“Se alguém me faz uma pergunta, eu simplesmente dou a minha resposta”, diz cantor que está em turnê pelo Brasil
“Se eu não estivesse dando esta entrevista, estaria fazendo o que eu mais amo: compondo”, diz Jake Bugg no camarim do Citibank Hall, em São Paulo, antes de subir ao palco para uma das três apresentações que faz esta semana no país (Porto Alegre, no dia 25; em SP, 27, e no Rio de Janeiro, 28). Mantendo a pose de marrento dos palcos, o britânico admite que se sente solitário na estrada, faz pouco caso de quase tudo relacionado a ele e deixa transparecer sua característica mais ingrata: a sinceridade.
Veja como foi o show de Jake Bugg no Citibank Hall, em São Paulo.
“Eu desisto, cara. Não consigo”, diz ele, segurando com as duas mãos um copinho d’água surrado, mas ainda fechado. Enquanto conversava com a reportagem da Rolling Stone Brasil, Jake Bugg passou mais de cinco minutos tentando abrir a embalagem até, enfim, abrir mão do líquido. Certamente, durante a entrevista, este foi o maior desafio do cantor, que dá respostas tão naturalmente quanto compõe canções ao violão, e exala um desapego quase antônimo à euforia das fãs a alguns metros do camarim, na fila para assisti-lo dentro de algumas horas.
“Se alguém me faz uma pergunta, eu simplesmente dou a minha resposta”, afirma. “Não vou sair por aí distribuindo minha opinião de maneira gratuita. Mas se alguém me pergunta, eu respondo”. As alfinetadas e frases – que sobram nas manchetes dos sites de música da Inglaterra –, entretanto, sequer chegam até o músico. “Não leio, cara”, admite. “Por que vou perder meu tempo lendo algo sobre mim mesmo que é, na verdade, a opinião de uma pessoa?”
Resenha: em Shangri La, Jake Bugg diversifica e deixa de ser um mero imitador.
Curto e grosso, como não poderia deixar de ser, ele explica porque ainda dá entrevistas: “Nessas circunstâncias, é o que você tem que fazer”. “Se você quer manter uma carreira na indústria da música, tem que fazer isso. É o que todos fazem. Eu não quero dar entrevistas, mas se quero fazer a coisa que mais amo no mundo, tenho que fazer esse esforço.”
Sem meias verdades, Bugg assume o risco de angariar o ódio de uma parcela do público, que encara como antipatia e arrogância a postura despojada do músico. Quando o foco do assunto sai dele mesmo e passa a ser, por exemplo, a versão que ele costuma fazer para a faixa “My, My, Hey, Hey (Out of the Blue)”, de Neil Young, ele abre um sorriso, arruma as mangas da camisa amarela e afirma: “Neil Young toca bem melhor do que eu”. “Cara, tem uma parte na versão acústica dessa música que eu sempre achei que o baterista deveria entrar, em uma certa altura. Então nós tentamos fazer isso. E funcionou!”.
“Herói” das paradas de sucesso
Com o lançamento do disco de estreia, autointitulado, Jake Bugg foi comparado a Bob Dylan, teve uma faixa (“Lightning Bolt”) selecionada como uma das músicas oficiais das Olimpíadas de Londres, em 2012, e alcançou o topo dos mais vendidos no Reino Unido. Na época, ele declarou que ficava contente em “manter essas merdas do [programa de TV] X-Factor longe das paradas de sucesso.”
“É porque a música deles é muito ruim, não é?”, diz. “Eles não são a voz de geração nenhuma”. “Qualquer música pode alcançar o topo das paradas, desde que seja boa. Mas essas merdas chegam ao topo apenas porque gêneros como o rock ou o indie não estão produzindo boas canções. Por isso, as pessoas preferem esse tipo de música mais fácil.”
Edição 90 – Entrevista: Jake Bugg.
O status de “salvador” da música – colocado, sobretudo, pela mídia inglesa – pesou sobre Bugg na forma de sucesso adolescente/pop massivo, alcunha que persegue o cantor até hoje. “Nunca quis ser nenhum tipo de ‘herói’”, admite. “É claro que fico feliz se a minha música muda a vida de alguma pessoa. Mas eu só quero compor minhas canções e foi por isso que eu comecei a tocar”.
“Quando escrevo uma música, imagino o que as pessoas podem dizer dela – porque é o jeito com que elas se relacionam com a música. Mas isso não significa que eles estão sentindo a mesma que você, por exemplo. Há diversas maneiras de definir a música. [O que a imprensa diz sobre os artistas] não passa de pessoas colocando ideias nas cabeças de outras pessoas, não é isso?”
Compositor inquieto
Durante toda a conversa, Jake Bugg repetiu mais de cinco vezes que está fazendo “a coisa que mais ama no mundo”, que é compor. “Se eu não estivesse dando esta entrevista, estaria compondo. Estaria com meu violão ali no outro camarim, provavelmente compondo alguma canção”, diz.
“O mais excitante é que eu não sei como as canções vão ficar. Elas se escrevem sozinhas. É por isso que eu amo isso tanto. Quando você compõe uma música e pensa: ‘Não acredito que eu acabei de fazer isso’. Isso é demais: simplesmente alimentar essa energia meio misteriosa.”
Lembre como foi o show de Jake Bugg no Lollapalooza 2014.
Em Shangri La (segundo disco, de 2013) Jake Bugg trabalhou com o renomado produtor Rick Rubin, introduzindo mais guitarras e arranjos diversificados, além de letras mais maduras e interessantes. No show em São Paulo, o britânico revelou uma nova faixa, “Hold On You” , com letras irreverentes, uma pegada de country norte-americano e uma serenidade maior do que aquele presente em boa parte do repertório atual.
“Tudo está diferente”, afirma. “Não consigo cantar sobre experiências pelas quais eu não passei. Até dá para inventar uma história, mas minhas experiências têm sido totalmente diferentes das que eu passei quando estava compondo o primeiro e o segundo álbuns. Com certeza, isso vai afetar o resultado. Sem dúvidas.”
Edição 82 – Mesmo depois do sucesso na Inglaterra, Jake Bugg ainda se considera um cara comum.
O tempo na estrada vai, “com certeza”, influenciar o sucessor de Shangri La, mas Bugg admite que se sente sozinho quando está em turnê. “Sim, bastante. Não tem muita coisa”, diz. “Mas tenho uma banda bacana e às vezes saímos para jantar. Você cria um tipo de relação como a de uma família.”
Quando sairá o novo disco? “Assim que eu terminar a turnê, cara. Estou muito animado”