Premissa de uma nova geração de protagonistas liderados pela misteriosa Rey é, ao final da nova trilogia, apagada pela insistência nos antigos (e queridos) personagens
Se Star Wars: Os Últimos Jedi fez mais de US$ 1 bilhão em bilheteria ao redor do mundo, isso em se deve à cena final do primeiro filme dessa nova trilogia, O Despertar da Força, quando Rey, a nova protagonista, fica frente a frente com a lenda, o maior herói da galáxia, o próprio Luke Skywalker, e entrega a ele o antigo sabre de luz. Arrepios. Gritos. Palmas.
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Luke, herói da luta contra o Império daria um jeito nessa nova ameaça, a Primeira Ordem, liderada pelo ainda misterioso vilão o Snoke.
É evidente que qualquer um interessado em Star Wars ansiava para descobrir o que Luke Skywalker seria capaz de fazer depois de tantos anos e de ter se aprofundado no estudo da Força.
Não é spoiler dizer que a versão envelhecida do Mestre Luke é interessante, embora omissa diante de toda a guerra travada no restante do universo.
Sim, Star Wars: O Despertar da Força, de J. J. Abrams, fez um trabalho magnífico em resgatar o espírito da primeira trilogia, iniciada em 1977, com A Nova Esperança, ao apostar em efeitos práticos, em vez da ejaculação precoce de efeitos especiais toscos que foi a segunda trilogia, com os Episódios I, II e III, lançado nos anos 2000.
Star Wars, o seu, o meu, o nosso Guerra nas Estrelas, estava vivo, parecia real, de verdade, na tela de cinema.
Ao longo dessa nova trilogia, ficou claro a dificuldade da Disney, que comprou a Lucasfilm e tirou do criador da história George Lucas o brinquedo favorito dele, em lidar com o legado de Star Wars.
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Justamente porque quem curte Star Wars desde os anos 1970, passando por gerações das décadas seguintes, sempre se sentiu um pouquinho dono dessa história também. Não é por acaso que a saga espacial tenha ajudado a cunhar o que chamamos hoje de cultura nerd.
Com os três primeiros filmes, George Lucas abriu a possibilidade para que as pessoas pudessem imaginar o que queriam dentro daquele universo particular. Foram trocentos livros, jogos, fanfics e tudo mais, sobre acontecimentos prévios ou posteriores à nova trilogia.
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A terceira e última trilogia, iniciada com O Despertar da Força, viria para contar de forma oficial o que aconteceu depois da derrota do Império, Palpatine e tudo mais. Ou seja, veio para contar uma história que já era imaginada por milhões de cabeças há pelo menos 40 anos.
E é difícil encarar o próprio legado. E, principalmente, se desconectar dele para tentar contar uma nova história.
É aí que O Despertar da Força, Os Últimos Jedi e A Ascensão Skywalker patinam. Eles não sabem como deixar o passado como está, lá atrás, com uma história já contada. A participação de Mark Hamill, Carrie Fisher e Harrison Ford como Luke, Leia e Han Solo, deveria ser um fan-service, aquele momento que faz os olhos encherem de água na frente da tela de cinema.
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Essa era a promessa. O bastão seria passado para um novo trio de protagonistas, a catadora de lixo Rey (Daisy Ridley), o ex-stormtrooper Finn (John Boyega) e Poe (Oscar Isaac), um piloto da Resistência (a força que tenta manter a nova república criada a partir da derrota de Palpatine e DarthVader em O Retorno de Jedi).
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O vilão agora seria representado por Kylo Ren (interpretado por Adam Driver), que vestia roupas negras e uma máscara, tal qual Vader, mas possuía um sabre de luz imperfeito, como se ele ainda não dominasse perfeitamente as técnicas para o uso da Força.
Mas, como vocês sabem, a nova trilogia de Star Wars não deixou seu passado para trás. O trio de protagonistas do passado foi, ao longo dos três filmes, peças fundamentais e chaves para todo o desenvolvimento da nova história, mesmo que eles não tenham tempo de tela suficiente para isso.
Han, Luke e Leia não perderam o posto de protagonistas, essa é a verdade. Pelo contrário, são eles os responsáveis pelas transformações e, irritantemente, também pelas soluções de muitos problemas.
Kylo Ren não poderia ser qualquer outro guri do universo inteiro, ele PRECISAVA ser filho de Han e Leia, treinado para ser um Jedi por Luke
A começar pela morte de Han Solo, em O Despertar da Força. Kylo Ren não poderia ser qualquer outro guri do universo inteiro, ele PRECISAVA ser filho de Han e Leia, treinado para ser um Jedi por Luke.
Ao matar o pai, Kylo inicia a jornada que vai levá-lo até o desfecho mostrado em Star Wars: A Ascensão Skywalker. Perturbado, quebrado, dividido, Kylo não é o mesmo desde que fez seu sabre atravessar o corpo de Han, receber ainda um gentil carinho no rosto antes de testemunhar o corpo dele despencando pela escuridão.
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Luke conduz o segundo longa à distância. Decepcionado e amedrontado, o herói da derrota do império quer morrer sozinho e levar consigo a Ordem Jedi, até ser "importunado por Rey", a nova "Luke Skywalker" dessa trilogia.
Uma das questões mais controversas dessa nova safra de filmes é esse Luke.
O personagem não é explorado o suficiente para realmente entendermos por que o herói de décadas atrás não quer entrar mais na briga. São entregues fragmentos - afinal, em algum momento foi estabelecido que ele seria o coadjuvante. Na prática, é ele quem lidera sozinho um ataque contra a Primeira Ordem, para salvar o que restou da Resistência.
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O terceiro e último filme seria o momento de Leia. A morte de Carrie trocou os planos, embora ela ainda esteja em cena graças a um trabalho interessante de encontrar cenas gravadas e não usadas da atriz na personagem. Ainda assim, em A Ascensão Skywalker, ela é fundamental.
Vivos ou não, os protagonistas da primeira trilogia de Star Wars têm ligações diretas com o desfecho da nova saga. É tanto que o fan-service se torna preguiça.
São três ou quatro oportunidades em A Ascensão Skywalker em que as aparições desses personagens resolvem questões importantíssimas que afetam diretamente a história.
Nada seria minimamente igual se não estivessem ali.
Preguiçoso é o mínimo, afinal, já que isso se torna uma muleta para um roteiro que não se esforça para criar uma narrativa que não precise de um fantasma aparecendo para resolver tudo.
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No fim das contas, eles não são os coadjuvante, são os protagonistas que não estão na tela o tempo todo. O que também faz pouco sentido, certo?
Poe, Rey e Finn sofrem com isso. São transformados em operários que fazem a história girar, mas dificilmente têm poder de decisão. Só correm, lutam, explodem coisas. Também encaram, por causa disso, a falta de conexão entre eles e o público. Quem aqui realmente está interessado na história de como Poe se tornou um dos principais pilotos da galáxia ou pelo o que passou Finn ao longo dos anos como stormtrooper.
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É claro, Rey e Kylo ainda são especiais na trama, mas o desfecho, o terceiro filme da trilogia, mostra que tudo sempre girou em torno deles, das semelhanças e disparidades, mas a impressão é, ao encarar os três filmes como uma obra única, que essa ideia só apareceu mais tarde e foi incluída à força por Os Últimos Jedi e A Ascensão Skywalker.
Se Star Wars não tivesse medo dos próprios fãs, a conclusão seria diferente. Han, Leia e Luke permaneceriam como heróis de uma batalha antiga, não como fantasmas (no sentido literal e figurado) que não deixam a história seguir sem eles. Kylo e Rey viveriam um interessante desenvolvimento antagônico de crescimento simultâneo, mas não é o que acontece.
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Star Wars - Episódio IX: A Ascensão Skywalker é o filme mais afetado por isso de toda a trilogia. Não é de todo ruim (há uma porção de batalhas de sabre de luz incríveis e desfechos emocionantes), mas as decisões narrativas baseadas em fan-service estragam uma experiência que seria incrível.
Lembra da frase lá de cima, "o seu, o meu, o nosso Guerra nas Estrelas, estava vivo"? Bom, no fim das contas, ele não está necessariamente vivo. Está assombrado, mesmo. Alguém chame os Caça-Fantasmas! Não, espera, melhor deixar essa franquia quieta.
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