‘Braço direito’ de longa data de Sean Combs tem presença marcante no julgamento, apesar da ausência
Nenhum dos lados convocou Kristina Khorram, que trabalhou de perto com Combs por mais de uma década, para depor como testemunha
Redação
O nome dela foi mencionado tantas vezes no julgamento de Sean Combs por tráfico sexual e conspiração de extorsão que, na terça-feira, um advogado de defesa sugeriu que o caso do governo parece “depender em grande parte” das supostas ações dela nos bastidores.
Ela é a ex-chefe de gabinete de Combs, a mulher que o magnata da música chamou de sua tenente mais leal em uma postagem no Facebook em 2021. “Ela tem sido minha mão direita nos últimos 8 anos e provou consistentemente que executa e faz as coisas acontecerem. Não sei como funcionaria sem ela”, ele escreveu.
Há mais de um ano, Kristina Khorram está longe dos olhos do público, permanecendo em silêncio além de uma declaração escrita chamando as acusações contra ela de “perturbadoras e impensáveis”. Na terça-feira, os promotores encerraram seu caso sem convocar Khorram para depor. Em seguida, os advogados de Combs apresentaram uma defesa de 25 minutos sem chamar nenhuma testemunha.
Após seis semanas de testemunhos por vezes tediosos, a corrida repentina do julgamento para a reta final provavelmente deixou os jurados confusos, se perguntando o que aconteceu com Khorram – e por que nenhum dos lados a levou ao banco das testemunhas.
Um especialista jurídico afirma que os promotores podem ter entrevistado Khorram, mas acabaram decidindo que intimá-la judicialmente seria “arriscado demais”. Em vez disso, aparentemente optaram por contar a versão deles sobre sua história por meio de mensagens de texto e do que foi encontrado nos dispositivos apreendidos dela.
“Ela tem sido muito leal a Combs. Não estou dizendo que ela não seria sincera no depoimento, mas o que é a sua verdade?”, disse Alyse Adamson, ex-promotora assistente dos EUA no Distrito de Columbia, à Rolling Stone. “O governo estava tentando encontrar um equilíbrio delicado ao demonstrar que Kristina foi cúmplice em alguns desses atos, mas pode haver outro lado em que ela não estava tão por dentro, ou estava tentando apaziguar algumas dessas situações com Combs, e não incentivá-las. E isso pode ser muito confuso no contexto do RICO, onde você precisa mostrar que essas pessoas agiam com um propósito unificado para sustentar uma organização criminosa”.
Também é possível que Khorram tenha deixado claro que pretendia invocar seu direito da Quinta Emenda contra a autoincriminação, e os promotores não quiseram oferecer imunidade. Adamson afirma que não chamá-la foi uma “decisão tática” — que pode ter seu preço. Segundo ela, a defesa pode se aproveitar disso nos argumentos finais, alegando que “há peças cruciais faltando que, somadas, geram dúvida razoável”, já que “onde está Kristina?”.
Claro, os jurados também podem se perguntar por que Combs não chamou Khorram para depor. Mas a defesa também fez um movimento estratégico, segundo especialistas. Ao encerrar o caso rapidamente, sem apresentar testemunhas, os advogados de Combs provavelmente esperavam sugerir que os promotores apresentaram um caso tão fraco que a melhor resposta era confiar apenas na dúvida razoável.
Um especialista apontou que Khorram era uma carta tão imprevisível que até mesmo Combs pode tê-la considerado um risco. “Só posso supor que a promotoria tenha sentido que ela poderia dar um depoimento que beneficiasse a defesa, e que a defesa tenha achado que o que ela supostamente viu ou fez como assistente poderia ser útil para a acusação”, disse Brad Bailey, ex-promotor federal que hoje atua como advogado de defesa em Boston, à Rolling Stone. “Esse costuma ser o motivo pelo qual uma testemunha teoricamente essencial não é chamada por nenhum dos lados”.
Os promotores não mencionaram o nome de Khorram em sua declaração de abertura. Em vez disso, disseram que Combs “contava com um círculo íntimo de pessoas próximas a ele, como seguranças, chefes de gabinete e outros funcionários de alto escalão que administravam todos os aspectos de sua vida”.
Mas Khorram estava ao lado de Combs quando ele foi detido no aeroporto de Opa-Locka, em Miami, enquanto agentes do Departamento de Segurança Interna faziam buscas em suas casas em Los Angeles e Miami Beach, no ano passado. Os investigadores apreenderam dois celulares ligados a Khorram e um laptop encontrado em sua mala. Os dispositivos continham contatos, mensagens, capturas de tela e documentos que foram apresentados durante o julgamento por meio de outras testemunhas.
Os promotores afirmam que as evidências extraídas dos dispositivos sustentam as acusações de que Combs traficou sexualmente duas ex-namoradas: a cantora Casandra “Cassie” Ventura e uma mulher que depôs sob pseudônimo como Jane. Segundo eles, o material também ajudou a reconstruir a suposta tentativa de suborno feita por Combs aos seguranças do hotel que entregaram um vídeo mostrando a agressão brutal de Ventura por Combs em um corredor do agora fechado hotel InterContinental, em Los Angeles.
Sem a presença do júri na sala, a advogada de Combs, Alexandra Shapiro, argumentou na terça-feira que seu cliente merecia absolvição imediata, pois não havia uma conexão clara entre os supostos co-conspiradores de Combs e o alegado tráfico sexual de Ventura e Jane.
Shapiro colocou Khorram, também conhecida como KK, no centro das acusações. “O caso do governo realmente parece depender em grande parte das alegações sobre a KK”, disse ela, acrescentando que as evidências não eram suficientes. Para reforçar seu argumento, Shapiro apontou para mensagens de texto trocadas entre Combs e Jane em 24 de abril de 2023. Na conversa, Combs pediu a Jane que organizasse um encontro sexual com um acompanhante masculino em um hotel e sugeriu que estava escondendo isso de Khorram. “Você encontra o lugar. Não posso deixar a KK saber. Droga”, escreveu Combs.
Por outro lado, os promotores alegam que Khorram, de 38 anos, sabia o que estava acontecendo com Jane. Em 13 de junho, eles convocaram o ex-assistente de Combs, Jonathan Perez, para depor e perguntaram a ele sobre um vídeo de “freak-off” que outro colega encontrou em um dos iPads de Combs em 2022. Perez disse que o vídeo mostrava Jane e um acompanhante masculino “envolvidos em atividade sexual”, enquanto Combs aparecia ao fundo. Ele afirmou ter levado a questão imediatamente a Khorram e que, cerca de seis meses depois, ela gravou secretamente uma conversa com ele sobre o vídeo, em janeiro de 2023.
Os jurados também viram uma mensagem que Jane enviou a Khorram em 28 de dezembro de 2023, na qual dizia que Combs teria ameaçado divulgar vídeos íntimos dela. “Ele disse que me exporia e enviaria [os vídeos] para o pai do meu filho. Ele tem me perturbado há dois meses”, escreveu Jane na mensagem.
Neste mês, os promotores chegaram a chamar explicitamente Khorram de “agente e co-conspiradora” em declarações ao tribunal. Ela teria começado a trabalhar para Combs em 2013, mas Shapiro argumentou na terça-feira que Khorram “nem sequer aparece nas evidências de forma significativa até março de 2016”. Durante os quatro dias dolorosos em que Ventura depôs, ela disse aos jurados que se comunicava com Khorram “todos os dias” na segunda metade de seu relacionamento com Combs. Segundo Ventura, após o episódio no InterContinental, foi Khorram quem a procurou diretamente para avisar que Combs estava à sua procura.
Cerca de seis meses depois, Khorram e Ventura voltaram a se comunicar. De acordo com uma captura de tela encontrada em um dos dispositivos de Khorram, Ventura enviou uma mensagem para ela nos dias seguintes ao episódio em que Combs teria pendurado a amiga de Ventura, Bryana “Bana” Bongolan, pela varanda do 17º andar, em setembro de 2016.
“Ei, acabei de descobrir uma parada muito louca”, escreveu Ventura a Khorram na captura de tela datada de 30 de setembro de 2016. “Ele entrou na minha casa enquanto meus amigos estavam aqui e todos nós estávamos dormindo. Eles me acordaram. Ele estava tocando a campainha que nem louco às 3 da manhã. Quando entrou, fui pro meu quarto e ele foi até a Bana, enforcou ela e depois pendurou os pés dela pra fora da varanda. Isso é insano. … Eu preciso me afastar”.
Foi no celular de Khorram que os investigadores também encontraram imagens dos documentos de identidade dos seguranças do hotel que supostamente aceitaram um suborno de US$ 100 mil de Combs para encobrir o vídeo comprometedor que mostrava Combs chutando e arrastando Ventura no InterContinental. O segurança Eddy Garcia testemunhou que foi Khorram quem começou a procurá-lo insistentemente nas horas após o incidente, em 5 de março de 2016.
Garcia contou aos jurados que Khorram primeiro ligou para ele na recepção de segurança, pedindo para ver o vídeo. Segundo o depoimento, ela disse que Combs estava embriagado e “não se lembrava exatamente” do que havia acontecido. Quando Garcia disse a ela que entrasse em contato com a administração do hotel ou obtivesse uma intimação, ela teria aparecido pouco depois no saguão do hotel à procura dele. Garcia afirmou que Khorram mais tarde ligou para seu celular pessoal e colocou Combs na linha. Ele também disse que ela estava presente na reunião em que Combs entregou um saco de papel pardo com os US$ 100 mil em dinheiro.
Uma cópia do acordo de confidencialidade assinado por Garcia em relação ao vídeo foi encontrada no laptop que estava na bagagem de Khorram, segundo os promotores. O governo já havia declarado ao juiz federal Arun Subramanian que Khorram “atuava em prol da conspiração” ao supostamente ajudar a negociar o acordo para ocultar o vídeo. Os promotores afirmam que o suborno é um dos elementos que sustentam a acusação de crime organizado no primeiro item da denúncia contra Combs.
Quando Jane depôs como Vítima-2, ela também relatou interações próximas com Khorram. Jane disse que foi Khorram quem a ajudou a tomar banho depois de sofrer uma forte reação — quase convulsionando — por causa do Ecstasy que Combs teria lhe dado durante uma viagem a Turks and Caicos, em 2021, no início do relacionamento dos dois.
Khorram passou a ser associada às acusações de tráfico sexual contra Combs quando começou a ser citada nas ações civis movidas contra o artista a partir do início de 2024. Em uma dessas ações, o produtor musical Rodney “Lil Rod” Jones comparou Khorram a Ghislaine Maxwell — a ex-socialite atualmente cumprindo 20 anos de prisão por ajudar Jeffrey Epstein a recrutar e manipular meninas menores de idade para tráfico sexual.
Khorram quebrou o silêncio após ser nomeada como co-ré em um processo movido em dezembro de 2024 por outro ex-assistente de Combs, Phillip Pines, que detalhou suas acusações em uma entrevista para a série documental The Fall of Diddy, produzida pelo canal ID em parceria com a Rolling Stone Films. Na ação e na entrevista à Rolling Stone, Pines afirmou que Khorram era sua supervisora quando ele era enviado para fornecer drogas, óleo de bebê e outros itens a Combs durante as prolongadas estadias em hotéis que ele conhecia como “wild king nights” (algo como “noites selvagens de rei”). Pines alegou ter presenciado Combs agredindo uma mulher em sua casa em Miami, em janeiro de 2021, chutando-a no estômago. Quando contou a Khorram o quanto aquilo o abalou, ela supostamente respondeu que haveria “consequências” caso ele falasse sobre o assunto novamente.
“Por meses, acusações horríveis foram feitas contra mim em várias ações judiciais relacionadas ao meu ex-chefe. Essas alegações falsas sobre meu envolvimento estão causando danos irreparáveis e incalculáveis à minha reputação e ao bem-estar emocional meu e da minha família”, disse Khorram em uma declaração divulgada em março. “Jamais consenti ou colaborei com qualquer agressão sexual. Nunca droguei ninguém. A ideia de que eu possa ser acusada de ter participado – ou mesmo sido conivente – com o estupro de alguém é profundamente perturbadora, chocante e impensável. Isso não condiz com quem eu sou, e meu coração está com todas as vítimas de agressão sexual. Tenho confiança de que as acusações contra mim serão provadas falsas”.
Combs foi preso em setembro e declarou-se inocente das acusações de tráfico sexual, transporte para fins de prostituição e conspiração para crime organizado. Se for condenado, ele pode passar o resto da vida na prisão.
Este artigo foi originalmente publicado pela Rolling Stone EUA, por Nancy Dillon e Cheyenne Roundtree, no dia 25 de junho de 2025, e pode ser conferido aqui.
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