Cantor e multi-instrumentista não se impressiona com atual tendência de redes sociais que remonta aos “shredders” da década de 1980
Publicado em 04/10/2024, às 10h40
O mundo da guitarra retomou uma tendência com o “boom” das redes sociais: os instrumentistas virtuosos. Ao vasculhar plataformas como YouTube e Instagram, não é difícil encontrar músicos extremamente velozes e habilidosos, inclusive entre os mais jovens. Porém, Lenny Kravitz não parece gostar disso.
Adepto a um estilo que prioriza outras qualidades, o americano foi sincero ao refletir sobre a tendência vigente em entrevista para a Guitarist. Na ocasião, ainda citou artistas de peso que optaram pelo caminho oposto na abordagem do instrumento.
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Inicialmente, Lenny disse:
Acho que tem de tudo por aí. Mas você vê as trends no Instagram com músicos onde tudo é sobre velocidade, sabe? Tem muito disso. James Brown costumava dizer: ‘falar alto, mas não dizer nada’. Há quem toque um milhão de notas sem ter absolutamente nenhum feeling (sentimento), ritmo ou intensidade. Já B.B. King podia tocar uma nota, em uma corda, com um dedo, e derrubar uma montanha. Acho que os músicos deveriam estar pensando mais em feeling, dinâmica e emoção, se for para pensar em alguma coisa.”
Cria dos anos 1980, Kravitz se lembra dos guitarristas velozes na época em que estava começando — também era tendência naqueles tempos. Mesmo assim, esses instrumentistas não o impressionavam.
O artista diz valorizar o trabalho de guitarra que a música pede, em vez de exibições de técnica que não contribuem com o resultado final. Ele afirmou:
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Lembro de estar no ensino médio, e aquele que podia tocar mais rápido era o mais impressionante, mas eles não estavam preocupados com a parte rítmica em si. Então pode ser um acorde, uma jam de funk ou o que quer que esteja tocando, como Bob Marley and the Wailers, e seu trabalho é aquele.”
Ainda sob o ponto de vista de Lenny Kravitz, nem sempre é fácil fazer o simples. Para ele, demonstrar sentimento na música pode ser tão complicado quanto um solo rápido e complexo.
Pode ser como se você estiver tocando James Brown: seu trabalho é ir lá e fazer o que a música requer e nada além. Essa é a sua função. Aqueles caras que podem tocar um milhão de notas, 99% das vezes não conseguem fazer coisas ditas ‘simples’, porque aquelas coisas não são simples. Ter um bom feeling e groovar é um dom por si.”
Será que o próprio Lenny Kravitz tem esse dom? O músico, que costuma gravar todos os instrumentos de seus álbuns, foi sincero ao responder tal pergunta e deixou claro que é preciso aprender a fazer desse jeito. Além disso, relembrou que já promoveu testes para sua banda — e se deparou com músicos que não conseguiam tocar de tal forma.
Sim, se é algo com que eu nasci, então eu cultivei isso ao longo do tempo. O que é importante para mim é que você vai encontrar um monte de gente que poderia pensar: ‘oh, isso é realmente simples’. Eu tive muitos músicos vindo para audições e para tocar na banda, e você dá a eles a coisa mais simples e eles pensam: ‘oh Deus, isso não é nada’, mas eles não conseguem tocar aquilo.”
Para Lenny, tudo está ligado ao amor pela música, algo que ele diz ter de sobra. O sentimento pelo que está sendo criado é mais importante para ele do que qualquer tipo de proficiência em técnicas com uma guitarra.
Então é sempre muito difícil, não é sempre tão simples. É sobre a vibe e como você se expressa. E eu amo o que eu faço. Sou muito apaixonado pelo que faço no estúdio. É meu lugar favorito para estar. Eu amo criar no estúdio e colocar essas paisagens musicais juntas. É mágico para mim.”
Lenny Kravitz não mente quando diz que é apaixonado por trabalho em estúdio. Ele lançou em maio de 2024 seu 12º disco de inéditas, intitulado Blue Electric Light. O antecessor, Raise Vibration, saiu em 2018.
Entre os dois trabalhos, o músico seguiu na ativa, colaborando na trilha sonora do filme Rustin (2023), da Netflix, produzido pelo ex-presidente americano Barack Obama e sua esposa, Michelle Obama.
O longa conta a história do ativista pelos direitos civis Bayard Rustin, aliado de Martin Luther King Jr. na Grande Marcha de Washington, em 1963. Temas relacionados ao racismo e direitos humanos são de grande interesse de Kravitz, que compôs o tema original para o filme, “Road to Freedom”.
Colaborou: André Luiz Fernandes.