Indicado a 11 categorias no Oscar 2024, novidade é a segunda parceria entre Yorgos Lanthimos e a atriz; leia a crítica do filme
Henrique Nascimento (@hc_nascimento) Publicado em 31/01/2024, às 17h00 - Atualizado em 01/02/2024, às 08h45
Das certezas que nós temos na vida, a única realmente consistente é a de que vamos morrer. Nós nascemos, vivemos da melhor forma que conseguimos e, eventualmente, morremos. Nesse meio tempo, tentamos entender o mundo que nos cerca, crescer dentro dele, crescer além dele, se possível, e traçar o caminho para o que possa nos trazer satisfação, nos trazer felicidade, outra constante almejada da existência humana.
Em Pobres Criaturas, que chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira, dia 1º de fevereiro, com 11 indicações ao Oscar, Bella Baxter (Emma Stone, La La Land: Cantando Estações) conhece a felicidade em sua forma mais pura, através da satisfação de pequenos prazeres diários. Nascida de uma tragédia particular, ela é uma criança no corpo de uma mulher, com toda a inocência e a curiosidade que essa fase carrega, e vive sob os cuidados de seu criador, o dr. Godwin Baxter, mais conhecido como God (Willem Dafoe, O Farol).
Bella mal sabe falar, mas sabe que tudo o que faz tem um único objetivo: fazê-la feliz. É a felicidade que a leva a explorar o próprio corpo, por exemplo, conforme a sua mentalidade vai amadurecendo. Quase uma consequência, a descoberta sexual a leva a querer explorar o mundo, principalmente após o seu caminho cruzar com o do advogado Duncan Wedderburn (Mark Ruffalo, Spotlight: Segredos Revelados), que a convida para desvendar o desconhecido sob o desejo de se aproveitar da inocência da jovem para o seu próprio deleite.
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A princípio, o novo filme de Yorgos Lanthimos (O Lagosta, A Favorita), baseado no romance homônimo de Alasdair Gray, é bastante desconcertante. Comparado a Frankestein, de Mary Shelley, a história apresenta um excêntrico médico, responsável pelos mais malucos experimentos, como um cão-galinha ou um pato-cachorro. Sua criação mais perfeita, Bella Baxter, tampouco foge do bizarro, o que gera um estranhamento à primeira vista.
Apesar de apaixonada por God, que acredita ser o seu pai, Bella decide deixar a sua "prisão", mesmo a contragosto do médico, em um primeiro ato de rebeldia a favor da própria liberdade. Ela, então, começa a mudar, à medida que é apresentada a tantas novidades de um mundo que, em um primeiro momento, além de belo, parece perfeito.
Porém, Bella logo descobre que, fora da mansão, há amarras tentando prendê-la a todo momento. Ela não pode comer ou beber o quanto quiser, falar o que pensa, dançar, flertar ou mesmo transar com quem ou quando quiser. Ao ser confrontada por fantasmas do passado, ela chega ao seu ponto de ruptura e decide que, onde quer que esteja, será sempre livre.
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Pobres Criaturas é uma obra tão arrebatadora que tentar colocá-la em palavras é uma tarefa absurdamente difícil. É preciso testemunhar como todos os elementos do longa - o roteiro de Tony McNamara, a fotografia de Robbie Ryan, a trilha sonora de Jerskin Fendrix e as atuações impecáveis de Emma Stone e Mark Ruffalo - funcionam perfeitamente sob a batuta de Lanthimos.
Em produções anteriores, como O Lagosta (2015) e A Favorita (2018), o cineasta já havia explorado as estranhezas das histórias que escolheu contar, apresentando um ponto de vista fora do comum, mas sempre sem complicar, permitindo que o espectador acompanhasse o desenvolvimento do enredo sem se perder na jornada.
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Em Pobres Criaturas, que consegue ser a sua história mais fora da realidade e, mesmo assim, mais próxima da experiência humana e, especialmente, da vivência da mulher, essa característica admirável do cineasta segue presente e, se o filme o deixa sem palavras ao final da sessão, não é pela falta delas, mas pela cascata que ela faz nascer, mas morre quando chega à ponta da língua, porque qualquer descrição reduziria demais a experiência.
Todos os anos temos grandes produções chegando às telas de cinema de todo o mundo, mas é raro ter a oportunidade de ver uma obra tão imponente como Pobres Criaturas, que nos faz lembrar da potência dessa arte e nos faz clamar por mais. "Cinema é a maior diversão", já dizia a fachada do Cine São Luiz, em Recife, no Pernambuco, retratada em Retratos Fantasmas (2023), de Kleber Mendonça Filho. E é mesmo. Viva o cinema!
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