TÚNEL DO TEMPO

A história de quando os integrantes do Planet Hemp foram presos

Marcelo D2 e outros membros da banda ficaram cinco dias na cadeia, em Brasília, acusados de apologia à maconha; relembre o caso

Guilherme Gonçalves (@guiiilherme_agb) com pauta de Igor Miranda

Publicado em 24/06/2025, às 12h05
Marcelo D2, do Planet Hemp - Foto: Stephan Solon
Marcelo D2, do Planet Hemp - Foto: Stephan Solon

Sábado, 8 de novembro de 1997. Após um show no Minas Tênis Clube, em Brasília, o Planet Hemp saiu do palco direto para a cela da 3ª Delegacia de Polícia, no Cruzeiro, um dos bairros da capital federal. Marcelo D2 e os demais integrantes da banda foram presos em flagrante. A acusação? Apologia ao uso de maconha.

Mesmo passados quase 30 anos, esse continua sendo um dos episódios mais emblemáticos da história do Planet, que anunciou na última semana a turnê de despedida A Última Ponta. A Rolling Stone Brasil relembra esse caso que marcou não apenas o grupo carioca, que vai colocar um ponto final em sua trajetória, como também o rock nacional.

O momento

Em 1997, o Planet Hemp havia acabado de lançar seu segundo álbum, Os Cães Ladram Mas a Caravana Não Para. A banda era um dos principais nomes do rock no Brasil.

Ao mesmo tempo, porém, as letras já vinham atraindo também a atenção das autoridades, tendo em vista a temática das drogas, em especial a maconha.

Ao Charla Podcast, Marcelo D2 conta que a música "Queimando Tudo" — cuja letra traz logo no início o verso "Eu canto assim, porque eu fumo maconha..." — foi o estopim para o grupo começar a ser ainda mais perseguido. O clima durante a turnê passou a ficar tenso, com a polícia em cima.

Antes da prisão em Brasília, o Planet Hemp já havia sido convocado pela polícia de Belo Horizonte a prestar depoimento e esclarecer as letras e algumas falas no palco durante as apresentações.

A prisão do Planet Hemp

No sábado, 8 de novembro de 1997, veio a prisão. O Planet Hemp fez show para um público de quase 7 mil pessoas no Minas Tênis Clube. Ao deixar o palco, a banda já foi abordada por policiais da Delegacia de Tóxicos e Entorpecentes.

Segundo declarou à época para a Folha de S. Paulo o delegado Eric Castro, responsável pela prisão, o grupo foi detido em flagrante por apologia à maconha:

"Soubemos do show aqui em Brasília e conseguimos autorização judicial para gravá-lo, tanto em vídeo quanto em áudio. Como esperado, eles cantaram as músicas que fazem apologia do uso da maconha."

Marcelo D2 e os outros cinco integrantes, dentre eles Black Alien, Formigão e Zé Gonzales, foram levados para a cadeia. O caso gerou grande repercussão e cobertura na impresa, tendo em vista a popularidade do Planet Hemp. Estima-se que na época o segundo disco do grupo já havia vendido 300 mil cópias.

Habeas corpus e visita de políticos

Os integrantes do Planet Hemp ficaram cinco dias detidos até conseguirem um habeas corpus. Fernando Gabeira, então deputado federal, e Eduardo Suplicy, então senador, visitaram a banda na cadeia.

Em entrevista recente ao Charla Podcast, Marcelo D2 relembrou uma das palavras de Gabeira enquanto a banda estava presa:

"Gabeira virou para mim e falou: 'Não abaixa a cabeça, tu é o líder da banda, eles tão fazendo isso pra te calar. Já passei por isso na ditadura. É o sistema dos caras, de opressão. Tu é o vocalista, não abaixa a cabeça. Falei com a tua mãe. Ela disse que está orgulhosa de você, que você está lutando pelo ideal que você acredita'."

Na quinta-feira, 13 de novembro de 1997, o Planet Hemp foi liberado. Após deixar a 3ª Delegacia de Polícia, Marcelo D2 falou ao jornal O Globo:

"Essa prisão só reforça o que a gente já canta. Prova que estamos no caminho certo ao questionar a hipocrisia social e exercer o direito a opinião. Somos pessoas honestas e vamos agir dentro da lei. Sabemos que as drogas fazem mal e não fazemos apologia ao uso. Esperamos ter contribuído para o debate, não apenas da legalização da maconha, mas também sobre a liberdade de expressão."

Reflexão atual sobre o debate em torno do tema

Na coletiva de imprensa que anunciou a turnê de despedida do Planet Hemp, Marcelo D2 e BNegão — que não foi preso pois estava no Rio de Janeiro — abordaram justamente os avanços que enxergam na discussão nacional sobre a legalização da maconha. D2 conta que prefere ver o "copo meio cheio" nesse sentido.

“Acho que temos mais voz das minorias em comparação a 30 anos atrás. Era um absurdo uma banda como o Planet Hemp. Começamos o Planet Hemp seis ou sete anos após o fim da ditadura militar. [As autoridades] Só descobriram que Planet Hemp era ‘Planeta Maconha’ depois de alguns anos. Só fomos presos quatro anos depois. São meio lerdos mesmo. Conseguimos entrar nesse sistema. Acho que caminhamos com a questão da legalização. Tudo bem que o Brasil é a vanguarda do atraso... vai legalizar na América do Sul inteira — se já não está — e no Brasil, você fala ‘maconha’, as pessoas se impressionam. [...] Mas acho que temos um mundo diferente e melhor agora.”

Em sua reflexão, BNegão apontou a importância do Planet Hemp ao tornar mais amplo o debate sobre a maconha. Chegou ao ponto de lideranças sociais e políticas da atualidade admitirem a ele que a banda serviu como “porta de entrada” para essa discussão em suas vidas.

“Externamente, vi como o assunto ‘maconha’ saiu das páginas policiais. Colocamos essa discussão na mesa de jantar. Lógico que, depois, acabou voltando para as páginas policiais, mas enfim. [...] É maravilhoso poder discutir sobre essas questões que envolvem a planta, inclusive saúde física e mental. Todos que conheço dessa galera ‘ponta de lança’ dentro do assunto dizem que o primeiro contato com o tema de forma séria foi através do Planet Hemp.”

A despedida do Planet Hemp

A Última Ponta, turnê de despedida do Planet Hemp, está marcada para os meses de setembro, outubro e novembro de 2025. Até o momento, 10 shows foram confirmados.

Integram a formação atual da banda Marcelo D2 (voz), BNegão (voz), Formigão (baixo), Pedro Garcia (bateria), Nobru (guitarra) e Daniel Ganjaman (guitarra e baixo). O álbum mais recente, Jardineiros, saiu em 2022.

Confira a lista completa de shows:

13/09 - Concha Acústica (Salvador)
20/09 - Classic Hall (Recife)
03/10 - Live Curitiba (Curitiba)
04/10 - KTO Arena (Porto Alegre)
12/10 - P12 (Florianópolis)
17/10 - Goiânia Arena (Goiânia)
18/10 - Arena BRB (Brasília)
31/10 - Befly Hall (Belo Horizonte)
08/11 - Farmasi Arena (Rio de Janeiro)
15/11 - Allianz Parque (São Paulo)

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