sem a pretensão de tentar amarrar "a história toda em pouco tempo".
A obra demorou uns bons anos para sair do papel, após série de negociações com os herdeiros de Sinatra e o grupo Warner Music, detentor dos direitos autorais das gravações do artista. A família deveria formar um consenso antes de aprovar a versão cinematográfica de seu membro mais famoso, que já foi interpretado na TV por Ray Liotta, em The Rat Pack, filme da HBO de 1998, e por Philip Casnoff, em 1992, na minissérie Sinatra.
Mais do que "como" contar a história, pesou "o quanto dela" deveria aparecer nas telonas, segundo o site The Hollywood Reporter. Mais uma vez, a produtora Schulman passou os panos quentes ao afirmar que Scorsese - um ítalo-americano, assim como o cinebiografado - foi decisivo para que a obra fosse tocada adiante. "Todos em controle dos direitos tinham de concordar. E ter Marty como cabeça (do projeto) foi o que, em ultima instância, pesou." Pendências com direitos relativos a merchandising, de acordo com o site, também foram superados.
"Marty sempre quis fazer isso", afirmou ao tablóide britânico The Sun Tina Sinatra, filha de Frank e irmã dos cantores Frank Jr. e Nancy Sinatra. "Confio nele inteiramente", ela completou. A questão capital era como - e se - Scorsese abordará a comentada ligação dos "velhos olhos azuis" com a máfia (boatos dão conta de que ele teria pedido a ajuda de "poderosos chefões" para que John F. Kennedy ganhasse as eleições presidenciais dos EUA em 1960).
Tudo resolvido e Sinatra se junta a um notável elenco de figuras históricas que tiveram sua vida esmiuçada pelas lentes do cineasta - do boxeador Jake LaMotta (Touro Indomável) ao bilionário Howard Hughes (O Aviador), sem esquecer, claro, de Jesus Cristo (A Última Tentação de Cristo). E, de lambuja, a empreitada dará chance de Scorsese trabalhar em cima do personagem de Dean Martin, camarada de Sinatra no supergrupo The Rat Pack. Martin atuou, ao lado de Sinatra, no filme Ocean's Eleven, em 1960, filme depois repescado por Steven Soderbergh em Onze Homens e um Segredo.
Há mais de uma década, o diretor vem elaborando Dino, cinebio sobre Dean com roteiro de Nicholas Pileggi, antigo parceiro nos filmes Os Bons Companheiros e Cassino. A obra, por ora em suspenso, é uma adaptação da biografia de Nick Tosches, Dino: Livin' High in the Dirty Business of Dreams.
A vida de Sinatra deverá render muito ao roteiro. Ao longo de 83 anos, o cantor pôs em sua conta 10 Grammy, um Oscar de melhor ator coadjuvante (A Um Passo da Eternidade), 31 discos de ouro e relacionamentos com as atrizes Ava Gardner, Natalie Wood e Mia Farrow, além da mais forte "titular", Nancy Barbato. Um dos maiores crooners de todos os tempos, o artista - que também atendia pelo apelido "A Voz" - teve canções imortalizadas pelos mais variados tipos. Para ficar em alguns: Cake ("Strangers in the Night"), Cat Power ("New York, New York") e Sid Vicious, já fora do Sex Pistols, com sua versão punk para "My Way" - clássico, aliás, regravado, recentemente, por Roberto Justus e escolhido como música preferida para enterros no Reino Unido.
Ainda não se sabe quem vai interpretar Sinatra para as lentes de Scorsese. Há quem aposte em Leonardo DiCaprio, o "queridinho" do diretor - ele laçou praticamente todos os protagonistas na recente safra de obras do diretor, como Os Infiltrados, O Aviador, Gangues de Nova York e o ainda inédito Shutter Island. O filme não tem previsão de lançamento.