“NUNCA FOI ASSIM”

Por que Nasi não aguenta mais responder que rock não virou “de direita”

“Pior que tenho que responder isso há dez anos”, afirma cantor, envolvido em polêmica após pedir que bolsonaristas deixassem show do Ira! em Contagem

Igor Miranda (@igormirandasite)

Publicado em 15/04/2025, às 16h58
Nasi, vocalista do Ira!, em 2015 - Foto: Alexandre Loureiro / Getty Images
Nasi, vocalista do Ira!, em 2015 - Foto: Alexandre Loureiro / Getty Images

O posicionamento político do Ira!, orientado à esquerda, foi declarado ao longo de sua trajetória, seja em composições ou entrevistas. Nos últimos anos, porém, uma frequente pergunta relacionada ao tema deixa Nasi ligeiramente incomodado.

O vocalista, em entrevista à TV Forum, lamentou ainda ter que responder se o rock virou algo “de direita”. Na opinião do artista, apenas “uns três ou quatro” nomes célebres do gênero no Brasil se posicionam de tal forma.

Conforme transcrição da Rolling Stone Brasil, ele declarou:

“Não concordo [que o rock agora está à direita]. Pior que eu tenho que responder isso há dez anos. Isso é muito pontual, não vou citar o nome deles porque todo mundo sabe quem é. São uns três, quatro. E é só você ver a agenda de show de um e a agenda de show de outro.”

De acordo com Nasi, o rock sempre teve característica revolucionária. Exemplos relacionados a Elvis Presley, Beatles e o punk rock foram citados.

“Nunca foi assim [de direita]. O rock sempre esteve, historicamente… desde Elvis Presley — relacionado à quebra de paradigmas — e seu rebolado que mexeu com a sensualidade, com a libido das meninas branquinhas, trazendo o swing da música negra para a população branca dos Estados Unidos, e depois os Beatles, e todos… o punk rock, tudo. O rock sempre foi assim.”

O cantor de nome Marcos Valadão Ridolfi aponta que ele e seu parceiro de banda, o guitarrista Edgard Scandurra, vieram da “classe média pobre, baixa”. “Sempre estudei em escola pública, primeiro, segundo grau, universidade. Nunca teve facilidade na minha vida”, disse ele, que ainda complementou: “Todo mundo nos anos 1980 era democrático pois quem seria contra as Diretas Já. Teve música sobre Diretas Já que até fez sucesso, apesar do autor”.

A banda Ira!
A banda Ira! - Foto: Ana Karina Zaratin

No fim das contas, o frontman do Ira! entende que o rock não “envelheceu mal” e reforçou que mesmo no Brasil há representantes de ideias mais à esquerda no cenário musical.

“Pelo menos da minha geração: se for ver a posição dos Titãs — seja como banda ou solo, como Nando Reis e Arnaldo Antunes —, Legião Urbana, Paralamas do Sucesso, vou falar um monte… todos pensam como eu. Também tem o pessoal das bandas do Sul. Criou-se uma imagem assim, por causa de dois ou três, que faz parecer que toda a minha geração envelheceu mal. Não, isso não é verdade.”

Nasi rebate bolsonaristas em show do Ira!

Durante show em Contagem (MG), no último dia 29 de março, Nasi gritou “sem anistia” para manifestar seu apoio à condenação dos envolvidos nos ataques aos prédios do poder público em Brasília no dia 8 de janeiro de 2023. A fala também faz referência aos investigados pela tentativa de golpe de Estado em favor do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Na ocasião (via site Igor Miranda), o cantor disse:

“Pra vocês que estão vaiando, eu vou falar uma coisa pra vocês: tem gente que acompanha o Ira!, mas nunca entendeu o Ira! Nunca entendeu o Ira! Tem gente que acompanha a gente e é reacionário, tem gente que acompanha o Ira! e é bolsonarista, isso não tem nada a ver, gente! Por favor, vão embora! Vão embora da nossa vida! Vão embora e não apareçam mais em shows, não comprem nossos discos, não apareçam mais. É um pedido que eu faço.”

Na última quarta-feira, 9, um comunicado divulgado por casas de eventos em Santa Catarina e Rio Grande do Sul confirma que quatro shows da banda na região Sul estão cancelados devido ao episódio. As performances aconteceriam em Jaraguá do Sul (30 de abril no Teatro Scar), Blumenau (1º de maio no Teatro Michelangelo), Caxias do Sul (2 de maio no All Need Master Hall) e Pelotas (3 de maio no Theatro Guarany).

Os perfis em redes sociais de três das quatro casas de eventos — Teatro Scar, Teatro Michelangelo e All Need Master Hall, esta via Stories — publicaram uma mesma nota assinada pela 3LM Entretenimento. O conteúdo (via site Igor Miranda) declara:

“Informamos que devido aos últimos acontecimentos envolvendo a banda Ira!, não temos outra alternativa a não ser os cancelamentos dos shows nas cidades de Jaraguá do Sul, Blumenau, Caxias do Sul e Pelotas. Recebemos inúmeros pedidos de cancelamento de ingressos adquiridos, desistência de patrocinadores e o risco claro de não progressão das vendas até as datas dos shows.
Lamentamos o ocorrido, somos uma produtora com mais de 30 anos de mercado e nosso principal patrimônio é o público, e este deve ser muito bem tratado por nós produtores e pelos artistas, que deveriam subir ao palco apenas para apresentar suas músicas e talentos.
A quem adquiriu os ingressos antecipadamente, os valores serão automaticamente restituídos, conforme as formas de pagamentos realizadas, diretamente pelo sistema de ingressos no prazo de até 30 dias. 3LM Entretenimento / Zig Tickets.”

Em nota à parte, o Teatro Michelangelo afirmou:

“Respeito é um sentimento positivo que se caracteriza por considerar as qualidades de alguém ou algo, cultivando a empatia. Alteridade consiste em reconhecer que as pessoas e culturas são diferentes; elas são diversas e têm suas próprias maneiras de pensar e agir. Uma pessoa altruísta é aquela que pensa no outro antes de pensar em si. É ética ao considerar esse interesse pelo próximo como um princípio fundamental da moralidade.
Não nos importa sua crença religiosa, sua afinidade política, seu gênero, raça ou cor. Importa-nos, isso sim, que se divirtam e usem este espaço da forma que quiserem sendo sempre melhores do que entraram.
Aqui dentro queremos trocas de energia na estratosfera entre artistas e público, queremos rostos felizes na saída, tanto de público quanto artistas. Antes, durante e após, aqui dentro queremos respeito, alteridade e altruísmo! Gratidão pela compreensão disto, hoje e sempre!”

Nasi se manifesta

Em entrevista a Yuri da BS para a Billboard Brasil, Nasi declarou que os shows “foram cancelados em comum acordo com o contratante” e “com muita tranquilidade”. Ele culpa uma movimentação de apoiadores de Bolsonaro com direito a pessoas que sequer iriam às apresentações.

“A gente achou, por ora, transferir para o futuro. Porque houve um bombardeiro desses fascistas. Porque eles agem de maneira fascista. É engraçado porque até o contratante falou que recebeu mensagens de pessoas de Manaus, algo como ‘ah, eu não vou no show’. (risos) O cara nem ia no show! Esses caras que estão enchendo o saco aí, robozinho… Todo mundo sabe como o gabinete do ódio age, né? Daqui a pouco eles eles pegam outro para Cristo. Numa boa, o Ira! saiu maior do que entrou nessa história.”

Ainda de acordo com o vocalista, boa parte da plateia em Contagem havia começado a gritar “sem anistia” antes dele — e sua manifestação está alinhada com o posicionamento político de décadas do Ira!. Embora reconheça o exagero ao afirmar que os fãs contrários deveriam “ir embora e não aparecer mais nos shows”, ele aponta que não gostaria de ter esse tipo de público.

+++ LEIA MAIS: Ira! tem 4 shows cancelados no Sul após Nasi expulsar bolsonaristas de plateia
+++ LEIA MAIS: Nasi comenta shows cancelados do Ira! e diz: “saímos maior do que entramos”
+++ LEIA MAIS: Após Nasi, Nando Reis grita “sem anistia” durante show em Porto Alegre
+++ LEIA MAIS: A banda de rock que “público fascista” deveria ouvir em vez do Ira!, segundo Nasi
+++ LEIA MAIS: O valor do prejuízo que produtor de shows cancelados do Ira! alega ter sofrido
+++ Siga a Rolling Stone Brasil @rollingstonebrasil no Instagram
+++ Siga o jornalista Igor Miranda @igormirandasite no Instagram