A música que marca o início do fim do Pink Floyd clássico, segundo David Gilmour
Guitarrista e vocalista da lendária banda de rock progressivo recorda tensão envolvendo a criação de um dos maiores clássicos de seu repertório
Guilherme Gonçalves
Uma das músicas mais aclamadas da história do Pink Floyd, “Comfortably Numb”, do álbum conceitual The Wall (1979), é frequentemente celebrada como o ponto alto da banda. No entanto, para o guitarrista e vocalista David Gilmour, esta obra-prima icônica representa também algo melancólico: “a última chama” da capacidade de colaboração entre ele e Roger Waters.
De acordo com Gilmour, a canção permanece como uma ilustração perfeita das personalidades contrastantes entre os dois e foi o pivô que precipitou a dissolução da formação clássica do Pink Floyd. Algo que culminaria em brigas constantes, durante e depois da gravação de The Wall.
A origem de “Comfortably Numb”
O embrião de “Comfortably Numb” surgiu em 29 de junho de 1977, durante a turnê do álbum Animals, lançado naquele mesmo ano. Antes de um show na Filadélfia (EUA), Roger Waters estava sofrendo com fortes dores de estômago que o obrigaram a fazer uma escolha: cancelar a apresentação ou tomar um tranquilizante que, segundo ele, “teria matado um elefante”.
Waters escolheu tocar, mesmo com a injeção deixando-o incapaz de sentir as mãos ou levantar os braços. Dessa sensação anestesiada nasceu a ideia central para “Comfortably Numb” (“confortavelmente anestesiado”, numa tradução literal para o português).
Divergências entre David Gilmour e Roger Waters
Na hora de compor a estrutura musical, foi David Gilmour que chegou com o esboço inicial e sugeriu colocá-la em The Wall. Waters, por sua vez, tinha ressalvas e não parecia disposto a aceitá-la em um álbum desenvolvido de forma tão pessoal — e passional.
Em declaração destacada pela Classic Rock, Gilmour se recorda:
“Discutimos sobre ‘Comfortably Numb’ como loucos. Realmente tivemos uma grande briga, durou uma eternidade.”
Equilíbrio
“Comfortably Numb” acabou entrando em The Wall como uma espécie de mescla entre as melhores partes compostas por Gilmour e por Waters. O baixista e vocalista declarou posteriormente à Absolute Radio (via Showbiz Cheatsheet):
“No final das contas, a faixa que está no disco tem a primeira estrofe da versão que eu gostei, e a segunda estrofe da versão que ele (Gilmour) gostou. Depois um pouco do refrão é meu e um pouco dele. Foi uma negociação e um compromisso.”
No palco, “Comfortably Numb” ganhava ares ainda mais impactantes, com Gilmour tocando os solos do alto do gigantesco muro construído para encenar o conceito de The Wall.
Suspiro final do Pink Floyd clássico
Em contrapartida, a ocasião marcou o que o guitarrista considera os últimos suspiros da parceria entre ele e Roger Waters, bem como da fase clássica da banda, completa por Richard Wright (teclados) e Nick Mason (bateria). Gilmour comenta:
“Eu acho que coisas como ‘Comfortably Numb’ foram as últimas chamas da minha e da capacidade de Roger de trabalhar em colaboração.”
O álbum seguinte, The Final Cut (1983), é visto como uma obra quase solo de Waters. Dois anos depois, o baixista abandonaria o grupo para nunca mais voltar.
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