No ano em que completa 20 anos, banda liderada por Lucas Silveira tem disco de inéditas poderoso, triste, e estreia turnê em São Paulo
Pedro Antunes, de Brasília* Publicado em 10/11/2019, às 13h00
Com uma taça de vinho ainda cheia na mão, Lucas Silveira se estira no sofá de um lounge montado para integrar os músicos de um festival de música em Brasília, o Festival CoMA, depois de um show poderoso com a Fresno, banda com a qual ele vive pelos últimos e intensos 20 anos. Tinham lançado o disco novo há poucos dias e, ainda assim, o público ali mostrou cantar todas as faixas de Sua Alegria Foi Cancelada tocadas no show - o que, por si só, já é um feito.
+++ LEIA MAIS: Em 2011, a Fresno foi capa da Rolling Stone Brasil. Acesse à matéria completa aqui.
"A banda tem um público muito fiel", avalia Silveira, artista de 35 anos. "Quando vi que éramos a segunda banda do festival, fiquei puto, mas entendi que fazia sentido para o festival, porque levamos pessoas aos lugares. Então, do ponto de vista do festival, é inteligente colocar a gente mais cedo, para começar a encher o festival desde cedo."
Silveira é uma figura única do rock nacional, maior exemplo de perseverança e resistência roqueira em um universo musical mainstream que já deu bola para o emo, colocou o subgênero no topo, nos primeiros lugares das rádios, mas assim como veio, também deixou o gosto pelas músicas melancólicas para trás.
Desde o estouro da banda em meados dos anos 2000, Silveira se tornou o rosto de um movimento musical e fez da Fresno o carro-chefe dessa transformação social que adotou a melancolia como modo de vida . Passou pela bonança e pelos tempos de contrato com o Rick Bonadio, mas também sobreviveu à rejeição do estilo. Reinventou-se, transformou também a banda.
A Fresno de hoje, com o belíssimo disco Sua Alegria Foi Cancelada, não é diretamente ligado aos tempos de banda independente, também não se aproxima do popular Redenção, disco de 2007 que catapultou a banda para o primeiro lugar das rádios.
A banda aproveitou o fim da super-exposição para crescer. Daí surgem discos como Infinito (2012) e A Sinfonia de Tudo Que Há (2016), ambos bastante experimentais - no último, principalmente, apresentou flerte com orquestrações.
A trajetória da Fresno colocou a banda em uma posição curiosa. Embora tenha um público fiel, o grupo não havia sido, até então, abraçada pela nova fase de ouro dos festivais de música (dos gigantes, como Rock in Rio e Lollapalooza a médios, como o Bananada, e pequenos também). Aos poucos, isso mudou.
No Bananada, a Fresno tocou em 2018. Agora, em 2020, o grupo estará no Lolla (atração do 3º dia de festival, domingo, capitaneado pelo The Strokes).
Tocar em festivais, para uma banda como a Fresno, ainda faz mais sentido, como conta Silveira, porque reencontra um público que talvez tenha se perdido no meio do caminho. "Adolescente tinha aquela coisa de cagação de regra de que não se poderia gostar de uma banda ou outra", ele diz. "O revival do emo está acontecendo porque essas pessoas cresceram, agora elas podem curtir o que quiserem e foda-se."
O vocalista lembra de quando, meses atrás, discotecou em uma festa organizada pelo mesmo pessoal do Bloco Emo (sim, um bloco de carnaval dedicado às canções melancólicas de até duas décadas atrás) e ficou impressionado ao ver mais de 1 mil pessoas ali.
"A tristeza do adulto é mais verdadeira", Silveira avalia, "porque ele tem motivos mais reais para estar puto."
É também por aí que nasce Sua Alegria Foi Cancelada, o oitavo disco de inéditas das Fresno, hoje formada também por Gustavo Mantovani (guitarra, integrante desde a fundação do grupo ao lado de Silveira), Mario Camelo (teclados) e Thiago Guerra (bateria).
"O emo se aproximou muito do post-rock", opina Silveira, ao falar sobre e estética assumida e reforçada neste novo álbum. Também dono de outros projetos, como o solo Beeshop, o líder da Fresno ouviu do baterista Thiago Guerra que "o que você fizer será a Fresno, não é preciso mudar a chavinha, assumir um personagem". E, enfim, concordou.
"Sua Alegria Foi Cancelada", a música, é fruto disso. E, a partir dela, do conceito criado a partir de uma melancolia assola os jovens adultos (ex-adolescentes emos, que hoje enfrentam a realidade dura e antes imaginada de músicas como "Contas Vencidas", hit do Fresno das antigas, que hoje é o pesadelo de quem precisa pagar os boletos).
O oitavo disco da Fresno, o primeiro lançamento da volta da BMG, revive o emo em termos atuais. E, o melhor, sem mais a interferência externa (entenda-se: a grana) que atuava no gênero durante os anos 2000. Melancólico até a última gota, o álbum não se prende às tristezas amorosas apenas, também fala de um estado de espírito desolado, diretamente com alguém que foi tomado pela rotina diária, exaustiva, que é envelhecer e assumir responsabilidades sobre quem somos.
Lo-fi, instigante, pauleira e triste, Sua Alegria Foi Cancelada traz as participações de Jade Baraldo e Tuyo. A primeira toca na faixa título e "é uma artista muito contemporânea, muito de 2019", diz Silveira. Já a Tuyo atua em "Cada Acidente", uma das mais populares do disco.
"Eles atualizam um pouco da melancolia que a gente tinha no começo", diz Lucas. "Mas elas já são adultas, então fazem isso com maturidade. Quem tá ouvindo Tuyo inevitavelmente ouviu Fresno em algum momento."
Desde agosto, quando tocou em Brasília, Silveira já ansiava pela nova turnê. Enfim, ela chegou. A banda se apresenta em São Paulo, na Audio, neste domingo, 10, (ingressos ainda disponíveis aqui https://fresno.lnk.to/safcTour/), depois segue para Rio de Janeiro (16/11, na Fundição) e Belo Horizonte (30/11, Sesc Palladium).
"Vamos ter todas as músicas do disco ensaiada e devemos tocar umas 8", dizia Silveira. Também incluíram músicas clássicas - e indispensáveis -, como "Quebre as Correntes" e "Cada Poça Dessa Rua Tem um Pouco de Minhas Lágrimas".
Diante do início da turnê, Silveira é capaz de olhar para trás e perceber que a trajetória da Fresno o levou para um lugar no qual suas músicas (das mais melancólicas às, quiçá, sorridentes) se tornaram referências para toda uma geração de artistas, de bandas como Terno Rei a Raça.
"Como eu vou ser relevante para quem tem quem tem 15 anos?", diz e ele também responde: "Emo era relevante em 2004. Os moleques hoje estão ouvindo sad trap e fumando vape. Ou estão em um rolê escapista com funk ou sertanejo."
Silveira segue: "E o rock, né, ele não morreu, mas envelheceu, com certeza. O rock dos anos 2000 foi viabilizado por meio de um público adolescente. É um público difícil de manter. Eu prefiro ter relevância na cena, entre a galera. E, para o público que a gente tem, mostrar coisas novas, mostrar referências."
Lucas Silveira se deixa largar no sofá mais uma vez, antes de ser puxado para outra entrevista pós-show. O vinho já acabou. "Das bandas em atividade, temos a melhor fan base", ele garante. "Eles não são tóxicos. E não comparo com Los Hermanos porque eles não são uma banda em atividade. E eles sempre foram uma referência pra mim, de chegar para a indústria e falar: 'Pau no cú de todo mundo, vamos fazer o que a gente quiser.'"
Ouça 'Sua Alegria Foi Cancelada', o novo disco da Frenso:
Alfa Anderson, vocalista principal do Chic, morre aos 78 anos
Blake Lively se pronuncia sobre acusação de assédio contra Justin Baldoni
Luigi Mangione enfrenta acusações federais de assassinato e perseguição
Prince e The Clash receberão o Grammy pelo conjunto da obra na edição de 2025
Música de Robbie Williams é desqualificada do Oscar por supostas semelhanças com outras canções
Detonautas divulga agenda de shows de 2025; veja